Dois missionários lusófonos radicados no Japão falaram sobre os desafios de tentar expandir a religião católica numa realidade “radicalmente diferente”
“Nos
fins de semana isto fica cheio, duas mil pessoas”, disse, com orgulho, o
português Nuno Lima, pároco na Catedral de Osaka, a terceira maior cidade do
Japão, com cerca de 2,7 milhões de habitantes.
Muito
diferente é a realidade do moçambicano Hipólito Vida, pároco de três paróquias
rurais: Sennan, Kinokawa e Misaki, “a menor, é uma espécie de família. E
acrescentou: “Os católicos registados são 50 e os que participam nas missas são
15, 20”.
Ambos
pertencem à Sociedade Missionária da Boa Nova, um grupo apostólico dedicado à
evangelização, atualmente presente em Portugal, Moçambique, Brasil, Angola,
Zâmbia e Japão.
O
primeiro a chegar, há 26 anos, foi Nuno Lima, natural de São João da Madeira.
“Sempre
achei interessante ou desafiante este encontro com o diferente. Então o Japão
seria, para mim, era esta possibilidade de pensar e transmitir o cristianismo
num contexto radicalmente diferente”, explicou o missionário.
Ainda
assim, Lima sublinhou que há uma longa história a ligar Portugal e Japão,
destacada na Expo2025 em Osaka, onde o pároco é vice-comissário geral do
Pavilhão da Santa Sé integrado na Pavilhão da Itália.
Tal
como Nuno Lima, também Hipólito Vida, natural de Angoche, na província de
Nampula, no norte de Moçambique, passou os primeiros dois anos no Japão a
aprender a língua, depois de estudar Teologia na Universidade Católica de
Porto.
“Durante
esses dois anos, quis desistir muitas vezes. Cheguei a arrumar minhas malas
para voltar para casa. Mas os meus colegas sempre diziam: ‘Olha, ninguém morreu
por estar aqui’”, recordou o pároco, ordenado com 33 anos.
Mas
Vida admitiu que “é preciso morrer para ressurgir de novo” como missionário.
“Eu
vim com aquela ideia de Moçambique, uma missão muito mais aberta, muito mais
criativa, com guitarra, danças e tudo, como a nossa cultura moçambicana”,
recordou o missionário.
“Quando
eu cheguei aqui, percebi que as coisas não funcionam assim, diante desta
realidade que é o Japão, uma realidade completamente diferente”, frisou Vida.
Ao
contrário de países como Portugal, onde a Igreja Católica é dominante, no Japão
“não podemos dar por garantido que as pessoas saibam o que é que significa, por
exemplo, a missa”, explicou Nuno Lima.
Afinal,
apenas cerca de metade dos fiéis japoneses em Osaka cresceram em famílias
católicas, algumas descendentes dos “kakure kirishitan”, “cristãos
ocultos/escondidos” que sobreviveram à perseguição e torturas no século XVII.
Ainda
assim, dois terços dos fiéis católicos em Osaka continuam a ser estrangeiros e
a catedral da cidade celebra missas em japonês, inglês, vietnamita e coreano,
disse Lima.
“Temos
que procurar estar próximo das pessoas e, através da curiosidade, transmitir a
mensagem de uma forma que lhes toque o coração”, referiu o português, apontando
para um retrato de Nossa Senhora em trajes tradicionais japonesas.
“Se
calhar nós, como Igreja, ainda não conseguimos fazê-lo de um modo mais vivo,
que ultrapasse esta barreira dos preconceitos, das ideias prévias”, lamentou
Lima, numa referência à imagem que o catolicismo tem como uma religião
estrangeira.
Hipólito
Vida diz que procura conhecer os habitantes das três paróquias através do modo
de ser e da alegria. “As pessoas vão dizer que eu sou o padre do sorriso e eu
gosto muito de brincar”, explicou.
Entre
aqueles que se convertem, explicou Nuno Lima, alguns fazem-no por casamento,
mas a maioria já tinha tido contacto com a religião católica nas escolas ou
mesmo infantários cristãos.
Estes
estabelecimentos são populares entre os pais japonesas devido ao “bom currículo
académico” e aos “valores cristãos”, que o missionário descreve como “ajudar e
amar o próximo”.
Mas
Hipólito Vida defendeu que os convertidos, “uma vez budistas, morrem budistas”.
“Vão à missa, aos domingos, rezam, fazem toda a atividade da Igreja, mas quando
há um evento budista, eles participam”, explicou.
No
que toca ao futuro, o moçambicano pondera ir estudar no Vaticano, mas para
depois regressar: “Não me vejo em outra realidade que não seja no Japão”.
Também
Nuno Lima garantiu que gostaria de continuar no país. “Mas em relação ao
futuro, só Deus sabe”, acrescentou. In “Bom dia Europa” - Luxemburgo
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