Chama-se “Uma Breve História Cultural do Chá da China”, tem a chancela da Praia Grande edições e é o novo livro de Rui Rocha a ser lançado no próximo domingo no âmbito do festival literário Rota das Letras. Ao HM, o autor, académico e antigo presidente do Instituto Português do Oriente, confessa o seu enorme interesse pela história da cultura do chá e a importância de dar a conhecer este universo ao público português
Como surgiu a possibilidade de lançar este livro?
A
história cultural do chá é um dos tópicos da história cultural da China que me
interessa desde há muitos anos, em resultado de a minha mãe, natural de Macau,
ter sido uma apreciadora do chá e receber regulamente chá enviado de familiares
de Macau designadamente, o chá preto Pǔ’ěr, o chá oolong Tiěguānyīn e o o chá
floral Mòlihuā (chá de jasmim). A vinda para Macau, em 1983, reforçou este meu
interesse, tendo tido a possibilidade de conhecer uma multiplicidade de
variedades de chá, de visitar plantações e de ter acesso a livros sobre o chá
publicados na China. Tive ainda o privilégio de aprender com mestres, amigos e
proprietários de lojas de chá no Continente. Um editor em Portugal manifestou
interesse em publicar o meu livro, mas tudo o que aprendi sobre a história e a
arte do chá deveu-se a Macau, pelo que para mim, emocionalmente, faria mais
sentido que este livro fosse publicado em Macau.
Quais os principais objectivos que pretende atingir com a
edição deste livro?
Quero
dar a conhecer aos falantes dos países de língua oficial portuguesa,
interessados pelo chá da China, a imensa riqueza histórica e cultural da bebida
do chá que faz parte integrante da história política, económica, social e
cultural da China ao longo de, pelo menos, três mil anos. Além disso, quero
contribuir para um maior interesse pela bebida do chá chinês nos países de
língua oficial portuguesa, não apenas no plano meramente cultural ou estético,
mas também pelas suas elevadas qualidades medicinais e terapêuticas. Mas
pretendi também precisar conceitos quanto à origem, designação, classificação e
propriedades dos chás chineses e caracterizar as etapas de preparação do chá ao
longo da história da China. Este livro pretende também especificar os
diferentes tipos de cerimónias de chá, bem como as respectivas filosofias, além
de identificar os utensílios utilizados na arte do chá e critérios de
preparação consoante o tipo de chá a utilizar. Friso ainda o facto da obra
estabelecer a ligação íntima entre a bebida do chá e a tradição esotérica
chinesa além de apresentar, de forma muito breve, a transmissão da arte do chá
nos países culturalmente tributários da China, bem como a introdução do chá no
mundo ocidental, designadamente na Europa e nos EUA.
Quais as principais histórias e chás que inclui nesta
obra?
Era
importante dar a conhecer a relevância política, social e cultural que o chá
teve e tem ainda na vida do povo chinês que, de certo modo, se confunde
transversalmente com a própria história milenar da China. A arte e a apreciação
do chá na cultura chinesa manifestam-se na poesia, na pintura, na caligrafia,
na tradição das óperas populares da recolha do chá e ainda nos eventos sociais
e familiares, tais como casamentos e outras celebrações. O livro apresenta
aspectos menos conhecidos como, por exemplo, a simbologia da numerologia na
arte do chá, a começar pelo próprio caracter chinês que, decomposto dos seus
radicais, significa o número 108, um número sagrado para várias correntes de
pensamento orientais, como o hinduísmo, o budismo, o jainismo, o ioga ligado às
práticas dármicas. Os dígitos individuais (1, 0, 8) representam uma coisa, nada
e tudo (infinito), figurando, assim, a crença da realidade última do universo
como sendo simultaneamente um, vazio e infinito. O livro revela outras
particularidades interessantes como, por exemplo, a importância que novas
plantações de chá tiveram na erradicação da pobreza em regiões pobres da China,
criando melhores condições de vida para as populações.
Como foi o processo de pesquisa e investigação para este
livro?
Este
livro é o resultado de 30 anos de estudo sobre o chá, com base em obras
publicadas na China a partir da década de 80 do século XX também de muitas
conversas e contributos de mestres de chá, longas horas passadas em lojas de
chá provando diferentes tipos de chá e aprendendo com quem vive o seu
quotidiano da cultura do chá.
O que é que o público português pode aprender de novo
sobre o chá chinês que não saberia até então?
Em
Portugal sabe-se muito pouco sobre a cultura chinesa do chá, bem como sobre a
história cultural chinesa em geral. E, como afirmou o geógrafo francês Vidal La
Blache (1845-1918), “O chá é filho do meio chinês”. Isto significa que para as
pessoas interessadas em conhecer a história do chá e da sua expansão para o
mundo, cujas origens ancestrais estão recenseadas em solo chinês, o meu livro
poderá ajudar um pouco a aprofundar este tópico.
Como se sente por lançar esta obra em mais uma edição do
Rota das Letras?
É
evidente que para uma pessoa que vive em Macau há cerca de 40 anos poder
participar na 11ª edição da Rota das Letras é uma honra e o facto de o livro
ser apresentado pelo Dr. Shee Va é igualmente muito gratificante. Desejo que a
leitura do livro seja tão estimulante para os leitores como para mim foi
investigar sobre a cultura do chá na China. Andreia Silva – Macau in “Hoje
Macau”
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