Uma
tecnologia inovadora que permite substituir a administração oral forçada de
fármacos em experimentação animal, contribuindo assim para o bem-estar dos
animais testados em laboratório, desenvolvida por uma equipa de investigadores
da Universidade de Coimbra (UC), acaba de ser distinguida a nível europeu.
Em
concreto, a tecnologia, que se encontra em processo de patenteamento e que foi
desenvolvida no âmbito do projeto de investigação “HaPILLness – Voluntary oral
dosing in rodents”, substitui a gavagem, um método invasivo que consiste em
administrar medicamentos ou outras substâncias a animais através de um tubo
introduzido no estômago, causando dor e stress.
O projeto foi realizado, ao longo dos últimos três anos, no Instituto de Investigação Clínica e Biomédica de Coimbra (iCBR), da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra (FMUC), com a colaboração da Escola Superior de Tecnologia da Saúde de Coimbra (ESTeSC/IPC), pelos investigadores Sofia Viana (investigadora responsável), Flávio Reis (investigador corresponsável) e Inês Preguiça (aluna de doutoramento da FMUC).
A
solução desenvolvida, já validada em ratos e murganhos, os dois modelos animais
mais usados em laboratório, ultrapassa as atuais limitações associadas à
gavagem. Os investigadores criaram matrizes semissólidas (uma espécie de goma)
capazes de incorporar os fármacos em teste e que os animais ingerem de forma
voluntária e precisa. Segundo a coordenadora do projeto, Sofia Viana, esta nova
tecnologia apresenta duas grandes vantagens. Por um lado, «é uma tecnologia stress
free, o que significa que minimiza o enviesamento dos resultados
experimentais devido ao efeito do stress causado nos animais. A outra grande
vantagem é o facto de ser uma solução metabolicamente inerte, ou seja, uma
tecnologia que pode ser usada num conjunto muito vasto de experiências, como,
por exemplo, em doenças metabólicas, doenças do sistema nervoso central e
doenças gastrointestinais, entre outras».
As
experiências realizadas com os dois modelos que mais se usam em experimentação
animal demonstram a eficácia da tecnologia, como relatam os investigadores.
«Está a funcionar plenamente nos ratos e nos murganhos. Já testámos a
tecnologia com um conjunto alargado de moléculas, desde antidiabéticos orais a
antidepressivos e anti-inflamatórios».
A
controvérsia em torno dos testes em animais é antiga e a pressão para a
eliminação do seu uso aumenta em todo o mundo. Enquanto ainda não é possível
eliminar por completo a experimentação animal, a comunidade científica trabalha
no desenvolvimento de tecnologias que aumentem o bem-estar animal, no âmbito do
princípio dos três Rs: do inglês Reduction (redução), Refinement
(refinamento) e Replacement (substituição), previsto na legislação da
União Europeia.
A
tecnologia desenvolvida na UC enquadra-se no “Refinement”, isto é,
metodologias que minimizem o sofrimento animal, e foi distinguida com o prémio
“3Rs Refinement Prize” da EPAA – The European Partnership for Alternative
Approaches to Animal Testing, uma parceria que
integra stakeholders de diferentes áreas, tais como a Comissão Europeia,
federações de saúde, ambiente e defesa dos animais, e mais de três dezenas de
indústrias farmacêuticas e de cosmética. Esta colaboração internacional tem
como missão acelerar o desenvolvimento de tecnologias de refinamento e
bem-estar animal, respetiva redução do número e/ou substituição de testes em
animais por métodos alternativos validados.
«Não
sendo possível a eliminação dos testes em animais, a alternativa passa por
adotar procedimentos que aumentem o seu bem-estar, refletindo-se na melhoria da
qualidade e reprodutibilidade dos resultados dos estudos, o que é muito
importante. Uma experiência realizada com condições que minimizem o sofrimento
animal e exponenciem o bem-estar traduz-se necessariamente em resultados mais
fiáveis e com maior potencial de translação para o homem», frisam Sofia Viana e
Flávio Reis.
Esta
tecnologia, acrescentam, permite que os testes de substâncias ativas em animais
por via oral passem a ser efetuados de forma «muito mais friendly. É uma
tecnologia que alivia brutalmente a manipulação dos animais e até permite que
eles se mantenham num ambiente social favorável, coabitando um ou mais
companheiros no mesmo espaço, sem que tal interfira na aceitação voluntária e
precisa das matrizes com os princípios ativos em teste».
A
próxima fase da investigação, inserida no projeto de doutoramento de Inês
Preguiça, é validar a tecnologia em modelos de doença, «nomeadamente doenças
metabólicas, degenerativas (do sistema nervoso central) e gastrointestinais».
Nesse sentido, a equipa está agora à procura de parcerias. Universidade de
Coimbra - Portugal
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