Pintura Arq. Eduardo Moreira Santos, Lx (28.08.1904 - 23.04.1992)

segunda-feira, 23 de agosto de 2021

Portugal - Vacina covid portuguesa à espera de €20 milhões

Projeto está pronto para ensaio clínico mas os investidores exigem o apoio expresso do Governo. Produção inicial será no Canadá e depois em unidade a abrir em Portugal

A equipa de cientistas portugueses que concebeu uma vacina contra a covid tem tudo pronto para avançar para os ensaios clínicos e produção de doses e só está à espera do Governo. São precisos 20 milhões de euros, os investidores, internacionais, estão interessados mas não libertam um euro sem garantias de viabilidade, seja um investimento público direto no imediato ou uma pré-compra de vacinas, à semelhança do que fizeram os governantes alemães com o projeto da BioNTech, que viria a viabilizar a produção da primeira imunização contra o vírus, em parceria com o laboratório Pfizer.

“Temos várias hipóteses de financiamento, de privados estrangeiros, mas se o Governo não mostra interesse, não investem. Já nos reunimos com vários ministérios e com o próprio primeiro-ministro, que se mostrou muito recetivo. Houve uma declaração de interesse — e aguardamos. Além da vacina está também previsto dotar Portugal de uma unidade de produção para esta e outras vacinas”, adianta Pedro Madureira, diretor científico da Immunethep, uma unidade de biotecnologia em Cantanhede.

Ultrapassada a etapa agora em suspenso, a equipa de cientistas afirma ser possível colocar as doses no mercado no prazo de nove meses a um ano. “Um dos nossos parceiros é um fabricante de vacinas no Canadá e temos um slot de produção. Estão garantidas 20 mil doses iniciais, mais do que suficientes para os ensaios clínicos”, explica Pedro Madureira. A avaliação da vacina em humanos está programada para incluir 200 pessoas no total das fases I e II de norte a sul do país e até 5000 na fase III, esta já no exterior, onde ainda exista uma grande parte de população não imunizada.

“Concluímos em julho tudo o que eram os ensaios não clínicos, de eficácia e toxicidade em modelo animal. Foi fácil. Fomos buscar o vírus inativado aos EUA — comprámos cópias virais — e obtivemos o vírus vivo em Portugal. Os animais não vacinados morreram ao fim de uma semana e os vacinados sobreviveram e não tiveram doença”, descreve o investigador. “Os resultados mostraram que a vacina funciona e a ideia que temos é de que dará imunidade para a vida toda.”

Imunidade de longo prazo

A convicção do cientista numa proteção sem brechas, quando há dúvidas sobre a duração da imunidade conferida pelas vacinas já dadas a milhões de pessoas, reside num facto: “As pessoas que tiveram SARS-CoV-1 continuam imunes 18 anos depois.” E essa anterior infeção, contida em território asiático, deixou outra lição. “A imunidade é tão mais forte quão o foi a doença. Os anticorpos em circulação caem para metade a cada 23 dias na falta de estímulo. Contudo, as células que os produzem ficam armazenadas, e quando há um novo estímulo rapidamente produzem novos anticorpos, é quase imediato.

Já com a atual pandemia, os investigadores formaram ainda outra ideia. “Ficou claro utilizar o vírus total inativado, a forma tradicional de Pasteur. Quanto mais focada é a vacina, para um antigénio específico, maior é a probabilidade de deixar de ser eficaz. Neste caso, a única vantagem é a rapidez de produção.” Na prática, entre as versões no mercado, a mais parecida com a vacina portuguesa é a formulação chinesa, usando ambas o próprio coronavírus pandémico — e não uma cópia ou um vetor — para ativar a resposta defensiva do organismo.

A vacina portuguesa utiliza o vírus completo inativado, em duas tomas, separadas por 21 a 28 dias. E o cientista garante que “não será preciso reforço”. Segundo Pedro Madureira, o pico de resposta à vacina surge após 12 dias e a segunda dose serve somente para “garantir que o sistema imunitário fica muito ativo”. Além disso, a administração é oral, à semelhança das bombas utilizadas pelos asmáticos.

Validade de dois meses à temperatura ambiente

A facilidade da toma é uma mais-valia — “não será preciso pessoal especializado, que é limitado, nem temperaturas negativas; à temperatura ambiente a vacina tem validade de dois meses e de muito tempo se for conservada num frigorífico normal” —, mas a opção pela via oral visa sobretudo o efeito profilático pretendido. O investigador explica que “a melhor forma de imunizar um local é dar o antigénio nesse local, e através da via oral é possível estimular células do sistema imune que existem no pulmão, garantindo uma forte imunidade das mucosas pulmonares”, o alvo principal do coronavírus pandémico.

A confirmarem-se todos os resultados prévios e iniciado o fabrico, a vacina deverá ter como destino a população com indicação para terceira dose, de reforço contra as novas variantes, e os países menos desenvolvidos, onde as vacinas já em inoculação ainda não estão a chegar à população. Além disso, nesses locais são vantagens da vacina dispensar cuidados especiais de conservação e uma toma com intervenção de um profissional de saúde.

“Inicialmente, o objetivo era criar um consórcio nacional, mas a União Europeia foi mais rápida. Fazer o salto da investigação para a produção é muito dispendioso e o modo de atuação é muito diferente do que é utilizado na academia”, confessa o investigador, que se dedica há 20 anos à área das vacinas e já com outra fórmula pronta para ensaio clínico, esta para infeções bacterianas resistentes, em meio hospitalar.

Para já, da parte do Governo há uma afirmação de António Costa na entrevista recente ao Expresso. O primeiro-ministro disse ser “com entusiasmo” que vê “empresas portuguesas que estão a investigar novas vacinas e não desistem de ter vacinas de mais largo espectro”. Vera Arreigoso – Portugal in “Expresso”

varreigoso@expresso.impresa.pt

 

Arquivo de notícias sobre a Immunethep republicadas no blogue “Baía da Lusofonia”.

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