O Congresso da Reconciliação Nacional, organizado pela Conferência Episcopal de Angola e São Tomé (CEAST), arranca esta quinta-feira, 06, em Luanda, sob o desígnio de sarar as feridas que restam do longo período de guerra que o país atravessou, mas a ausência do Chefe de Estado fragiliza a iniciativa dos bispos católicos
Foi
com algum estrondo que a 22 de Outubro João Lourenço, alegando "razões de
Estado", anunciou que não iria estar presente nesta oportunidade criada
pelos bispos católicos para juntar os angolanos ainda separados pelo passado
violento no país marcado pela guerra civil que terminou em 2002.
Não
é por acaso que alguns partidos da oposição, com destaque para a UNITA, não
retiraram ainda do seu discurso a ideia de que a paz militar chegou a 04 de
Abril de 2002, mas a paz social ainda está longe de ser uma realidade em
Angola.
Com
este Congresso da Reconciliação Nacional, a igreja católica, procura não apenas
ajudar a limar as arestas ainda salientes do conflito de décadas, mas
igualmente recuperar o protagonismo que durante a guerra era seu na procura de
soluções negociadas entre os braços militares do MPLA e da UNITA.
Como,
de resto, ficou registado na História do país com a realização do Congresso
pela Paz em Angola dois anos antes do conflito terminar com a morte em combate
do líder do "Galo Negro", Jonas Savimbi, a 22 de Fevereiro de 2002,
abrindo caminho para a assinatura dos acordos de paz de 04 de Abril desse mesmo
ano.
Apesar
da diluição da sua importância com a ausência do Presidente João Lourenço, que
alegou razões de Estado para o efeito - depois percebeu-se que nesse dia
haveria nova sessão de entrega de medalhas no âmbito do 50.º aniversário da
Dipanda - para a igreja católica, como afirmou o presidente da CEAST e bispo de
Saurimo, José Manuel Imbamba, este Congresso da Reconciliação é uma porta de
entrada e saída para a edificação de "uma nova era, de novo começo".
Foi
em entrevista ao Novo Jornal que o prelado acrescentou que esta
iniciativa é igualmente uma achega para o esforço colectivo de um "novo
sentido da justiça para o País".
E
sobre a decisão de Estado com que João Lourenço anunciou que não iria
participar neste Congresso, Manuel Imbamba procurou a harmonia possível
sublinhando que o Chefe de Estado estará "muito bem representado".
Nessa
mesma conversa com o Novo Jornal, o presidente da CEAST afirmou que a
Reconciliação é uma questão presente, dinâmica, que deve estimular a quebra da
"tendência de viver do nosso passado triste, do nosso passado violento, de
ódio e de intolerância".
Mesmo
ao fim de mais de 23 anos de paz militar, o prelado defende que "é preciso
que a reconciliação não seja só um slogan político" porque o país
"precisa de exorcizar as consciências" reconciliando-se com a
"memória histórica de toda a Nação".
E
sublinhava a relevância da diluição do alicerce cultural que levou aos
"caprichos, aos desvios, à falta de ética, à falta do sentido de honra ao
despudor e a tudo aquilo que, de facto, está a ofuscar e a manchar a verdadeira
imagem do País".
E lembrou,
em jeito de justificação para este Congresso da Reconciliação Nacional, que
"o processo de reconciliação é inacabado" acrescentando: "A
reconciliação não tem ponto final, é algo que deve estimular sempre e a
protagonizar todos aqueles aspectos que vão fazer que vençamos, de uma vez por
todas, os preconceitos e aquelas tendências que fazem que não valorizemos a
presença do outro, a opinião do outro (...)"
"(...)
Por isso, nós, como Igreja, temos procurado estimular esta consciência para que
verdadeiramente todos nos envolvamos neste nosso processo de transformação, de
inovação, de renovação e de conversão autêntica e ali entra, exactamente, o
papel e o jogo político que para nós é um sector muito importante que deve
fazer que os nossos discursos sejam mais limpos, motivadores, alegres, que nos
façam sonhar, que façam, de facto, suscitar todo aquele espírito de comunhão e
de fraternidade, de paz e de solidariedade que o nosso País, de facto,
precisa", apontou ainda o líder dos bispos angolanos.
E,
noutro momento, desta feita citado pela Lusa, Manuel Imbamba sublinhou que
"para a igreja, este é o momento de os angolanos terem outra visão, outras
ideias, outra maneira de abordar a política, outra maneira de ver, de encarar a
sociedade e o cidadão".
Alias,
a própria CEAST, na documentação introdutória do Congresso, refere que "a
paz e a reconciliação continuam a ser um projecto em construção por
consolidar" no país e que, por isso, "a Nação inteira, homens e
mulheres de boa vontade" estão convidados a fazerem juntos uma espécie de
"exame de consciência" colectiva.
O
Congresso da Reconciliação Nacional decorre em Talatona, Hotel Victória Garden,
esta quinta-feira, 06, e amanhã, 07, dois dias para encontrar e encontrar
soluções para "as falhas, as irresponsabilidades, as omissões, com um
propósito de emenda", explica ainda o presidente da CEAST em declarações à
imprensa.
O
lema do Congresso é "Eis que faço novas todas as coisas", e ao longo
destas 48 horas dezenas de convidados subirão ao púlpito para ajudar a
reflectir sobre o que é preciso fazer para, como nota a CEAST, "curar as
feridas da Nação" angolana, desde líderes religiosos, políticos e da
sociedade civil com um objectivo claro: "o país tem tudo para viver na
dignidade, tem tudo para prosperar, tem tudo para oferecer aos seus
filhos" e chegou o momento de começar a garantir esse futuro prometido há
50 anos e ainda por cumprir. In “Novo Jornal” - Angola
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