Pintura Arq. Eduardo Moreira Santos, Lx (28.08.1904 - 23.04.1992)

domingo, 7 de agosto de 2022

Brasil - Livro homenageia o papel dos emigrantes madeirenses

No passado mês de abril, foi lançado o livro “O Regresso dos que nunca partiram: Memórias e histórias da emigração de São Roque do Faial” da autoria de Octávio Carmo e Odília Abreu. O livro reúne fontes documentais e testemunhos de emigrantes oriundos da Madeira (Portugal) que fizeram do Brasil o seu novo lar e enalteceram a sua terra de origem através da transmissão e preservação da cultura madeirense.

O livro editado pela Casa do Povo de S. Roque do Faial, freguesia (vila) do Concelho de Santana, na Região Autónoma da Madeira é considerado um caso de estudo ao estar centrado nas vivências de uma freguesia, cujos fluxos migratórios refletem a realidade da Região.

A publicação reúne fontes documentais, registos de petições de passaportes, entrevistas à especialistas, assim como relatos de vida dos emigrantes e seus descendentes. Este livro quer ser o “regresso” que não foi possível para tantos, que, embora tenham saído dali, foram sempre inteiros no seu amor pela terra. “Nunca partiram” traz a divulgação do livro.

A publicação está dirigida ao público em geral, que tenha interesse pela análise dos movimentos migratórios da Região Autónoma da Madeira, assim como todos os emigrantes e seus descendentes que procuram informação sobre as suas raízes, de forma especial os que partiram de S. Roque do Faial. A publicação incluí capítulos dedicados também a outros destinos como o Havaí, a Venezuela, Trinidad e Tobago, entre outros.

A realidade da emigração em São Roque do Faial, tem estado no centro do projeto “Memórias de S. Roque do Faial - As vozes dos emigrantes”, que nasceu no ano 2013.

A investigação levada a cabo desde então tem dado voz a exemplos concretos de quem viveu na pele as várias etapas do “itinerário migratório”, narrando as contingências que os levaram a deixar a ilha no século XX, devido a escassez de terrenos, as dificuldades econômicas e, nalguns casos, a fome.

Para trás ficavam terras, casas, benfeitorias, às vezes mesmo filhos, quando o dinheiro não chegava para as passagens de todos. Alguns dos testemunhos recolhidos permitem, em particular, evocar uma situação particularmente dolorosa: os que nunca regressaram.

Brasil, o destino esquecido

Falar da emigração para o Brasil é mencionar uma emigração esquecida. Centenas de famílias venderam os seus bens e partiram, sem ter a oportunidade de voltar. Muitos apelidos desapareceram por completo da vila de S. Roque do Faial, na Madeira, mas as suas raízes espalharam-se por território brasileiro e hoje podemos afirmar que existe uma “segunda” freguesia, formada pelos seus emigrantes e descendentes na cidade de Osasco, a 5ª maior do Estado de São Paulo.

Os registos de requerimentos de passaportes para o Brasil de 1872 a 1924 revelam que o país latino-americano foi o principal destino na época citada, com um total 111 requerimentos.

Entre os anos 1950 e 1960 do século XX, com base na informação relativa às fichas consulares do Consulado do Brasil no Funchal e nos registos de estrangeiros no Brasil, rumaram ao país sul-americano aproximadamente 380 pessoas – 114 eram menores de idade.

A influência madeirense está presente ao longo de todo o país: nas padarias; na vida cultural; nas Casas da Madeira, onde se dança o bailinho; no Santuário Nossa Senhora do Rosário de Fátima em S. Paulo; nos clubes de futebol como ‘A Portuguesa’; na mistura de sons e sabores; nas bordadeiras do Morro de S. Bento, que entre linhas e agulhas bordaram uma segunda Madeira, nessas encostas que lembravam as ruas inclinadas da sua terra natal; no sacrifício dos que lavraram as fazendas do café e abriram os seus negócios, guiados pelo espírito empreendedor.

Sobre o livro

“O Regresso dos que nunca partiram: Memórias e histórias da emigração de São Roque do Faial” é fruto de uma investigação sobre os fluxos migratórios de S. Roque do Faial levada a cabo ao longo de sete anos. Através da análise de fontes documentais, de registos de petições de passaportes, de entrevistas à especialistas, assim como de relatos de vida dos emigrantes e seus descendentes, esta publicação é a reconstrução da trajetória de centenas de famílias que partiram rumo ao desconhecido à procura de uma vida melhor.

Esta é uma investigação sobre a vida real, a dor, o amor: recordamos o sentimento de tantas mães e avós que viram partir os seus filhos e netos para terras distantes. Há uma diferença entre ‘estar’ numa terra e ‘ser’ dessa terra. Quem parte nunca deixa de ser e muitos dos que nunca lá estiveram, como os filhos ou netos dos emigrantes, têm-na como referência do que são.

Não é fácil falar do não-regresso, do não-reencontro e como é que estas realidades marcam a vida concreta de quem vive noutro país. Sabemos que há muitos motivos para estes não-regressos, para além da impossibilidade de reunir recursos econômicos para concretizar a visita à terra natal: há quem nunca quis voltar; quem perdeu raízes e deixou de querer reencontrar-se com um passado que lhe passou a parecer vazio; quem se integrou de tal forma no local de destino que passou a ter outra terra como referência identitária; quem não tinha nada para “mostrar” como prova do sucesso da emigração e ficou refém desta vergonha; quem morreu jovem ou vítima de violência e acidentes…

A ilha ficou longe, cheia de imagens, sentimentos e significados- a terra natal, o calor do lar familiar, a lembrança desse ser querido que já partiu, as brincadeiras de criança.

“Eu vou bem graças a Deus, só com muitas saudades que nem tenho tido vontade de escrever, quando começo choro, mas o que se há de fazer, cada um com as suas dores”.

Estes nossos antepassados merecem ser olhados de outra forma, sobretudo aqueles que foram, mais do que emigrantes, construtores de uma sociedade nova num mundo desconhecido, com as ferramentas de que dispunham e procurando replicar as sociabilidades que lhes eram familiares.


Os autores

Octávio Carmo, natural de São Roque do Faial, Madeira, nasceu a 11 de maio de 1976. Jornalista, tem licenciatura em Teologia pela Universidade Católica Portuguesa (UCP) e pós-graduação em patrimônio religioso, pela mesma instituição. Colaborou com projetos do Secretariado Nacional dos Bens Culturais da Igreja e do Centro de Estudos de História Religiosa da UCP.

Odília Abreu, natural da Venezuela, nasceu em 1979. Licenciada em Comunicação Social pela Universidade do Minho (UM)- Portugal, tem pós-graduação em Informação Internacional e um Mestrado em Comunicação Social pela Universidade Complutense de Madrid- Espanha. Dedica-se à coordenação de projetos de cooperação internacional para o desenvolvimento.

Para mais informação, conheça o Projeto Memórias S. Roque do Faial em:

www.facebook.com/memorias.srf. In “Mundo Lusíada” - Brasil



 

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