A
vacina contra a dengue desenvolvida pelo Instituto Butantan (Butantan-DV)
mostrou uma eficácia de 79,6% para evitar a doença, de acordo com o estudo
clínico de fase 3. Os dados são de um acompanhamento de dois anos com mais de
16 mil indivíduos de todo o Brasil.
Durante
esse período, não foi reportado nenhum caso grave de dengue nos participantes.
O resultado positivo é fruto de um trabalho de mais de 10 anos com parceiros
internacionais e pode ter grande impacto na saúde pública brasileira. Até
dezembro de 2022, o Brasil registrou 1,4 milhão de casos e 978 óbitos pela
doença, um aumento de 172,4% e 400% em relação ao ano anterior, segundo o
Ministério da Saúde.
Em
andamento desde 2016, a fase 3 envolve 16235 voluntários de 2 a 59 anos,
avaliados por 16 centros de pesquisa de diferentes regiões do país. O
imunizante foi administrado em 10259 pessoas, em dose única, e o restante
recebeu placebo. A incidência de casos de dengue sintomáticos confirmados por
laboratório foi analisada depois de 28 dias da vacinação até dois anos de
seguimento de cada participante. O estudo seguirá até todos os indivíduos
completarem cinco anos de acompanhamento, em 2024.
A
eficácia da vacina também foi avaliada, separadamente, de acordo com a exposição
prévia ao vírus da dengue. Em pessoas que contraíram a doença antes do estudo,
a proteção foi de 89,2%. Já naqueles que nunca tiveram contato com o vírus, a
eficácia foi de 73,5%.
A
vacina do Butantan é tetravalente, feita para proteger contra os quatro
sorotipos do vírus da dengue (DENV-1, DENV-2, DENV-3 e DENV-4). No entanto, no
período da pesquisa, apenas os tipos 1 e 2 circularam no país. A eficácia
registrada para evitar a infecção por estes vírus foi de 89,5% e 69,6%,
respectivamente.
A
fase 3 segue em andamento e os pesquisadores ainda pretendem gerar dados de
eficácia para os sorotipos 3 e 4. Na fase 2 do ensaio clínico, que teve seus
resultados publicados em artigo na The Lancet Infectious Diseases, 80% dos
voluntários produziram anticorpos contra os quatro sorotipos.
Segurança
O
estudo avaliou a frequência de reações adversas até 21 dias após a vacinação.
Das mais de 10 mil pessoas que receberam o imunizante, apenas três (menos de
0,1%) apresentaram eventos adversos graves, e todos se recuperaram totalmente.
A frequência de eventos adversos foi semelhante entre as três faixas etárias
(2-6, 7-17 e 18-59 anos).
A
vacina do Butantan tem perfil de segurança semelhante tanto para quem teve a
doença como para aqueles que nunca tiveram contato com o vírus. Hoje, no
Brasil, há somente uma vacina aprovada pela Agência Nacional de Vigilância
Sanitária (Anvisa), disponível na rede privada e indicada apenas para quem já
teve dengue.
O trabalho de uma década
A
Butantan-DV é derivada de uma tecnologia do Instituto Nacional de Saúde
Americano (NIH) licenciada em 2009. A instituição americana cedeu as patentes e
os materiais biológicos referentes às quatro cepas virais que compõem a vacina
da dengue, permitindo que o Butantan produza e distribua o imunizante no
Brasil. Em 2018, o instituto assinou um acordo de colaboração e licenciamento
com a farmacêutica multinacional MSD, em uma ação conjunta para acelerar o
desenvolvimento e registro do produto.
A
fase 1 do ensaio clínico, desenvolvida nos Estados Unidos (2010-2012), e a fase
2, conduzida no Brasil (2013-2015), mostraram que a vacina induz produção de
anticorpos contra os quatro sorotipos do vírus. Esse é o maior desafio na
produção de uma vacina contra a dengue, já que é possível ser infectado mais de
uma vez por diferentes vírus – e no caso de uma reinfecção, a chance de
desenvolver uma doença grave e com risco de morte é maior.
Caso
o imunizante seja aprovado futuramente pela Anvisa, ele poderá ser incorporado
ao Programa Nacional de Imunizações (PNI) e disponibilizado gratuitamente para
a população brasileira. A vacina é composta pelos quatro tipos do vírus da
dengue atenuados, ou seja, enfraquecidos, que induzem a produção de anticorpos
sem causar a doença e com poucas reações adversas.
Produção nacional de amplo impacto
A
fábrica do Butantan que produzirá futuramente a vacina contra a dengue já está
pronta – lá também será produzido o imunizante contra a chikungunya (que está
em fase final de ensaios clínicos). No ano passado, o parque industrial do
Butantan produziu 100 milhões de doses de CoronaVac, 80 milhões de doses de
vacina contra a gripe, 28 milhões de doses de vacinas contra hepatite A e B,
HPV, DTaP e raiva, e 560 mil unidades de soros.
A
autonomia do Brasil na produção de vacinas, em especial contra arboviroses,
pode mudar o rumo do combate a essas doenças na América Latina. Em entrevista
recente ao Portal do Butantan, o epidemiologista da Organização Pan-Americana
da Saúde (OPAS) Carlos Frederico Campelo afirmou que o controle da doença no
maior país da região tem o poder de mudar o cenário endêmico em todo o
continente americano, além de servir como modelo para outros países.
De
acordo com a OPAS, cerca de 500 milhões de pessoas nas Américas correm o risco
de contrair dengue. O número de casos na região aumentou muito nas últimas
quatro décadas, passando de 1,5 milhão de casos acumulados na década de 1980
para 16,2 milhões na década de 2010-2019. No mundo, 400 milhões de pessoas são
acometidas pela dengue anualmente. In “Mundo Lusíada” - Brasil
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