Uma
pesquisa levada a cabo pelo Centro de Integridade Pública (CIP) questiona os
donos (indivíduos e empresas) de licenças de exploração mineira em Cabo
Delgado, que tendem a aumentar mesmo com terrorismo que assola a província há
cerca de quatro anos. “Pedidos de Concessões Mineiras aumentam à medida que
intensifica o conflito armado em Cabo Delgado: Quem são os senhores das
licenças de exploração mineira em Cabo Delgado?” – é o título do estudo.
O
relatório da investigação começa por explicar que a transparência da
propriedade beneficiária (de licenças de exploração mineira) é relevante, não
só para a prestação de contas, mas também para que os moçambicanos, verdadeiros
donos dos recursos naturais no país, conheçam quem detém as companhias que exploram
esses recursos e quem, em última instância, se beneficia das actividades dessas
companhias.
Uma
outra motivação, segundo o estudo, relaciona-se ao facto de, em alguns casos,
os beneficiários legais das concessões mineiras (os que constam dos documentos
de constituição legal da empresa) não coincidirem com os beneficiários
efectivos (os que realmente disponibilizaram o capital para o investimento).
Ademais,
a investigação explica que a divulgação dessas informações é um imperativo da
Iniciativa de Transparência da Indústria Extractiva (ITIE), organismo
internacional do qual Moçambique é membro. Embora seja obrigatório, o estudo
revela que o país não publica os donos de licenças de exploração mineira, com
destaque para Cabo Delgado.
“Passados
oito anos desde o início da fase piloto, e um ano após o prazo para a
publicação, Moçambique continua sem fazer a publicação, conforme definido no
roteiro (rodmap) da propriedade beneficiária divulgado pela ITIE Moçambique.
Numa análise aos nove relatórios da ITIE para Moçambique, constata-se que
apenas no quinto (5º), referente ao exercício de 2012 e no sexto (6º),
referente aos exercícios de 2013 e 2014, existe alguma informação sobre a
propriedade beneficiária. No entanto, o Secretariado Internacional da ITIE
considerou a informação divulgada nestes dois relatórios como não sendo da
propriedade beneficiária. Do sétimo (7º) ao nono (9º) relatório, houve um
retrocesso. Não foram mais publicadas informações sobre a propriedade
beneficiária”, relata o estudo.
Ainda
assim, o estudo mostra que as licenças de exploração em Cado Delgado têm vindo
a aumentar nos últimos anos, mesmo com o terrorismo. “Dados do cadastro mineiro
de Cabo Delgado mostram que, em 14 anos, de 1992 a 2016, ano anterior ao início
do conflito armado na província, foram atribuídas 67 licenças de concessão
mineira naquela província, isto é, em média foram atribuídas cerca de cinco
licenças por ano. No entanto, de 2017 a Fevereiro de 2021, após o início do
conflito armado, em apenas quatro anos foram atribuídas 46 licenças, isto é, 68
por cento acima das licenças atribuídas em 14 anos, numa média de 12 licenças
por ano. Era expectável que com o conflito armado, que se pode estender por
toda a província, houvesse uma redução dos pedidos de concessões mineiras, isso
seguindo a lógica de um investidor racional que reduz os seus investimentos
quando as incertezas, principalmente a guerra, aumentam. No entanto, os dados
mostram uma situação completamente diferente em Cabo Delgado”, expõe o estudo.
Para
elucidar o problema, o pesquisador diz ter recorrido ao Boletim da República no
202, III série, de 21 de Outubro de 2019, o investigador do CIP constatou, por
exemplo, que a empresa Nairoto Resources Holding é uma sociedade constituída
sob as leis da República das Maurícias, e representada em Moçambique por
Victoria Rumbidzai Sande. Para o investigador, a falta de mais informação sobre
os beneficiários, em situações como a descrita acima, “suscita dúvidas sobre
quem na verdade se beneficia dos recursos explorados na província,
principalmente quando o registo da mesma é numa jurisdição considerada como
sendo um paraíso fiscal, como são as Maurícias”.
Em
conclusão, o estudo revela que os maiores beneficiários finais das concessões
mineiras em Cabo Delgado são indivíduos que não são identificáveis através dos
registos públicos existentes em Moçambique.
“A
análise identifica indícios de ocultação deliberada dos beneficiários legais
das concessões mineiras nesta província. A ocultação é feita, ou através das
sociedades anónimas, ou por empresas registadas no estrangeiro, e em alguns
casos em países considerados paraísos fiscais”, observou o pesquisador.
Como
recomendação, o CIP apela ao Governo a obrigatoriedade de publicação da
informação sobre a propriedade beneficiária das concessões mineiras, desde
legal até efectiva, através da introdução, na legislação nacional, de
instrumentos legais que possam obrigar os titulares a proceder em conformidade.
Evaristo Chilingue – Moçambique in “Carta de
Moçambique”
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