A escrita sempre foi uma válvula de escape para a santantonense Cheila Delgado, que escreve poemas desde a adolescência. Apesar de não se considerar poetisa, aceitou o desafio de colocar a sua arte em livro
“Poetisa
não, por favor” é o título do primeiro livro de poesia da santantonense
Cheila Delgado. A obra composta por cinquenta páginas foi lançada quinta-feira,
02, na cidade da Praia.
Nasceu
na localidade de João Afonso, em Ribeira Grande de Santo Antão, e desde tenra
idade enfrentou várias dificuldades, inclusive não conhece a mãe apesar da
progenitora estar viva, que segundo diz é um peso que carrega para o resto da
vida. “Tive vários desafios no meu percurso, mas aos poucos consegui superar
sem muito barulho e holofotes”, conta em entrevista ao Balai.
A
escrita sempre foi uma válvula de escape. “Tudo o que vivo, observo e que
experiencio tenho sempre o hábito de registar e de escrever de uma forma,
digamos assim, mais poética e criativa. Desde a adolescência que gosto de
escrever. Fui para a área de letras, fiz Humanística e, mais tarde, enveredei
pela área de Comunicação Social, vertente Relações Públicas. Sempre escrevia,
mas deixava na gaveta, tanto é que as pessoas me perguntam desde quando escrevo
(risos)”, diz e revela que chegou a publicar alguns dos seus poemas numa página
de Facebook tendo recebido um bom feedback.
Após
vários anos a escrever e a deixar no fundo da gaveta, Cheila Delgado foi
recentemente desafiada pela editora JovemTudo Cabo Verde a partilhar a sua arte
com o público. “O desafio foi tanto que o título é “Poetisa não, por favor”.
Sempre disse que não sou poetisa. (…) Então, esse título também veio dessa
negação de ser poetisa. Considero-me uma amante da escrita criativa. Escrevo o
que sinto. Acho que a criatividade acaba também por ser a minha fonte no meu
dia a dia porque trabalho com Marketing Digital e com conteúdos para as redes
sociais no geral das Páginas Amarelas de Cabo Verde, um grupo que exporta
conteúdos também para Tanzânia, Quénia, Timor-Leste, Angola e Moçambique”, diz
a jovem que trabalha nas Páginas Amarelas desde 2014.
A
sua escrita é inspirada em coisas simples, “mas que têm um valor enorme na vida
das pessoas”. “Inspiro-me nos desafios que qualquer mulher passa, a minha
vivência em Santo Antão, as histórias que a minha avó me contava, as mudanças
do que é, por exemplo, a vivência do antigamente e de hoje, o sofrimento, o pôr
do sol, a lua, o sol, porque gosto muito da natureza.”
Cheila
Delgado já esteve no Brasil, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste e o livro
expressa essas vivências, bem como de Cabo Verde. “A maioria dos poemas já
estava pronta. Há poemas que escrevi quando estava a fazer o meu curso no
Brasil em 2008. (…) E esse livro não veio com a preocupação da forma estética
do poema, de rimas e de versos, mas uma reflexão sobre questões que vejo no dia
a dia, também muita leveza. Questões simples do ser, do amar, do sentir, do
estar. E é o que esperamos da apresentação, que seja leve. Não quero nada
amassador tanto é que terá um momento descontraído de Slam Poetry com criativos
locais”, diz e acrescenta que no ano passado participou pela primeira vez no
Spoken Word Cabo Verde. “O significado da palavra e do que ela faz nas pessoas
para mim foi o maior ganho que tive em termos de Spoken Word.”
As
gravuras do livro são da autoria da ilustradora digital Marly Tavares que
segundo a escritora a deixam “mais leve e mais interessante”. “Há também uma
imagem que foi cedida pelo artista plástico Tutu Sousa.”
“O
livro veio também de quatro simbologias: O tempo que é identificado como
ampulheta. (…) O camaleão que tive a audácia de colocar ’camaleoa’, uma palavra
que não existe na língua portuguesa. Os traços, a ilustração da capa é uma foto
minha de perfil, mas preferi colocá-la em traços porque para mim tudo o que são
traços têm um significado. (…) E a pena, para mim é onde sinto em paz, quando
tenho uma folha de papel em branco para escrever sem regra/preocupação em
vender ou agradar”, diz a escritora que tem um poema intitulado “Parto” no III
volume da antologia “Mulheres e seus Destinos”. “Esse convite na verdade é
desde a primeira edição. (…) Parto é um poema um pouco picante, crítico e que
colocar o dedo na ferida do que são as mazelas de uma mãe que acaba por ter um
filho e por criá-lo sozinha”.
“O voluntariado é algo que me completa”
Em
2021, Cheila Delgado integrou a plataforma sem fins lucrativos Geração B-Bright
e descobriu uma nova paixão – o voluntariado, algo que lhe trouxe uma
satisfação pessoal.
“Tenho
feito trabalho de voluntariado desde o TEDxPraia 2021 – Tunuka onde fui
coordenadora de comunicação. É uma paixão que sempre tive e que não consegui
colocar em prática na sua plenitude. (…) Acho que até ao fim da minha vida
tenho que estar de alguma forma a fazer voluntariado porque é algo que me
completa. (…) Esse lado de doar para o outro sem esperar nada em troca é algo
que me trouxe uma satisfação pessoal. (…) Sei que estou a fazer alguma coisa
que tem impacto numa pessoa que talvez não tenha a mesma oportunidade do que
eu. E o trouxe como um projeto pessoal também. Este livro não é motivado por
questões financeiras, mas o quero aliar a um projeto que é de levar a escrita
criativa para as escolas, juntamente, é claro, com a parceria da editora
JovemTudo Cabo Verde“, diz e revela que quer ter algo materializado para
inspirar outras crianças, mulheres, enfim.
Questionada
sobre se pretende continuar a escrever, Cheila não hesita em afirmar que sim.
“Vou continuar a escrever sempre, independentemente de lançar ou não. Mas quero
principalmente conseguir inspirar outras crianças. O projeto da escrita
criativa vai começar na cidade da Praia – na Escola Eugénio Tavares onde estuda
o filho de 11 anos – mas quem sabe posso expandi-lo para outras instituições de
ensino como, por exemplo, no interior da ilha de Santo Antão.”
O
livro “Poetisa não, por favor” foi lançado na passada quinta-feira, 02,
no Palácio da Presidência da República. A apresentação da obra que contou com
apoio da Caixa Económica de Cabo Verde e das Páginas Amarelas de Cabo Verde esteve
a cargo da escritora Vera Duarte. Aline Oliveira – Cabo Verde in “Balai
Cabo Verde”
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