A investigadora Inês Branco analisou a evolução da comunidade portuguesa, desde 2013 até 2022, e concluiu não haver uma diminuição nem uma desintegração, após a pandemia
A
saída dos residentes portugueses do território, durante a pandemia de COVID-19,
causou a sensação de que a comunidade estava a diminuir, mas os números
mantêm-se estáveis, diz a investigadora portuguesa, Inês Branco. É a principal
conclusão do artigo “Conflito intergrupal e desintegração: a comunidade
migrante portuguesa em Macau após a pandemia de COVID-19”, apresentado durante
as Conferências da Primavera 2024, organizadas pelo Centro Científico e
Cultural de Macau, em Lisboa, entre os dias 7 e 20 de Março.
Publicado
na revista Biblos, da Universidade de Coimbra, este trabalho surge na sequência
da tese de doutoramento da investigadora, de 2015, em que analisou os usos dos
média por imigrantes, durante o processo de integração, focando na comunidade
imigrante portuguesa em Macau e na comunidade imigrante nepalesa em Portugal.
“Dez anos depois, ‘voltei’ a Macau para perceber o que tinha acontecido com a
comunidade migrante portuguesa após a pandemia de COVID-2019”, contextualiza,
depois de uma extensa cobertura nos média do território sobre “aquilo que era
percebido como uma significativa partida dos portugueses”.
No
fim, de acordo com a análise de dados estatísticos, revisão de literatura e
entrevistas em profundidade de oito elementos da comunidade portuguesa, as
principais conclusões foram: “Os resultados revelaram que as medidas rigorosas
implementadas pelo Governo de Macau para alcançar zero casos de COVID-19,
aliadas às repercussões do ‘umbrella movement’ em Hong Kong, causaram um
conflito intergrupal e a saída de imigrantes portugueses, no entanto, não há
evidências que sugiram que a comunidade esteja a diminuir ou em desintegração.”
O que dizem as entrevistas
Para
este trabalho, a investigadora entrevistou oito pessoas, entre 2021 e 2022, dos
30 aos 50 anos, incluindo quem tenha permanecido no território e quem tenha
abandonado, colocando-lhes três perguntas. “Será que a comunidade portuguesa
está a experienciar um declínio da população?”, quis saber Inês Branco. As
respostas dos inquiridos revelaram terem partido por medo de perda de liberdade
de expressão. Ainda assim, os números não confirmam um declínio. “Não há
evidência estatística de que a comunidade esteja a diminuir”, segundo os
números do Observatório da Emigração e os dados da Direcção dos Serviços de
Estatística e Censos de Macau. “A população tem-se mantido estável e 0,3 por
cento corresponde ao peso da comunidade portuguesa [na população do território]”,
refere, esclarecendo que considerou, para este efeito, apenas “residentes de
Macau, nascidos em Portugal e que tenham de facto emigrado”.
“Estará
a comunidade a tornar-se menos integrada na região ou a mostrar sinais de
desintegração?”, perguntou Inês Branco. De acordo com a investigadora,
mantém-se integrada, ainda que com diferenças em relação ao que acontecia há
uma década. “Alguns dos entrevistados diziam sentir-se, há dez anos, pessoas de
Macau e, neste momento, alguns dizem sentir-se imigrantes portugueses”,
exemplifica. “Ainda assim, há provas de que a comunidade continua a ter um
papel importante na preservação da identidade de Macau”, diz, referindo: “O
Governo Central chinês continua a atribuir um papel significativo, que está
diretamente ligado ao papel da comunidade portuguesa enquanto guardiões dessa
identidade. Têm sido feitos esforços, por parte do Governo de Macau, para continuar
a valorizar a língua portuguesa, como suporte do papel do território, enquanto
plataforma sino-lusófona.”
Por
último, a terceira questão incidiu sobre o papel da língua portuguesa no
território, mas a investigadora também não considera que esteja em declínio. “O
português é falado por muito pouca gente no território, a sua importância não é
determinada pelo número de falantes em Macau, mas sobretudo pela posição do
território enquanto centro de ensino e pesquisa de uma daquelas línguas
oficiais, neste caso, a língua portuguesa”, esclarece.
Porque permaneceram no território?
Além
de “questões relacionadas com liberdade, percebidas como estando em erosão em
Macau”, aqueles que decidiram permanecer no território, apresentam também
outras razões. Por um lado, invocam motivações de carácter pessoal,
identificando-se como cidadãos de Macau, para além de motivos profissionais,
relacionados com a vitalidade da economia do território.
Com
os dados estatísticos deste artigo a referirem-se a 2022, é caso para perguntar
se poderá haver mudanças quando saírem dados mais recentes. “Da minha
percepção, é que também há gente a chegar a Macau, o que acontece é que as
dificuldades na atribuição de vistos [e de BIR] pode ser um problema para quem
queira lá ficar”, diz.
Ainda
assim, realça a investigadora, “não há quaisquer provas de desintegração” e, na
verdade, ao longo das centenas de anos que lá se encontra, “a comunidade tem
consistentemente demonstrado uma capacidade de adaptação à adversidade”. Luciana
Leitão in “Ponto Final”
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