Quem
não tem acompanhado o governo de Nicolás Maduro na Venezuela ou quem ignora ou
confunde países e tendências políticas na América Latina pode ter dificuldade
para fazer um juízo de valor: houve fraude nas eleições ou há uma tentativa de
golpe pela extrema-direita?
Num
momento desses, pode-se testar a validade e utilidade das redes sociais, porém,
há o risco da pessoa ser enganada, ser convencida por uma inverdade, ou ficar
totalmente desorientada, diante de "influenciadores" de orientações
políticas opostas. Sem se falar nos canais especializados em criar falsas
informações ou deturpar notícias verdadeiras, as conhecidas fake-news.
É
possível se fazer um teste e conseguir obter um resultado correto e próximo da
verdade? Não custa tentar, pois entender as eleições venezuelanas é uma
oportunidade rara que nos oferecem as redes sociais. Vamos dar uma volta entre
algumas delas, na busca de uma orientação segura para chegar a uma conclusão
segura.
Mas
é sempre bom lembrar haver maus perdedores. Donald Trump ao perder na tentativa
de reeleição para Joe Biden espalhou a história de ter sido roubado e de ter
havido fraude nas urnas e nas apurações. Acusação talvez possível de ser levada
a sério, pois os EUA usam ainda o sistema de voto impresso e o envio do voto
por correspondência.
Essa
explicação de fraude nas urnas e nas apurações foi também utilizada pelo
ex-presidente Bolsonaro ao perder a reeleição. Com uma ligeira diferença,
Bolsonaro falava em fraudes nas urnas eletrônicas antes mesmo das eleições,
gerando uma certa desconfiança quanto às suas intenções e deixando a suspeita
de pretender recorrer ao argumento das fraudes, no caso de perder a reeleição.
Tanto Trump como Bolsonaro são políticos da extrema-direita.
Mas
vamos saber o que circula nas redes sociais e imprensa, em busca de uma boa
orientação.
Começamos
com o canal Opera Mundi, de Caracas, onde está o jornalista Breno Altman, que
se refere ao comunicado do Conselho Nacional Eleitoral da Venezuela anunciando
a vitória de Maduro. Ele explica ser digital o voto com identificação
biométrica do votante mas com uma comprovação impressa - ou seja, depois de
votar, o eleitor recebe um recibo confirmando ter votado, e esse recibo é
colocado numa urna. Na chamada auditagem das urnas, existe a ata das urnas e a
contagem dos recibos de votações, que devem ser iguais.
Breno
conta ter havido tentativas de hackers, da Macedônia, tentando
interferir na votação. As atas auditadas têm o prazo de 72 horas para serem
autenticadas ou três dias. Em síntese tudo está em ordem, segundo Breno, é a
direita e a extrema-direita que colocam em dúvida a validade do resultado das
eleições.
No
seu relato, Breno Altman citou o Centro Carter como o responsável pela criação
do sistema eleitoral venezuelano, um dos mais confiáveis do mundo. Ora, o canal
MyNews, de esquerda, conseguiu uma declaração oficial do Centro Carter criticando os
resultados das eleições. De acordo com Sylvia Colombo, correspondente do
MYNews, o Centro Carter funciona como uma ONG sem vínculos políticos. Ela
também fala de restrições às atividades de jornalistas na Venezuela, razão pela
qual preferiu não ir à Venezuela nas eleições.
Trechos
da declaração oficial do Centro Carter circulam pela Internet e fazem sérias
críticas às eleições, do tipo “O processo eleitoral da Venezuela não atendeu
aos padrões internacionais de integridade eleitoral em nenhuma de suas etapas”.
O
canal Meteoro, de esquerda, adota uma posição de cautela, reproduzindo
entrevista da TV LCI, no qual se fala da campanha da oposição para
descredibilizar Nicolás Maduro. Mas critica a ex-candidata Maria Corina, ultra
liberal, que está chamando o exército para intervir no país.
O
canal petista Brasil 247 sentiu a divisão criada dentro da esquerda por ter
apoiado a reeleição do presidente Maduro, decisão reforçada com a declaração da
dirigente petista Gleisi Hoffmann, com a posição do PT favorável ao presidente
Maduro. Para o Brasil 247, a Venezuela é um posto avançado da luta contra o
imperialismo americano. O canal critica a demora do Brasil em reconhecer a
vitória de Maduro, mas a declaração neutra do presidente Lula vem sendo
criticada por muita gente de esquerda como o jornalista Ricardo Kotscho, tanto
no UOL como numa entrevista para o MyNews.
De
uma maneira geral, a imprensa critica Maduro. O jornal Le Monde publica no seu
sítio um vídeo no qual responde à pergunta - por que é contestada a vitória de
Maduro? O canal UOL foi unânime nas críticas ao presidente Maduro.
Essas
opiniões diferenciadas sobre as eleições na Venezuela ajudaram a formar uma
opinião? Maduro é também criticado por permanecer muito tempo no poder. Com
esse terceiro mandato ficará 17 anos na presidência. Rui Martins – Suíça
____________________
Rui Martins é
jornalista, escritor, ex-CBN e ex-Estadão, exilado durante a ditadura. Criador
do primeiro movimento internacional dos emigrantes, Brasileirinhos Apátridas,
que levou à recuperação da nacionalidade brasileira nata dos filhos dos
emigrantes com a Emenda Constitucional 54/07. Escreveu Dinheiro sujo da
corrupção, sobre as contas suíças de Maluf, e o primeiro livro sobre Roberto
Carlos, A rebelião romântica da Jovem Guarda, em 1966. Foi colaborador do
Pasquim. Estudou no IRFED, l’Institut International de Recherche et de
Formation Éducation et Développement, fez mestrado no Institut Français de
Presse, em Paris, e Direito na USP. Vive na Suíça, correspondente do Expresso
de Lisboa, Correio do Brasil e RFI
Sem comentários:
Enviar um comentário