Pintura Arq. Eduardo Moreira Santos, Lx (28.08.1904 - 23.04.1992)

domingo, 3 de outubro de 2021

São Tomé e Príncipe - Poema ’Afroinsularidade’ de Conceição Lima vence concurso de tradução nos EUA entre mais de 600 poemas e 327 poetas

O poema ’Afroinsularidade’ da poeta e jornalista Conceição Lima, de São Tomé e Príncipe, venceu ’ex-aequo’ o ’Concurso de Tradução de Poemas 2021’, organizado pela prestigiada revista literária ’Words Without Borders’, em parceria com a Academia Americana de Poetas. O anúncio oficial teve lugar num evento especial do Brooklyn Book Festival, com recital pelos vencedores

Afroinsularidade venceu ex-aequo com o poema 0 da salvadorenha Lauri García Duenas. Estiveram em concurso 606 poemas em 61 línguas e 327 poetas de 79 países, selecionados pela equipa editorial da revista Words Without Borders.

Os tradutores dos dois poemas premiados são os norte-americanos David Shook e Olívia Lott, respetivamente.

A autora premiada Conceição Lima, da UNEAS-União Nacional dos Escritores e Artistas São-tomenses, foi recentemente nomeada coordenadora nacional, para São Tomé e Príncipe, do Movimento Poético Mundial.

É o nome mais traduzido da literatura são-tomense, com livros e poemas em alemão, árabe, espanhol, checo, francês, galego, italiano, inglês, shona, servo-croata e turco.

A Dolorosa Raiz do Micondó, de 2006, republicado em São Paulo em 2015 pela editora Geração Editorial, venceu, entre mais de 400 títulos, o Programa Nacional de Bibliotecas Escolares do Brasil, PNBE. A sua tiragem, pelo Ministério Brasileiro da Educação, atingiu os 35500 exemplares.

Afroinsularidade

O poema Afroinsularidade, do primeiro livro de Conceição Lima, O Útero da Casa, de 2004:

Deixaram nas ilhas um legado /de híbridas palavras e tétricas plantações/engenhos enferrujados proas sem alento/nomes sonoros aristocráticos/e a lenda de um naufrágio nas Sete Pedras//

Aqui aportaram vindos do Norte/por mandato ou acaso ao serviço do seu rei:/navegadores e piratas/negreiros ladrões contrabandistas/simples homens/ rebeldes proscritos também/e infantes judeus/tão tenros que feneceram como espigas queimadas//

Nas naus trouxeram/bússolas quinquilharias sementes/plantas experimentais amarguras atrozes/um padrão de pedra pálido como o trigo/e outras cargas sem sonhos nem raízes/porque toda a ilha era um porto e uma estrada sem regresso/ todas as mãos eram negras forquilhas e enxadas//

E nas roças ficaram pegadas vivas/como cicatrizes — cada cafeeiro respira agora um escravo morto./ E nas ilhas ficaram/incisivas arrogantes estátuas nas esquinas/cento e tal igrejas e capelas/para mil quilómetros quadrados/e o insurrecto sincretismo dos paços natalícios./ E ficou a cadência palaciana da ússua/o aroma do alho e do zêtê d’óchi no tempi e na ubaga téla/e no calulu o louro misturado ao óleo de palma/e o perfume do alecrim/e do mlajincon nos quintais dos luchans//

E aos relógios insulares se fundiram/os espectros — ferramentas do império/numa estrutura de ambíguas claridades/e seculares condimentos/santos padroeiros e fortalezas derrubadas/vinhos baratos e auroras partilhadas/Às vezes penso em suas lívidas ossadas/seus cabelos podres na orla do mar/Aqui, neste fragmento de África onde, virado para o Sul,/um verbo amanhece alto/como uma dolorosa bandeira. In “Novafrica” – Angola com “A semana”


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