Pintura Arq. Eduardo Moreira Santos, Lx (28.08.1904 - 23.04.1992)

quarta-feira, 29 de março de 2023

Macau – Último Governador português defende fomento do diálogo entre Portugal e instituições na RAEM

Vasco Rocha Vieira, último Governador de Macau antes da transferência, defende que Portugal deve dar maior atenção à Escola Portuguesa de Macau, nomeadamente através do fomento do diálogo com as instituições portuguesas no território. Foi o que defendeu em declarações aos jornalistas, observando que a Língua Portuguesa é um “trunfo”, uma vez que se está a “afirmar” no mundo e que a China tem nela cada vez maior interesse. Disse ainda que a visita do Chefe do Executivo a Portugal “é um grande sinal das boas relações” entre as duas partes


Cerca de três anos depois de ter estado pela última vez no território, o último Governador de Macau durante a administração portuguesa, Vasco Rocha Vieira, regressou agora a Macau a propósito da atribuição, pela Universidade de Ciência e Tecnologia de Macau (UCTM), de um doutoramento honoris causa em Ciências Sociais. “Voltar a Macau é sempre muito agradável. Todas as pessoas que aqui estiveram, viveram e trabalharam têm Macau no coração, como eu tenho, portanto, voltar aqui nestas circunstâncias é muito agradável”, começou por dizer aos jornalistas.

Rocha Vieira falou depois do desenvolvimento da RAEM e da integração do território na China continental – a este propósito, disse não ter receio de que a cada vez maior aproximação ao Continente chinês possa interferir com as garantias acordadas entre Portugal e a China aquando da transferência. O ex-Governador de Macau considera ainda que o facto de haver “relações tão boas” com a China, principalmente devido à história com Macau, é um “trunfo” para Portugal no seio da União Europeia. Defendeu também que deve ser dada à Escola Portuguesa de Macau (EPM) uma maior atenção por parte de Portugal. “O Português é um trunfo muitíssimo grande”, observou.

“Acho que da parte de Portugal tem de haver mais interesse pela Escola Portuguesa, porque o Português está-se a afirmar no mundo, a China está interessada em que o Português se desenvolva, em que as pessoas conheçam Portugal, mas é também a maneira de, no mundo, a China poder ter, através de Portugal e neste caso da nossa história, uma relação mais estreita com os Países de Língua Portuguesa. O Português é um trunfo muitíssimo grande, devemos orgulhar-nos de que o Português seja cada vez mais uma língua internacional”, afirmou Vasco Rocha Vieira.

Em concreto, o também curador da EPM disse que “é preciso incrementar o diálogo entre Portugal e as instituições portuguesas que estão aqui em Macau”. Uma das que é “talvez a mais importante” é a Escola Portuguesa, frisou, “que tem feito um trabalho notável, reconhecido”. Rocha Vieira recordou depois que há hoje muitas universidades chinesas que ensinam a língua de Camões, um número que tem “crescido nos últimos anos”, e que, por isso, “temos de tirar partido desse grande trunfo para Portugal que é o conhecimento da Língua Portuguesa”. Durante a sua visita ao território, Rocha Vieira estará, de resto, com os elementos da Direcção da EPM e também da Fundação da EPM.

Autonomia não pode ser “fechada”

Questionado sobre se receia que a cada vez mais visível integração de Macau no país possa corroer algumas das garantias acordadas entre Portugal e China aquando da transferência de soberania, Rocha Vieira foi peremptório, disse não estar apreensivo quanto a esta questão.

“Creio que as garantias são dadas pelo trabalho de todos nós, por aquilo que pensamos, dizemos, sentimos e podemos dar. E, portanto, é um compromisso de todos – das autoridades chinesas, dos portugueses que aqui estão e das instituições portuguesas. Sendo certo que Macau é um território único no mundo exactamente pela miscigenação de culturas, pelo respeito mútuo das diferenças que existem e isso é um valor extraordinário para Macau e que é reconhecido internacionalmente”, prosseguiu.

Afirmando que a autonomia “não pode ser uma coisa fechada”, Rocha Vieira acrescentou que com o desenvolvimento que o território tem tido, principalmente nos últimos anos, Macau está em condições de o fazer. “Dentro da orientação geral da China existe a Grande Baía, acho que Macau está vocacionado para a Grande Baía muito mais do que para a Faixa e Rota, e que é importantíssima. (…) Macau fechado não é nada, ou é muito pouco. Portanto a abertura de Macau que se está a verificar é extremamente importante. Acho que as coisas estão a correr bem”.

Ainda assim, o antigo Governador frisou que “se pode sempre dizer que pode ser melhor” – “E ainda bem que pode ser melhor, porque isso é um desafio para que lutemos para que seja melhor”. Segundo disse, na agenda da sua passagem pelo território está também agendada uma visita de um dia a Hengqin e à região da Grande Baía.

Rocha Vieira sublinhou depois ser “muito optimista” em relação ao futuro, apontando que “Macau é um exemplo para o mundo inteiro”. “Entre Portugal e Macau houve sempre uma relação muito estreita de cooperação, de amizade e de respeito. E isso prolonga-se no tempo e é um valor imenso”.

Neste sentido, defendeu que “Portugal ter relações tão boas com a China resultantes, no fundo, principalmente de Macau, é também um trunfo para Portugal”. Na sua opinião, Portugal pode ser “uma voz, não no sentido de influenciar destinos, mas no sentido de dar opiniões, de aconselhar e pôr a sua experiência, amizade e conhecimento que tem da China ao serviço da União Europeia”.

Num mundo que hoje vive numa “instabilidade muito grande”, Rocha Vieira sublinhou que esse papel é “importante”: “É bom que haja entidades, neste caso países, que possam contribuir para que haja respeito, progresso e paz”. Rocha Vieira disse também que este papel de Macau, nas boas relações históricas sino-lusófonas continuará a existir.

“É muito bom” que Chefe visite Portugal

Por outro lado, em relação à visita oficial do Chefe do Executivo a Portugal, o general Vasco Rocha Vieira frisou ser “muito importante” que aquele seja o primeiro país a receber a visita de Ho Iat Seng, desde que tomou posse, em 2019.

“Isso é um grande sinal das boas relações e do respeito que essas relações merecem por parte dos dirigentes chineses em relação a Portugal e de Portugal em relação aos dirigentes chineses”, assinalou.

Apontando que a visita surge numa boa altura, Rocha Vieira – que se encontrará também com Ho Iat Seng em Portugal, durante a visita que decorrerá entre 18 e 22 de Abril – acrescentou: “É sempre bom estreitarmos relações, conhecermo-nos, falarmos”.

Também no território esteve ontem reunido com o líder da RAEM, com quem teve “sempre” uma “relação muito boa”. “Há aqui uma relação pessoal muito amiga e respeitosa, isso é bom porque é mais fácil as pessoas entenderem-se, falarem”.

Sem desvendar que mensagem levaria a Ho Iat Seng, Rocha Vieira disse apenas que, tendo em conta a relação entre ambos, seria um encontro com “verdade”.

“É aquilo que cada um sente e os propósitos são comuns: a aproximação entre Portugal e Macau e a resposta que temos de dar às possibilidades que se vão abrindo, porque a China também está num processo de desenvolvimento e de mudança muito grande. Isso merece respostas adequadas e nós estamos em condições [para as dar] porque conhecemos a China e a China também conhece a nossa maneira de ser”, continuou.

Rocha Vieira deixará no sábado o território rumo a Portugal, depois de ter vindo a convite da UCTM. Quanto ao doutoramento honoris causa que lhe foi atribuído, o antigo Governador de Macau disse ficar satisfeito por ver que o trabalho que os portugueses aqui deixaram é reconhecido.

A propósito, disse ainda que o facto de haver universidades como a UCTM e também a Universidade de Macau “contribuiu para a internacionalização” da RAEM. “A autonomia de Macau faz-se saindo das suas fronteiras também. O ranking que hoje as nossas universidades têm, quer a de Macau, quer esta [UCTM] é reconfortante e é fruto de um trabalho muito sério, de gente muito competente e muito devotada”, destacou. Catarina Pereira – Macau in “Jornal Tribuna de Macau”


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