O Presidente timorense, José Ramos-Horta defendeu ontem que as empresas portuguesas podem usar Timor-Leste como ‘armazém’ para reexportarem para o sudeste asiático em áreas como as conservas, o calçado ou têxteis
Em
entrevista à agência Lusa em Díli a propósito dos 25 anos do referendo que
levou à independência de Timor-Leste, que se assinalam em 30 de agosto, o chefe
de Estado timorense defendeu que o sudeste asiático é o melhor mercado para as
empresas portuguesas que têm interesse em expandir-se.
“O
mercado é este, do sudeste asiático, com quase 700 milhões de pessoas, dos
quais cerca de 200 milhões são já de classe média, com [rendimento] ‘per
capita’ mais elevado, com gostos mais refinados”, disse. “Se eu fosse um
empresário timorense ou português, fazia de Timor-Leste um armazém de conservas
portuguesas porque o asiático gosta muito de conservas” e “a conserva
portuguesa é a melhor do mundo”.
Para
José Ramos-Horta, há ainda outras áreas em que os empresários portugueses podem
fazer a diferença, como o calçado ou confeção têxtil. “Há quase 30 anos conheci
um senhor guineense, casado com uma timorense, ele vendia sapatos portugueses
em casa. Hoje já tem lojas em toda a Austrália a vender calçado português”,
exemplificou.
O
Presidente defendeu que Timor-Leste “pode ser um armazém como Singapura” que
“reexporta tudo o que vem da Europa, do resto do mundo para a Ásia e
vice-versa”. Ramos-Horta deu ainda outro exemplo de sucesso dos produtos
portugueses na região referindo que os vizinhos de Timor ocidental, a parte
indonésia da ilha, atravessam muitas vezes a fronteira “para virem comprar
vinho português a Timor-Leste”.
O
país asiático lusófono podia ainda ser “um ‘hub’ para indústria
farmacêutica portuguesa”, defendeu. No entanto, para promover este tipo de
investimento, o chefe de Estado considerou que os governos timorense e
português devem fazer “acordos mais concretos, comerciais, mas com fortes
apoios dos bancos portugueses, do banco central português e timorense”.
É
preciso que a nível político haja “incentivos a esses empresários para se
estabelecerem em Timor”, em vez de andarem “a fazer juras de amor eterno”, como
é comum na Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP).
Segundo
o relatório semestral das perspetivas económicas do Banco Mundial, divulgado
esta semana, a economia de Timor-Leste deverá acelerar para uma média de 3,7%
no período 2024-2026.
Este
ano, manteve a trajetória de crescimento próximo dos 3%, mas a um ritmo mais
lento devido à baixa execução orçamental, que foi de apenas 25% do Orçamento do
Estado e 6% do orçamento de Capital e Desenvolvimento até Maio. “São
necessárias taxas de execução substancialmente mais elevadas para alcançar
níveis mais elevados de crescimento económico”, alertou o Banco Mundial.
Má nutrição resulta da pobreza, cultura e educação
José
Ramos-Horta disse ontem que a má nutrição no país está relacionada com a
pobreza, com a cultura e a educação e que esta é a sua principal bandeira
porque as crianças são o futuro. O problema da má nutrição está relacionado com
a “pobreza, mas também com a questão cultural e educacional”, explicou o chefe
de Estado timorense.
Dados
do Programa Alimentar Mundial (PAM) indicam que cerca de 360.000 pessoas em
Timor-Leste, com 1,3 milhões de habitantes, enfrentam níveis críticos de
insegurança alimentar.
O
Banco Mundial recomendou recentemente a Timor-Leste que aumente o investimento
para reduzir a fome, a subnutrição e o atraso no crescimento infantil para
melhorar o capital humano do país e consequente desenvolvimento económico. “Há
muitas famílias com muitos animais domésticos, gado bovino, centenas de
búfalos, de cabritos, porcos. Uma família mais educada, mais sensível planearia
para dar de comer às crianças, à casa, regularmente com o que tem, mas muitos
não o fazem”, disse José Ramos-Horta.
Por
outro lado, segundo o prémio Nobel da Paz, “matam cinco ou 10 búfalos num
casamento ou num funeral e depois passam meses sem comer um bocado de carne”.
José
Ramos-Horta explicou que também há desconhecimento sobre nutrição e que no
tempo da ocupação indonésia criaram o hábito de comer arroz, que é menos
nutritivo que o milho, e as massas de 0,25 dólares que é só misturar água. O
Presidente lamentou também a falta de água potável para a população e de
condições de higiene. “Tudo isso leva a problemas de infeções nos intestinos e
estômago”, disse.
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