Dois
concertos com músicas do rei D. Pedro (I do Brasil e IV de Portugal) e da sua
época vão realizar-se em Lisboa, em outubro próximo e em janeiro de 2023,
reunindo cerca de 90 músicos de várias nacionalidades.
A
iniciativa, da Cão Lilás Associação Cultural, à qual está ligado o maestro
luso-brasileiro Ricardo Bernardes, o organizador dos dois concertos, insere-se
no âmbito das comemorações dos 200 anos da independência do Brasil e conta com
o apoio de várias entidades, entre as quais a missão diplomática brasileira
junto da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) e a Direção-Geral
das Artes, do Ministério da Cultura.
O
maestro Ricardo Bernardes disse esperar que com os dois concertos “se venha a
conhecer o reportório e o contexto em que esteve imerso D. Pedro”. Um contexto
ainda pouco conhecido, por diversos fatores.
“D.
Pedro era uma pessoa tão multifacetada, que, para além de todas as ocupações
que tinha, enquanto gestor de toda a sua vida e de todas as suas coisas, ainda
tinha tempo para dedicar-se com assiduidade à música”, frisou Bernardes.
Além
disso, na opinião do maestro, é importante perceber-se “quem foram os seus
mestres, as suas influências e as suas consequências”.
“Todo
esse mundo musical à volta do D. Pedro, seja quando ele esteve em São Paulo, ou
quando passou por Minas Gerais – que sabemos que esteve lá em 1817 -, ou então
o D. Pedro da capital do Rio de Janeiro, que convive com três grandes músicos,
Neukomm, Nunes Garcia e Marcos Portugal, e que depois vem morrer cá [em
Portugal], em Queluz, também rodeado de música e atividades”, sublinhou.
Assim,
“D. Pedro e a Música após o ‘Grito do Ipiranga'” é o tema do primeiro concerto,
na abertura da 34.ª Temporada de Música em São Roque, iniciativa da Santa Casa
de Misericórdia de Lisboa, em 21 de outubro de 2022, na Igreja de São Roque, e
que reunirá cerca de 30 músicos.
O
programa integra obras do compositor lisboeta André da Silva Gomes (1752-1844),
que foi responsável pela música na Sé de São Paulo logo após o “Grito do
Ipiranga” (o grito da independência do Brasil), e de João de Deus de Castro
Lobo (1794-1832), principal compositor em atividade em Vila Rica, no estado
brasileiro de Minas Gerais, que dirigiu a música para a visita de D. Pedro
aquela localidade, em 1817.
“Um
Reino e Um Império – A música na Capela Real do Rio de Janeiro no tempo de D.
Pedro” é o tema do segundo concerto, agendado para 07 de janeiro, em sítio
ainda por confirmar, mas que o maestro admite que possa ocorrer também na
Igreja de São Roque.
Este
concerto apresentará obras musicais inéditas compostas no Rio de Janeiro
durante a permanência da corte portuguesa no Brasil da autoria de D. Pedro IV
(1798-1834) e dos compositores Marcos Portugal (1762-1830), Sigismund Neukomm
(1778-1858) e José Maurício Nunes Garcia (1767-1830) e reunirá mais de 60
músicos e solistas de renome internacional, portugueses e brasileiros, mas
também de outras nacionalidades, explicou à Lusa Ricardo Bernardes.
“Marcos
Portugal e Sigismund Neukomm foram professores de música de D. Pedro no Rio de
Janeiro, enquanto Nunes Garcia foi um compositor muito admirado por D. João VI.
As suas obras ajudarão a criar o contexto musical bastante rico e variado em
que D. Pedro esteve imerso no Brasil”, refere o maestro também numa nota
enviada à Lusa.
“A
Capela de Música da corte portuguesa no Rio de Janeiro foi das mais importantes
capelas principescas de seu tempo, contando com numerosos músicos, entre os
melhores cantores e instrumentistas vindos de Portugal e de outros países
europeus, tendo sido o maior agrupamento musical fora da Europa no período”,
acrescenta.
Em
07 de setembro de 1822 foi proclamada a independência do Brasil pelo príncipe
D. Pedro de Bragança e ocorre “Grito do Ipiranga” nas margens do rio com o
mesmo nome, mas a declaração de independência só foi assinada alguns dias
depois, na corte do Rio de Janeiro, pela princesa Leopoldina de Habsburgo.
“A
celebração de tão importante acontecimento teve de ser realizada sem muita
preparação”, referiu o maestro.
“Como
teriam sido as comemorações apressadas? Quais teriam sido as festas, as odes
declamadas, os teatros encenados e a música executada?”, questionou, explicando
que foi com base nestas celebrações imaginárias que propôs um programa para os
dois concertos, com obras que considerou terem sido aquelas que “muito bem
poderiam ter sido executadas nas celebrações da independência do Brasil em duas
das vilas mais importantes” do recém-independente país.
Se
houvesse obras remanescentes das comemorações da independência em arquivos na
Bahia, no Recife, no Pará e em tantas outras localidades, certamente fariam
parte do programa.
“Mas
só podemos trabalhar com as obras que o tempo e os homens permitiram
sobreviver”, sublinhou.
“Propomos,
portanto, ao público da Lisboa de 2022 uma viagem musical e estética no tempo,
aos idos de 1822, com obras que certamente poderiam ter figurado nessas
cerimônias, ao modo como dizem os italianos: ‘Se non è vero, è ben trovato’ [se
não é verdade, é bem provável]”, apontou Ricardo Bernardes.
Quanto
ao repertório, “é ainda pouco conhecido”, assegurou, devido ao “escasso número
de gravações e concertos propostos com esta temática”.
Uma
questão que se explica pelas poucas partituras editadas e disponíveis, assim
como pela dificuldade técnica e de meios para a execução dessas obras, que
requerem um efetivo vocal e instrumental de maior porte, rematou. In “Mundo
Lusíada” – Brasil com “Lusa”
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