Em
termos de imprensa e do mundo jornalístico, um dos importantes acontecimentos
da semana, mesmo um tanto surpreendente, foi o editorial Aprendizes de
Bolsonaro do jornal O Estado de São Paulo, também conhecido como Estadão,
ao atacar com virulência o ex-presidente Jair Bolsonaro, seu clã político
familiar, e os governadores Romeu Zema, de Goiás, Ronaldo Caiado de Minas
Gerais e mais particularmente Tarcísio de Freitas de São Paulo.
As
críticas vieram na sequência da decisão do presidente norte americano Donald
Trump de agravar a taxação dos produtos brasileiros exportados para os EUA para
50%, como punição pelo tratamento dado pelo STF ao ex-presidente Jair
Bolsonaro, seguida da chantagem de ser anulada a taxação no caso de um decreto
de anistia.
Essa
chantagem ao governo brasileiro, equiparada como um atentado à soberania
nacional, arquitetada em Washington, por Eduardo Bolsonaro, filho do
ex-presidente, foi ignorada por alguns governadores.
Essa
abstenção ao que considera como um ataque às instituições brasileiras irritou a
direção do jornal Estadão, que reagiu duramente no editorial do domingo,
dia 13 de julho:
"O
recente ataque do presidente americano, Donald Trump, às instituições brasileiras,
supostamente em defesa de Bolsonaro, é só uma gota no oceano de males que o
bolsonarismo causa e ainda pode causar aos brasileiros".
E
mais adiante..."é ultrajante a complacência de governadores como Tarcísio
de Freitas (SP), Romeu Zema (MG) e Ronaldo Caiado (GO) diante dos ataques
promovidos pelo presidente dos EUA ao Brasil. As reações públicas dos três
serviram para expor a miséria moral e intelectual de uma parcela da direita que
se diz moderna, mas que continua a gravitar em torno de um ideário retrógrado,
personalista, francamente antinacional e falido como é o bolsonarismo.
Tarcísio,
Zema e Caiado, todos aspirantes ao cargo de presidente da República, usaram
suas redes sociais para tentar impingir a Lula, cada um a seu modo, a
responsabilidade pelo “tarifaço” de Trump contra as exportações brasileiras".
Ora,
o Estadão nos seus 150 anos representa a potência dos empresários,
banqueiros e dirigentes da indústria e economia paulista, em outras palavras, a
direita tradicional e conservadora, atingida em cheio pelo
"tarifaço".
Estadão
acabou com o sonho do capitão Tarcísio
Nesta
altura, com a divisão da direita, Tarcísio pode tirar o cavalo da chuva. Acabou
seu sonho de chegar à presidência. O governador de São Paulo, também capitão do
exército, estragou sua carreira ao colocar na cabeça, na avenida Paulista, no
último pequeno comício de Bolsonaro, o boné vermelho de apoio ao presidente
Trump - Faça a América maior de novo, como se tivesse mudado de nacionalidade e
deixado de ser brasileiro. Como se tivesse virado norte-americano. Erro fatal,
neste momento de uma onda de nacionalismo provocada por Trump.
Pensando
ser muito esperto, reagiu à carta chantagista e aos 50% de Trump contra o
Brasil sem coragem de atacar o presidente norte-americano, que mostra traços de
ditador. Isso lhe valeu ser taxado de vassalo pelo ministro brasileiro de
Economia Fernando Haddad.
Mas
faltava a pá de cal no capitão sem farda, candidato à presidência, depois de
ter perdido o apoio dos bolsonaristas ao tentar negociar um amaciamento nos 50%
de Trump, esquecendo-se de que isso foi obra do filho do seu amigo Bolsonaro,
com cuja bênção se elegeu governador de São Paulo. Trocou os pés pelas mãos e
conseguiu desagradar a gregos e troianos, criando condições para ser chamado de
vassalo dos EUA!
A
pá de cal veio de onde Tarcísio não esperava - foi condenado pelo editorial do
jornal Estadão, em outras palavras, pelo porta-voz dos grandes
empresários, dos donos da bola das empresas, indústrias, comércio e bancos do
Estado de São Paulo.
O
editorial do Estadão mostrou também ter rachado a direita, com a direita
democrática tomando distância do grupo de extrema-direita, do qual alguns
líderes estão sendo julgados por tentativa de golpe de Estado.
Resta
saber se a tentativa de golpe e se a tentativa de intervenção e chantagem dos
EUA provocaram reações dentro das igrejas e comunidades evangélicas,
sustentadoras do bolsonarismo.
Essa
crise coincide também com o julgamento do ex-presidente Bolsonaro por tentativa
de golpe. Ora, o clima criado por Trump com sua taxação de 50% ao Brasil não
favorece manifestações em favor de Bolsonaro. Rui Martins – Suíça
________
Rui Martins é
jornalista, escritor, ex-CBN e ex-Estadão, exilado durante a ditadura. Criador
do primeiro movimento internacional dos emigrantes, Brasileirinhos Apátridas,
que levou à recuperação da nacionalidade brasileira nata dos filhos dos
emigrantes com a Emenda Constitucional 54/07. Escreveu “Dinheiro Sujo da
Corrupção”, sobre as contas suíças de Maluf, e o primeiro livro sobre Roberto
Carlos, “A Rebelião Romântica da Jovem Guarda”, em 1966. Vive na Suíça,
correspondente do Expresso de Lisboa, Correio do Brasil e RFI.
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