A
rápida ascensão política de Pablo Marçal na campanha eleitoral para a
prefeitura de São Paulo não é novidade. Ainda sem as facilidades criadas pelas
redes sociais digitais, houve um clima parecido de sensação eleitoral, em 1953,
quando um deputado estadual, ex-vereador, decidiu enfrentar as forças políticas
da época com uma campanha populista, na qual o símbolo era uma vassoura, para
varrer a corrupção.
Outra
coincidência, Jânio Quadros, o fenômeno eleitoral eleito prefeito com o voto
dos bairros populares, não era paulistano mas matogrossense, quase da mesma
região de Pablo Marçal, que é goiano.
Agora
uma diferença, Jânio tinha sido vereador trabalhador e um tanto minucioso; como
deputado combatia a corrupção e fazia a fiscalização dos gastos públicos. Em
síntese, um populista de direita, com discurso conservador, preocupado com a
pauta de costumes: era contra os jogos de azar, contra a prostituição e chegou
a proibir o uso do biquini.
Apesar
de Jânio ter frustrado seus seguidores com sua renúncia e de ser considerado um
dos principais responsáveis pela instabilidade política brasileira que levou ao
Golpe militar, Jânio manteve o rigor na defesa dos bens públicos e no combate à
corrupção.
O
retorno do populismo ao poder depois dos governos petistas de Lula e Dilma, foi
com outra roupa, sem as caspas de Jânio, e o combate às corrupção ficou só nas
palavras. Deixou de ser populismo de direita para se afirmar como populismo de
extrema-direita, sem independência internacional, atrelado aos EUA e à política
trumpista republicana, visando o desmantelamento do Estado e o enfraquecimento
das regras republicanas, tudo consubstanciado na figura do ex-presidente Jair
Bolsonaro.
Esse
novo populismo mais extremo veio acompanhado de um novo elemento também
importado dos EUA, destinado a assegurar mais coesão e fidelidade entre os
seguidores pertencentes às camadas mais pobres e menos instruídas: a presença
religiosa invisível mas penetrante do evangelismo e suas variantes
neopentecostais, capazes de obter contrôle e submissão sem um aparelho
repressor visível.
É
nesse quadro que surge Pablo Marçal, justamente quando havia a impressão ou
esperança da sociedade civil estar se desembaraçando do populismo bolsonarista.
Bolsonaro parece agora como um aprendiz de feiticeiro diante do esperto Marçal,
conhecedor do funcionamento das redes sociais, capaz de se transformar em
algumas semanas num dos prováveis eleitos para a prefeitura de São Paulo.
Ao
mesmo tempo, o surgimento das redes sociais criou uma nova maneira de se fazer
política com o investimento dos candidatos e dos partidos na publicidade
digital. A intensa publicidade de Pablo nas redes levou-o à imprensa escrita e
televisão, onde o candidato ganhou terreno e em pouco tempo, com promessas
mirabolantes mas difíceis de realizar, alcançou os primeiros colocados Boulos e
Nunes à Prefeitura de São Paulo. A vitória de um dos três primeiro-colocados
dependerá, no segundo turno, da transferência de votos dos candidatos
derrotados.
Até
que ponto a Justiça Eleitoral pode intervir impedindo, até novembro, a
participação de Pablo nas eleições municipais da maior cidade brasileira? Nos
EUA, sem justiça eleitoral, o candidato Donald Trump prossegue candidato apesar
de ser alvo de diversos processos. Terão algum resultado as acusações claras e
precisas da candidata Tábata Amaral?
Provavelmente
não. Em todo o caso, Pablo não cumpriu os 4 anos e cinco meses de prisão por
furto qualificado, porque a Justiça Federal reconheceu já ter prescrito o
crime. Isso lembra Paulo Roberto de Andrade, que deu o golpe do Boi Gordo,
enganou mais de 30 mil investidores, mas saiu livre dos processos por
prescrição do crime. Ou seja, a prescrição acaba valendo como declaração de não
culpabilidade.
Se
tiver assegurada sua impunidade, a presença de Pablo Marçal na campanha para a
Prefeitura de São Paulo muda o quadro político por enfraquecer a imagem do
governador paulista Tarcísio de Freitas e esvaziar a candidatura de Ricardo
Nunes. Na hipótese de Pablo ir para o segundo turno com Boulos, é quase certo
ter o voto dos bolsonaristas e ser eleito.
Se isso ocorrer, a vitória de Pablo poderá significar o fim definitivo para Bolsonaro e família, pois ficará difícil continuar a receber a totalidade dos votos dos evangélicos. Diante disso, Pablo já começa a negociar a possibilidade de receber um apoio do clã Bolsonaro, ofendendo e rejeitando o apoio de Joyce Hasselmann, chamando-a de traíra ou traiçoeira, enquanto acena aos evangélicos, declarando seu apoio à pauta de costumes por eles defendida. Rui Martins – Suíça
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Rui Martins é
jornalista, escritor, ex-CBN e ex-Estadão, exilado durante a ditadura. Criador
do primeiro movimento internacional dos emigrantes, Brasileirinhos Apátridas,
que levou à recuperação da nacionalidade brasileira nata dos filhos dos
emigrantes com a Emenda Constitucional 54/07. Escreveu Dinheiro sujo da
corrupção, sobre as contas suíças de Maluf, e o primeiro livro sobre Roberto
Carlos, A rebelião romântica da Jovem Guarda, em 1966. Foi colaborador do
Pasquim. Estudou no IRFED, l’Institut International de Recherche et de
Formation Éducation et Développement, fez mestrado no Institut Français de
Presse, em Paris, e Direito na USP. Vive na Suíça, correspondente do Expresso
de Lisboa, Correio do Brasil e RFI.
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