SÃO
PAULO – Como não poderia deixar de ser, a guerra na Ucrânia pode afetar bastante
o comércio exterior brasileiro, ainda que a corrente de comércio com a Rússia
não seja significativa, pois, embora tenha a nona maior população do planeta,
aquele país ocupa apenas o 36º lugar no ranking das nações que mais
recebem produtos brasileiros, tendo importado, em 2021, US$ 1,7 bilhão,
especialmente mercadorias ligadas ao setor agropecuário (soja e carnes). Por
outro lado, é o sexto país que mais vende produtos para o Brasil: US$ 5,7
bilhões em 2021, segundo dados do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e
Serviços (MDIC).
O
setor que mais preocupa, porém, é aquele ligado a adubos e fertilizantes
químicos, que responde por mais de 60% de tudo o que o Brasil compra da Rússia,
que, aliás, é o principal fornecedor desses insumos no mundo. Tão importante é
o setor que foi a razão pela qual o presidente brasileiro, mesmo diante da
iminência da declaração de guerra da Rússia a Ucrânia, fez sua visita a Moscou,
ainda que essa ação possa ser agora interpretada como uma afronta aos países
que formam a União do Tratado Atlântico Norte (Otan) e à União Europeia (UE),
parceiros mais importantes no contexto do comércio exterior brasileiro.
Hoje,
a Rússia é o principal parceiro comercial do Brasil no setor de fertilizantes,
sendo responsável por 23% das nossas importações, especialmente de fosfato
monoamônico, potássio e ureia. Para diminuir essa dependência, há a perspectiva
de que uma empresa russa venha a reativar uma fábrica de fertilizantes em Mato
Grosso do Sul. Mas, até aqui, a expectativa para 2023 é que o Brasil possa
dobrar o volume de importações que faz da Rússia, desde que não ocorra nenhum
desdobramento negativo da guerra na Ucrânia, como sanções por parte da Otan, da
UE e mesmo dos Estados Unidos.
A
princípio, a atual crise pode se refletir de maneira positiva apenas num setor
da área agropecuária. A Ucrânia é o quarto maior exportador de milho do planeta
e, se ocorrerem as sanções previstas, os países europeus serão obrigados a
buscar o grão em outros mercados, inclusive no Brasil. Hoje, Rússia e Ucrânia respondem por um
quinto das exportações mundiais de milho (18%). O mesmo pode ocorrer em outros
segmentos: os dois países respondem por um terço das exportações globais de
trigo (28%) e por 80% das exportações mundiais de óleo de girassol.
Seja
como for, esses possíveis benefícios não compensarão os prejuízos que podem
advir dessa crise, pois, a persistirem agressões e retaliações, os custos
logísticos e do frete poderão aumentar, com impactos diretos no comércio exterior,
atingindo principalmente os insumos industriais que o Brasil costuma importar
do Leste Europeu. Sem contar que a alta dos preços de commodities pode
se agravar. Aqui se deve lembrar que o Brasil produz soja, mas antes necessita
de fertilizantes que vêm da Rússia e de outros países para preparar o solo e
aumentar a produtividade do plantio.
Não
se pode esquecer também que o planeta já vivia os problemas causados pela
pandemia de coronavírus (covid-19) e que, para o segundo semestre de 2022,
estava previsto o fim da crise dos contêineres, mas, se o conflito se estender
e atrair outras nações, a cadeia logística mundial e a navegação podem ser
prejudicadas ainda mais.
Por
enquanto, o que há é muita incerteza com os desdobramentos da guerra, mas a
esperança é que os líderes venham a se sentar a uma mesa de negociações para buscar
uma solução de paz. O que joga a favor dessa expectativa é que o comércio
exterior está muito disseminado, contribuindo para que as retaliações não sejam
tomadas de maneira intempestiva.
Basta ver que os países da UE dependem muito do gás importado da Rússia e que uma interrupção nessa corrente de comércio afetaria sobremaneira a vida das populações. Por isso, a previsão é que, se sanções produtivas vierem por parte da Europa e dos Estados Unidos, serão brandas, mais para marcar posição. De qualquer forma, não se pode deixar de prever uma desaceleração mundial, com reflexos na economia brasileira. Tempos mais difíceis hão de vir. Liana Martinelli - Brasil
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Liana Lourenço Martinelli, advogada, pós-graduada em Gestão de
Negócios e Comércio Internacional, é gerente de Governança Ambiental, Social e
Corporativa (ESG) do Grupo Fiorde, constituído pelas empresas Fiorde Logística
Internacional, FTA Transportes e Armazéns Gerais e Barter Comércio
Internacional. E-mail: lianalourenco@fiorde.com.br. Site: www.fiorde.com.br
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