Tal como o Ponto Final já havia revelado na sua edição de terça-feira, o Festival da Lusofonia vai ser adiado para o mês de Dezembro. Sem adiantar ainda em que dias, o Instituto Cultural anunciou ontem a mudança de planos em nota de imprensa. Associações compreendem a decisão das autoridades, mas…
O
Instituto Cultural anunciou ontem o adiamento de diversos eventos até ao final
do ano, entre os quais o Festival da Lusofonia para Dezembro, tal como o Ponto Final
havia revelado esta semana. Sem ainda se saberem quais os dias, o evento surge
com uma novidade: estará integrado na 3.º “Encontro em Macau – Festival de
Artes e Cultura entre a China e os Países de Língua Portuguesa”.
O
nosso jornal foi sentir o pulso ao sentimento de cada uma das associações
lusófonas que trabalham ano após ano para a realização do evento, que vai já na
sua 24.ª edição.
Maria
Amélia António, presidente da Casa de Portugal em Macau, sente “imensa
estranheza” nessa integração. “Como é que se pode incluir o Festival da
Lusofonia, que já existe há mais de 20 anos, num evento sem expressão?”,
questiona, acrescentando: “Acho muito estranho porque esse tal festival de arte
e cultura é algo muito novo e o Festival da Lusofonia é um evento antigo com
muita tradição, inclusive junto da comunidade chinesa local. Serve para as
pessoas confraternizarem e não faz sentido estar inserido noutra coisa ligada à
arte e à cultura”.
A
advogada portuguesa reitera “é evidente que [Dezembro] é muto tarde para um
festival ao ar livre como a Lusofonia e, claro, vai coincidir com outras
actividades já programadas. Seja qual for a data, em Dezembro é sempre má. E,
sinceramente, gostaria de saber que actividades serão realizadas naquele espaço
[Casas-Museu da Taipa] durante o mês de Novembro”.
Para
a líder da Casa de Portugal é expectável que o evento decorra de 3 a 5 ou de 10
a 12 de Dezembro, “uma vez que de 17 a 19 atrapalha os preparativos das
comemorações do dia da transferência da administração de Macau da República
Portuguesa para a República Popular da China e, claro, de 24 a 26 é Natal”.
Um festival mais fresquinho
A
presidente da Associação Amigos de Moçambique de Macau, Helena Brandão,
considera a mudança para Dezembro “um pouco aborrecida”. “Para quem já tem mais
de metade das coisas feitas, torna-se bastante complicada esta mudança. Temos
já material de decoração feito, alguma comida feita com antecedência. Neste
momento as expectativas eram uma coisa e agora passam a ser outra”, diz.
Com
a mudança para Dezembro, Helena Brandão acredita que não haverá muitas dúvidas
que o festival terá de ocorrer na primeira ou segunda semanas, uma vez que
depois o calendário está impossível. Ao mesmo tempo, lembra a dirigente, os
preparativos da Associação Amigos de Moçambique de Macau ficam afectados porque
naquele mês os estudantes moçambicanos, que “são uma grande ajuda”, estão em
época de exames. “Teremos um festival mais fresquinho, mas o meu medo é se
aparecem casos em Novembro, então o que acontecerá em Dezembro. Será cancelado?
Enfim, na minha modesta opinião acho que poderia ser realizado ainda em Outubro.
O ano passado havia menos conhecimento da doença, ninguém estava vacinado e
acabou por ser um dos festivais mais concorridos de sempre. Nada disto agora é
a mesma coisa, mas temos que ter paciência”.
Vicente
Coutinho, responsável do Núcleo de Animação Cultural de Goa, Damão e Diu,
também concorda que a mudança da data do evento para Dezembro “é muito triste”.
“É um evento que, salvo raríssimas excepções, sempre aconteceu em Outubro. É um
local muito especial onde as comunidades locais, lusófonas, chinesas e outras,
comem, bebem, ouvem música, dançam. Serve para matar as saudades dos nossos
países e das nossas culturas e, agora, mais longe das comunidades lusófonas
fazia todo o sentido não adiar”, começou por dizer.
Contudo
o responsável de Goa, Damão e Diu também admite que o Governo tomou esta
decisão por causa dos últimos casos de Covid-19 no território: “Temos de ser
conscientes e temos de ter paciência, adaptarmo-nos como um camaleão, porque
dada a especificidade do território e a pandemia, tem havido muitas
restrições”.
O
núcleo, revela, não sai beliscado com o adiamento, até porque “já se sabe o que
se vai fazer e, como também não temos ninguém que venha de fora, as coisas
serão feitas mais próximo do dia do evento”. “Estamos limitados, mas temos de
ter muito cuidado com a movimentação do vírus”, notou Vicente Coutinho.
“Festa é sempre festa”
Jane
Martins da Associação Casa do Brasil em Macau esperava pelo adiamento da festa
lusófona, mas imaginou que se pudesse realizar em Novembro, como já sucedeu
noutras alturas, muito por culpa de tempestades tropicais que assolaram o
território.
A
responsável assumiu que ficou a saber do adiamento pela comunicação social e
que o IC apenas confirmou o adiamento sem data marcada. “Não achei má a ideia
do adiamento, seria pior se houvesse um cancelamento, uma vez que esta é uma
das maiores festas culturais de Macau. Lembro que, em 2013, o festival
aconteceu entre os dias 1 e 3 de Novembro para coincidir com a Conferência Ministerial
da China e dos Países de Língua Portuguesa, já que viriam muitos visitantes de
fora, principalmente dos Países de Língua Portuguesa e da China”, começa por
dizer Jane Martins.
Claro
que, quando mais tarde acontecer o evento, mais frio pode surgir no território,
uma vez que nos aproximamos do Inverno. Jane Martins nota precisamente isso.
“Lembro que Novembro já estava um pouco frio, e mesmo assim foi muito agradável
o ambiente e não houve diferença em termos de público ou animação por parte das
barracas e espetáculos no palco do Festival da Lusofonia”.
A
brasileira, radicada em Macau há muitos anos, afirma que participa no evento
desde a primeira edição, em 1998. E adiamentos, para além desse de 2013, só se
lembra de mais um, em 2016. “Que eu me lembre, só aconteceu uma vez o adiamento
por uma semana devido ao tufão em 2016 que chegou no mesmo fim-de-semana da
19.ª edição”.
Mas
nada disto esmorece Jane Martins, que acredita, independentemente da data, que
o festival será sempre “bem-vindo”, lembrando que “as comunidades aqui
residentes gostam muito do encontro e convívio proporcionado a todos”. “Ainda
mais agora que estamos praticamente presos sem podermos viajar livremente na
época natalícia e visitar as nossas famílias, que também não podem entrar em
Macau. Festa é sempre festa. Do que depender da Casa do Brasil, vamos fazer o
nosso melhor para colaborar e animar ainda mais o Festival da Lusofonia
independente da data a ser escolhida”, conclui.
Alexandre
Correia da Silva, da Associação Angola Macau, está sereno. Em conversa
connosco, não quis comentar em demasia o assunto, até porque não tem em sua
posse toda a informação sobre o adiamento para Dezembro. “Tomei conhecimento
desta situação por terceiros. Não tenho qualquer indicação oficial nesse sentido,
mas admito que este adiamento tenha a ver com a pandemia”, afirma o responsável
angolano ao nosso jornal, que agora irá conversar com o representando de Angola
no Fórum de Macau para ver o que irá acontecer.
Por
outro lado, o responsável pela Associação Angola Macau lembra que estamos em
tempo de pandemia e “se há algumas questões de saúde pública que é preciso
preservar, muito bem”. “Repare que o Festival da Lusofonia já é um evento do
calendário da RAEM, portanto, o seu adiamento terá sido muito bem ponderado
pelas autoridades. A mudança para Dezembro, a meu ver, não colocará em risco a
adesão das pessoas. Em particular, a nossa associação, não foi afecta por nada
em especial com esta mudança”, assume Alexandre Correia da Silva em conversa
telefónica.
Mais apoios às associações lusófonas
A
Associação dos Macaenses vai fazer o melhor possível. Esta é a promessa deixada
pelo presidente da agremiação, Miguel de Senna Fernandes, ao Ponto Final.
Contudo, assume o responsável, o mês de Dezembro tem um calendário muito
complicado. “O preferível é que fosse logo no primeiro fim-de-semana [3 a 5 de
Dezembro], contudo o que se fala por aí é que será de 10 a 12. É muito
complicado para nós, porque temos o nosso Jantar de Natal e ainda por cima
estamos a comemorar os 25 anos de existência. Muito provavelmente não teremos
uma intervenção no festival como em anos anteriores”, admite.
Para
o macaense, “o IC quis fazer o melhor possível, para que o festival não fosse
cancelado”. “Apesar de Dezembro não ser de todo a melhor altura, o importante é
que o evento não seja cancelado. As coisas são como são.”
Miguel
de Senna Fernandes deixa ainda um desabafo, em forma de mensagem destinada a
quem organiza e ajuda as associações a organizarem o festival. “É fundamental haver
mais apoios às associações lusófonas que, ano após ano, dão o litro.
Compreendemos as dificuldades do Governo, mas o Governo também tem de
compreender que as necessidades também aumentaram ano após ano”.
Graziela
Lopes, presidente da Associação dos Guineenses, Naturais e Amigos da
Guiné-Bissau, não se mostra surpreendida com o adiamento, uma vez que o tempo
passava e não havia notícias. A guineense desabafa que “mais vale adiar do que
cancelar”, mas admite que “Dezembro não é a mesma coisa que Outubro”.
“Obviamente que em Dezembro o clima é diferente de Outubro. E obviamente que
Dezembro é um mês muito mais cheio em termos de eventos em Macau”, constata.
A
responsável, que agora aguarda pela divulgação da data concreta, referiu que já
havia trabalho feito, inclusive “pedidos de peças de arte a artistas locais”
para estarem na barraquinha daquele país africano. “Estávamos também a preparar
algumas coisas com o Fórum de Macau, mas tudo acabou cancelado”, diz ainda,
desabafando que em Macau “as pessoas andam com medo de tudo”.
Importante não ser cancelado
Para
Leonor Mota, da Associação de Amizade Macau-Timor, o adiamento era
“expectável”. “No fundo estávamos à espera de um adiamento, para ser franca. A
recente notícia só veio confirmar. O importante é que o festival se realize.
Isso é o que nós desejamos, seja em Outubro, Novembro ou Dezembro, o importante
é que não seja cancelado”, diz a responsável ao Ponto Final.
Até
ao momento, os preparativos de Timor-Leste estão todos a aguardar impressão.
“Temos os materiais prontos para impressão e é só imprimir na altura do evento.
Andamos a adiar as impressões porque também queríamos ter a certeza de que o
evento acontecia”, explica Leonor Mota.
António
Costa vê o adiamento com compreensão pelo trabalho realizado pelo Governo local
na luta contra a Covid-19. O presidente da Associação dos São-tomenses e Amigos
de São Tomé e Príncipe, Macau-China, ainda assim, admite que “causa transtorno”
até porque “há meses que se está a preparar a presença no festival”. “A uma
semana do evento, naturalmente, que este adiamento causa transtorno, não só a
nós, como a todos os nossos colaboradores e fornecedores. Estávamos já
preparados para que o evento ocorresse agora”.
No
ano passado, afirma o responsável, “estava mais preocupado do que este ano”. “A
população respondeu com respeito e todos encararam as regras com naturalidade.
A meu ver, apesar de compreender o adiamento, seria mais lógico realizar o
evento agora porque agora temos a certeza de que a pandemia está controlada no
território, mas em Novembro ou Dezembro, é uma incógnita”, nota António Costa.
O
são-tomense mostra ainda alguma preocupação pelo facto de o adiamento “retirar
alguma importância ao evento, podendo este perder algum encanto”, até porque
Dezembro é um mês cheio de actividades, mas reitera que a associação à qual
preside está de “alma e coração” com as autoridades locais. “Enquanto
associação vamos continuar a cooperar com o Governo e a respeitar as suas
decisões. Macau tem feito tudo para que o território seja um caso de sucesso na
luta contra a Covid-19”.
O
Ponto Final tentou ainda o contacto com a Associação de Amizade Macau-Cabo
Verde, mas, até ao fecho desta edição, não foi possível chegar à fala com a
presidente, Ada de Sousa.
Ao
mesmo tempo que foi adiado o Festival da Lusofonia, o IC também adiou outros
três eventos. Um dia antes da reabertura das instalações culturais dependentes
do IC, o instituto anunciou, em comunicado, que serão retomadas várias
actividades culturais, incluindo actuações, workshops e cursos,
actividades de promoção da leitura.
O
“hush! Concertos 2021” e a “Feira de Artesanato do Tap Siac”, estão agora
programados para Novembro, e o 3.º “Encontro em Macau – Festival de Artes e
Cultura entre a China e os Países de Língua Portuguesa”, acontecerá em Novembro
e Dezembro. As datas dos eventos serão divulgadas oportunamente.
O
IC também revelou que as actividades culturais como o Programa Excursionando
pelas Artes serão retomadas a partir desta sexta-feira, dia 22 de Outubro.
Nesse sentido, as inscrições para “Visitas guiadas culturais”, “Venha Conhecer
Melhor o Nosso Património Mundial -Workshops para Famílias”, “Actividades de
Promoção da Leitura para Famílias” encontram-se reabertas ao público.
O
organismo deixou ainda a promessa de que vários eventos dos “Espectáculos no
âmbito da Excursão Cultural Profunda nas Zonas do Porto Interior e da Taipa”,
os concertos pela Orquestra de Macau e Orquestra Chinesa de Macau serão também
gradualmente retomados. Gonçalo Pinheiro – Macau in “Ponto
Final”
goncalolobopinheiro.pontofinal@gmail.com
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