Equipa espera descobrir novas evidências sobre o papel dos glicanos no controlo da inflamação intestinal que caracteriza a Doença de Crohn
Uma
equipa multidisciplinar, liderada pela investigadora Salomé Pinho, do Instituto
de Investigação e Inovação em Saúde da Universidade do Porto (i3S), vai avançar
com um estudo clínico pioneiro que visa explorar de que forma a suplementação
com glicanos pode intercetar o início do processo inflamatório que caracteriza
a transição para Doença de Crohn.
O
processo de recrutamento de doentes já começou no Hospital da Luz Lisboa, sob
coordenação da gastroenterologista Joana Torres, e todo o estudo clínico será
desenvolvido em colaboração com a empresa farmacêutica Medinfar. A equipa
espera que os resultados tragam à luz novas evidências sobre o papel dos
glicanos (açúcares complexos que revestem a superfície das células do
intestino) no controlo da inflamação intestinal que caracteriza a Doença de
Crohn.
O
estudo vai focar-se especificamente em doentes com Doença de Crohn que são
operados para remoção cirúrgica do segmento inflamado do intestino. Estes
doentes vêem “em teoria” a sua doença cirurgicamente removida. Contudo, uma
parte significativa destes doentes pode apresentar recidiva nos dez anos
seguintes. Nestas situações, os primeiros sinais são detetados por endoscopia
logo no primeiro ano após cirurgia e tudo indica que os processos que conduzem
à recidiva da inflamação são semelhantes aos que conduzem ao início da doença.
Ou seja, “pensa-se que os mesmos fatores que contribuem para o desenvolvimento
da doença nas suas fases iniciais serão os mesmos que contribuem para uma
recidiva no contexto pós-operatório”, esclarece Salomé Pinho, líder do grupo do
i3S «Immunology, Cancer & GlycoMedicine», coordenadora do projeto europeu
onde se insere este estudo clínico e professora afiliada da Faculdade de
Medicina (FMUP) e do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar (ICBAS) da
Universidade do Porto.
É
precisamente nesta fase, que mimetiza a transição da saúde para a inflamação
intestinal, que a equipa pretende intervir através da administração oral de um
glicano sob a forma de um suplemento dietético. “Temos evidências geradas
recentemente no grupo que demonstram a existência de alterações na composição
de glicanos (no processo de glicosilação) numa fase pré-clínica, onde ainda não
há sintomas, alteração essa que parece contribuir para o desencadear da
inflamação intestinal, daí a pertinência de reparar este defeito numa fase
precoce, antevendo a prevenção do início do processo inflamatório”, explica
Salomé Pinho.
Este
estudo surge na sequência dos resultados obtidos no âmbito do projeto europeu
GlycanTrigger, liderado pela mesma investigadora, e do qual também faz parte a
gastroenterologista Joana Torres, do Hospital da Luz Lisboa, responsável pela
coordenação e implementação do estudo clínico.
Os
doentes serão seguidos prospetivamente durante o período de seis meses após a
remoção cirúrgica do segmento do intestino que se encontra afetado. O objetivo
deste estudo, explica Joana Torres, “é estudar o impacto deste glicano na
composição e função do microbioma, e na proteção da barreira intestinal
composta por glicanos à superfície da mucosa (glicocalix), atuando assim num
dos potenciais mecanismos primários da doença”.
“Vamos
também tentar perceber qual o impacto clínico deste suplemento de glicanos no
controlo da resposta inflamatória do intestino nesta fase de transição
saúde-doença”, acrescenta Joana Revés, gastrenterologista que também integra a
equipa que irá acompanhar estes doentes.
A
implementação deste estudo clínico, assim como a sua coordenação será feita
pelo Hospital da Luz Lisboa. As manifestações de interesse por parte de doentes
com Doença de Crohn em participar podem ser enviadas para o email: GlycanTrigger@hospitaldaluz.pt
Parceria entre Ciência, Clínica e Indústria Farmacêutica
Este
estudo clínico, salientam as partes envolvidas, resulta de uma parceria muito
importante e desejada entre Ciência, Clínica e Indústria Farmacêutica. A
Medinfar será o parceiro da Indústria que fornecerá o suplemento de glicanos
seguindo as boas práticas de fabrico, antevendo o possível estabelecimento de
um novo produto para a promoção da saúde intestinal.
A
participação da Medinfar neste projeto, sublinha Mariana Almeida, Innovation
Manager da Medinfar, «reflete a aposta contínua que fazemos em Inovação e
Desenvolvimento com o objetivo de encontrar soluções que permitam dar resposta
às necessidades em saúde da população”.
Sobre a Doença de Crohn
A
doença de Crohn é uma doença intestinal inflamatória crónica e imuno-mediada
que causa inflamação do tubo digestivo e intestinal. Os sintomas comuns são
diarreia, dor abdominal, fadiga, perda de peso, entre outros. Pode afetar todos
os grupos etários, mas tipicamente é diagnosticada em adolescentes e adultos
jovens. Nos últimos anos, não só em Portugal como em todo o mundo, tem-se
assistido a uma incidência crescente desta patologia.
Em
muitos casos, consegue-se controlar a doença, evitando que as pessoas tenham
crises durante longos períodos. Contudo, continua a ser uma doença com um
enorme impacto na qualidade de vida dos doentes, com uma proporção
significativa a não responder aos tratamentos atualmente disponíveis e a
necessitar de cirurgia, o que realça a importância de se investigarem novos
paradigmas, nomeadamente ao nível do diagnóstico precoce e da prevenção da
doença.
A
equipa deste projeto tem vindo a reunir várias evidências que sustentam a
existência de uma fase pré-clínica da Doença de Crohn onde alterações
imunológicas existem até 10 anos antes do diagnóstico clínico. Intercetar estas
alterações será transformador para os doentes e respetivas famílias. Universidade
do Porto - Portugal
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