Pintura Arq. Eduardo Moreira Santos, Lx (28.08.1904 - 23.04.1992)

quinta-feira, 29 de agosto de 2024

Portugal - Eólicas para autoconsumo começam “a girar” em setembro

A WindCredible, uma startup portuguesa, vai iniciar em setembro uma fase piloto das suas eólicas para autoconsumo junto de grandes empresas, como a Nestlé e a Galp


A Windcredible vai pôr a girar, num edifício da Nestlé em Portugal, uma eólica diferente: é mais pequena e destina-se especificamente ao autoconsumo. Até ao final do ano, outras dez estarão a girar em várias empresas, a testar diferentes desenhos, para perceber qual é o melhor modelo para escalar. O objetivo é produzir 50 turbinas em 2025.

Foi nas oficinas da Guarda Nacional Republicana, na Pontinha, que começaram a ser desenvolvidas as eólicas para autoconsumo que agora vão ser testadas na Nestlé, mas também, em breve, em empresas como a EDP, Galp e Prio.

O fundador da WindCredible, Filipe Reina Fernandes, capitão na unidade de intervenção da GNR, tinha como função reduzir os custos da eletricidade da sua unidade. Em parceria com António Santos, cabo especializado em eletrónica e transmissões, começou a experimentar ao fim de semana a construção de turbinas “muito arcaicas”, descreve, com material reaproveitado.

Entre experiências, foram apresentados àquele que veio a tornar-se seu sócio, Nelson Batista, especialista em aerodinâmica. “Juntou-se a nós e aportou muito conhecimento”, afirma Reina Fernandes que, apesar de não ter formação em engenharia, se considera um “engenheiro por solidariedade”. Sempre conviveu com esta realidade através do pai, que ensinava metalomecânica numa escola secundária do norte do país. Marvim Fernandes, o pai de Filipe Reina, acabou por também se juntar ao projeto. Depois de várias experiências, que decorriam desde o verão de 2022, em 2023 a empresa abriu atividade.

“A nossa proposta de valor é um produto com muita tecnologia, que seja robusto, com pouca manutenção, com uma componente de software que permita boa gestão do equipamento, permitindo perceber realmente o que está a ser produzido”, explica o fundador, em declarações ao ECO/Capital Verde.

Apesar de estar a trabalhar três segmentos de negócio em simultâneo, a “aposta principal” da WindCredible é mesmo o modelo “urban” [urbano], vocacionado para o autoconsumo. São eólicas de 1 a 3 quilowatts de capacidade, com cerca de 2 metros e meio de altura e 125 quilos. Assim, apesar de o objetivo ser instalar estas eólicas em ambiente urbano ou empresarial, “não é qualquer telhado que aguenta”, explica o fundador. Têm de ser feitos estudos de engenharia para o assegurar. Se os telhados não forem robustos o suficiente, podem ser “plantadas” no solo, com uma pequena fundação e um poste a suportarem as pás.

As pás são muito diferentes do habitual “moinho” que se avista no alto dos parques eólicos tradicionais. Formam uma espécie de espiral, fabricada em fibra de vidro em Vila Franca de Xira, na Xiraplás. Contêm ainda componentes metálicos, oriundos da Póvoa do Varzim, enquanto a parte elétrica é importada da China. “Queremos ter um fornecedor mais próximo ou vir a desenvolvê-las”, partilha o gestor.

O caminho, acredita a WindCredible, é usar estas eólicas em complementaridade com o autoconsumo solar. A empresa calcula que seja possível uma poupança de 350 euros anuais unicamente com a instalação destas turbinas, sem contar com o eventual complemento da solução solar. Neste momento, o retorno para o investimento por parte do cliente está estimado entre os cinco e os 11 anos, mas o objetivo é baixar o intervalo para entre os três e os sete anos. As cidades do litoral são aquelas onde se esperam melhores resultados.

Para já, a empresa está a avançar com três versões diferentes do modelo urbano, que deverão ser trabalhadas ao longo dos próximos meses, enquanto decorrem os respetivos testes piloto. Os empreendedores querem identificar a melhor morfologia, os melhores componentes e ainda otimizar a cadeia de produção. A Nestlé é a primeira empresa a receber um protótipo, e em setembro a instalação deverá estar concluída. A turbina vai erguer-se na cobertura do restaurante. Foi feito um estudo para aferir a resistência do local e criada uma base de apoio onde serão instalados o poste e a turbina.

As restantes nove eólicas que serão testadas deverão ser distribuídas até ao final do ano por clientes tão diferentes como a Galp, EDP, Prio, Allprocare e Porto de Lisboa. A duração prevista para os testes é de um ano, para perceber o desempenho ao longo das diferentes estações. “Algumas destas empresas têm projetos de inovação colaborativa, procuram trabalhar com startups. O objetivo é apresentar a inovação e procurar um caminho conjunto”, explica Filipe Reina, garantindo que “em Portugal não há outra empresa a produzir turbinas desta escala”.

Já no panorama europeu avistam-se potenciais concorrentes. “Existem outras empresas que estão a desenvolver este tipo de tecnologia. Não há nenhuma com repercussão mundial, mas é uma questão de tempo. Se nós não conseguirmos entregar, alguém o irá fazer. Tem de se desenvolver isto com alguma celeridade e colocá-la no mercado o quanto antes”, assevera.

A comercialização está planeada para 2025, à escala de 50 turbinas. Nessa fase, a WindCredible espera contar com distribuidores de soluções de autoconsumo que integrem estas turbinas nas respetivas soluções, permitindo que parte das 50 novas turbinas cheguem às casas dos portugueses. Mas está tudo dependente dos resultados dos pilotos.

Para completar a próxima etapa, o fundador espera angariar um financiamento de 2 milhões de euros, junto de entidades focadas em capital de risco, uma quantia que se junta aos 300.000 euros que sustentaram, até agora, o projeto. Até agora, a lista de investidores é composta pelo investidor-anjo Simão Calado, a Portugal Ventures e a Techstars. O modelo urbano de eólica deverá absorver um terço do novo financiamento, cabendo outro terço a um modelo mais potente, o farm, enquanto o restante destina-se aos recursos humanos. A equipa para já conta com cinco pessoas, mas quer acrescentar perfis técnicos especializados em áreas com o a eletrónica de potência, estruturas, mecânica e aeroespacial.

Das caravanas aos parques eólicos offshore

A empresa quer avançar em três frentes: o já falado segmento urbano, mas também o “nano” e o “farm”. O modelo urbano é de dimensão intermédia, enquanto o nano fica abaixo desta fasquia, servindo consumos tão pequenos como os de uma caravana ou pequenas casas modulares – tem uma potência de 500 watts. Há um cliente, precisamente fabricante de casas modulares, já interessado em receber esta tecnologia. Mas este segmento “não é o foco de momento”. Já foram produzidas três turbinas e também vão iniciar-se os testes, “mas em segundo plano”, comparativamente ao desenvolvimento do modelo urbano. “Quanto mais pequeno o equipamento mais difícil o breakeven, a escala é fundamental”, explica Filipe Reina.

Sobre o modelo “farm”, que tem maior capacidade e adequa-se mais à implementação em parques eólicos, numa lógica de complementaridade com as eólicas tradicionais, afastados das cidades. E são turbinas que podem chegar a “plantar-se” nos parques eólicos offshore. Mas este tipo de aplicação vai exigir mais estudos, esclarece o fundador. A ideia é alimentar unidades de aquacultura, culturas de algas marinhas ou carregamento de embarcações elétricas, anexos à produção de energia eólica offshore.

As eólicas farm deverão ter cerca de 50 metros de altura, bastante menos – cerca de um terço – da altura das eólicas de maior capacidade existentes no mercado. “São uns monstros comparados com as nossas”, afirma o fundador da Windcredible. Uma vez que as turbinas da startup conseguem produzir energia com vento que sopre a velocidades inferiores, podem ser um bom complemento às tradicionais. E têm outras vantagens: a produção de menos ruído e menos necessidade de manutenção, já que dispensam algumas das componentes das turbinas tradicionais. Deverão por isso ter menos impacto em termos ambientais, em particular na fauna.

Neste segmento, adianta Filipe Reina, os maiores concorrentes são empresas dos países nórdicos, que já estão a trabalhar com o mesmo tipo de tecnologia. Este segmento é, contudo, o que está menos avançado, ainda em fase de desenvolvimento. Ana Oliveira – Portugal in Eco



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