É
evidente a vantagem que a estratégia reintegracionista representa para o avanço
do galego. Mesmo as pessoas que negam a igualdade do que se fala às duas beiras
do Minho aproveitam as ferramentas do português para acederem em melhores condições
ao mercado linguístico. A velocidade na produção de neologismos ou as traduções
audiovisuais são valores importantes num mundo onde as línguas se desenvolvem
de acordo com as lógicas capitalistas.
Porém,
não fiquemos fascinados polo slogan duma língua extensa e útil. Em
primeiro lugar, porque todas as línguas podem estender-se ou contrair-se: o
istriota pode servir, igual que o galego, para se entender com qualquer falante
duma língua românica, mas é pouco provável que fora do Morraço saibam o que
significa mandá-las por terra a Peniche. E ainda mais importante, porque
considerar que a utilidade depende do número de falantes é supremacismo
linguístico: a língua em que falo com a vizinha é a que realmente me resulta
verdadeiramente útil, por mais que a use menos gente que o mandarim.
O
conceito da lusofonia é apenas a última expressão duma retórica de exaltação
nacionalista e dominação colonial. Os mais de 200 milhões de falantes de
português contam-se sobre a invisibilização, a discriminação e mesmo o
extermínio das utentes de aparaí, balanta ou quémaque. Porque se o galego se
fai idioma forte é precisamente porque também pode ser língua opressora.
Resulta-nos singelo denunciar o castelhano como língua comum mas
esquecemos que o Dia da Lusofonia foi chamado Dia da Raça até 1974. Há apenas
um mês, uma professora escrevia num jornal cabo-verdiano que o português está
ameaçado polo uso do crioulo no ensino e que o país só se pode desenvolver
falando um idioma global. E o som deste cantar há soar conhecido para os
ouvidos de qualquer falante duma língua menorizada.
Além
disso, existe uma relação direta entre o grande capital e a promoção das
línguas, como revela o cada vez maior número de artigos que analisam o seu
valor económico. Não é casualidade que o Santander Totta e o Banco Comercial
Português se encontrem entre os mecenas do Instituto Camões. A língua continua
a acompanhar o império, antes composto de missões e conquistadores e agora de
fábricas deslocalizadas e transnacionais financeiras. A entrada de Catar,
Geórgia ou Japão como observadores associados da CPLP, ou a declaração do
português como língua oficial da Guiné Equatorial só podem entender-se como
movimentos estratégicos no tabuleiro do poder mundial.
A
própria aceitação de instituições galegas como observadores consultivos, ainda
que positiva para a língua, não é alheia aos interesses económicos que poda
representar a Galiza para Portugal.
Talvez
não se poda escapar completamente a estas dinâmicas num contexto em que as
línguas se vendem e se compram como qualquer outro produto do mercado. Mas
ainda é possível sonhar com um mundo ondevo português da Galiza poda servir
para nos achegar às falantes de umbundo, de forro ou do asturo-leonês de
Miranda, e não para situar-nos por acima delas. Com uma maneira de sermos
lusófonas contra a lusofonia. Iván Cuevas – Astúrias in “Portal
Galego da Língua”
Leia
aqui este artigo republicado no
Portal Galego da Língua para aceder aos comentários entretanto publicados.
Iván Cuevas - Nasceu
em Xixón (Astúrias) em 1982. Fai as vezes de poeta e filólogo em asturo-leonês,
de jornalista e programador em galego-português, e de tradutor em ambas as duas
línguas. É membro do Cineclube de Compostela e de El Teixu, Rede pal Estudiu y
Defensa de la Llingua Asturllionesa.
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