Quinta-feira,
27 de janeiro de 2022. O sol castiga a cidade com tamanho calor. Recebo um
recado pelo Whatsapp do padre Arménio Rodrigues, do programa “Caravela
do Fado” (Rádio 9 de Julho). Ele me informa sobre o falecimento da fadista
Terezinha Alves.
Rapidamente
entrei nas redes sociais para saber mais detalhes. Soube, então, que ela havia
nos deixado um dia antes. Fiquei muito triste!
Tenho
profundo carinho, admiração e gratidão à Teresinha, pois quando comecei a
pesquisar sobre as memórias do fado e seus artistas no Brasil, ela foi a pessoa
que mais me auxiliou com informações e materiais de pesquisa. Tive a
oportunidade de consultar seu rico acervo de fotografias e discos.
Foi
ela quem me apresentou a outros artistas. Quando tinha qualquer dúvida sobre o
tema, ligava para a Terezinha e prontamente me atendia. Que memória fabulosa!
Estive
várias vezes em seu apartamento nas Perdizes. Sempre fui recebida com muito
carinho pela fadista e seu marido, José Luiz Marcondes. Terezinha estava sempre
arrumada, cabelo arranjado, era vaidosa. Ficávamos horas conversando e ouvindo
fados. Ela cantarolava e fazia comentários sobre as gravações. Contava histórias
engraçadíssimas acontecidas em shows e no restaurante Adega Lisboa Antiga, do
qual foi coproprietária e atração artística. No final, servia um delicioso
cafezinho com bolo.
Os
fadistas Adélia Pedrosa e Sebastião Manuel estavam sempre em suas conversas.
Foram amigos do peito!
Eu
estudava em uma universidade na Barra Funda, próxima ao apartamento da
Terezinha na Av. Francisco Matarazzo. Uma vez telefonei para avisar que
deixaria uns cds na portaria do seu prédio. Ela me disse que não, eu precisava
subir nem que fosse cinco minutinhos, ela precisava me mostrar algo que tinha
encontrado: um caderno de autógrafos.
Foi presente de um amigo. Terezinha, em uma das viagens que fez a Portugal,
conseguiu as dedicatórias de dois dos seus artistas portugueses preferidos,
Amália Rodrigues e Raul Solnado. Ela tinha muito orgulho daquele caderninho e
confessou que nunca mais pegou outros autógrafos. Guardava-o como um tesouro!
Quando
iniciou sua carreira artística, no final da década de 1950, com a ajuda dos
fadistas e radialistas, Manoel Monteiro e Irene Coelho, conheceu muitos
artistas portugueses da velha guarda, e teve contato com a nova geração. Essa
fase intermediária fez com que Terezinha se tornasse um elo entre o passado e o
futuro.
Lembro-me
que no seu acervo fotográfico guardava centenas de fotografias de carreira, de
colegas (todas autografadas), do restaurante Adega Lisboa Antiga, das suas
atuações e visitas às Casas de Fado em Lisboa – ao lado de grandes
personalidades… Precisei de muito tempo para assimilar tamanho volume de
informações.
Uma
curiosidade é que ela também apreciava a música popular brasileira, sendo fã de
Elizeth Cardoso e Nelson Gonçalves. Terezinha gravou um compacto com dois
sambas nos anos 1960. Um deles é “Portuguesa no Samba”, escrito especialmente
para a fadista. A gravação é ótima.
Por
volta de 2011, percebi que Terezinha tinha alguns lapsos de memória quando
conversávamos, ela comentou comigo que achava estar com mal de Alzheimer.
Respondi que não, deveria ser algo pontual. Infelizmente, ela tinha razão. Em
seguida, recebeu o diagnóstico médico.
Foi
bem no período em que tive a chance de lançar meu primeiro livro, a biografia
da Irene Coelho, madrinha artística de Terezinha Alves.
A
artista estando impossibilitada de se apresentar, retirou-se.
Pude
homenageá-la através da literatura em três obras de minha autoria: “O Fado no
Brasil” (2013), “O Fado nas noites paulistanas” e “O Fado que cantei e outras
canções”, ambos de 2015.
Depois,
voltei a revê-la em outras duas ou três ocasiões. Uma delas ocorreu em meados
de 2014, no Clube Português, quando Adélia Pedrosa, Humberto Fernandes e Bomfim
apresentaram-se no projeto “Domingo no Clube”. Terezinha foi prestigiar a
amiga-irmã, acompanhada pelo seu dedicado esposo.
Terezinha
partiu no dia 26 de janeiro, aos 83 anos. O sepultamento ocorreu no Cemitério
do Tremembé, em São Paulo.
Deixará
saudades para os familiares, amigos e fãs.
Seu nome está marcado em nossos corações e memórias, na história do Fado e nos registros discográficos que nos legou. Thais Matarazzo – Brasil in “Mundo Lusíada”
Thais Matarazzo - Escritora e autora de “O Fado nas Noites Paulistanas…” (2015), Editora Matarazzo
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