O Clube
Português da Grande Buenos Aires, maior instituição
lusitana na Argentina, lançou um livro com 43 anos de uma história com dois
diferenciais: levar a cultura portuguesa a outras nacionalidades e promover a
assistência social
“O
objetivo do livro é registar a história da instituição e a sua identidade que é
também a de milhares de portugueses que escolheram esta terra. Este clube
nasceu com a ideia de que os portugueses pudessem matar saudades”, conta à Lusa
Víctor Estanqueiro, presidente do clube.
A
obra “Clube Português da Grande Buenos Aires: do Rio Tejo ao Rio da Prata” é o
resultado de um ano de pesquisas e do testemunho de 40 entrevistados que, em
410 páginas, contam como foi a saga de milhares de portugueses que,
simbolicamente, trocaram de rios e de continentes.
Víctor
Estanqueiro, filho de portugueses, encomendou o trabalho a Carlos Correa, um
destacado jornalista, sem descendência portuguesa, mas especialista nesse tipo
de pesquisa histórica, autor de outros oito livros.
“Ao
escrever o livro, fiquei surpreso com a recetividade da comunidade portuguesa
em geral. Foi emocionante ver os olhos lacrimejantes dessa gente ao contarem as
suas histórias. Transmitiram-me essa emoção e acolheram-me como mais um
integrante. É a história do clube, mas são também histórias de vida”, descreve
Carlos Correa à Lusa.
A
instituição portuguesa nasceu em 23 de agosto de 1978 na cidade de Isidro
Casanova, no distrito de La Matanza, o mais populoso da região que rodeia
Buenos Aires, a 30 quilómetros da capital argentina. Foi declarada de interesse
cultural pelas câmaras municipal e provincial.
Na
Argentina, as instituições portuguesas têm vindo a completar o seu centenário.
É o caso da Associação Portuguesa de Socorros Mútuos de Salliqueló (1916), do
Clube Português da Cidade de Buenos Aires (1918) e da Associação Portuguesa de
Comodoro Rivadavia (1923), mas em apenas 43 anos, o Clube Português da Grande
Buenos Aires tornou-se a maior das 15 instituições portuguesas na Argentina em
infraestrutura, em quantidade de sócios (três mil) e em variedade de
disciplinas desportivas e culturais.
O
livro, previsto para ser lançado com nove capítulos há um ano, teve o seu
lançamento adiado devido à pandemia de covid-19. O evento que comove o mundo
inspirou um décimo capítulo que descreve como o ginásio do clube foi preparado
para se tornar um “hospital de campanha”, com 100 leitos para casos leves.
Também
aparece a visita, em 1995, do então Presidente português, Mário Soares, que
recebeu a chave da cidade ao tornar-se o primeiro Presidente estrangeiro em
exercício a visitar o distrito de La Matanza.
Em
junho de 1982, o clube foi um dos mais significativos doadores ao Fundo
Patriótico Ilhas Malvinas, criado para apoiar financeiramente os gastos durante
a guerra contra a Inglaterra (entre 02 abril e 14 junho), a assistência e as
indemnizações aos ex-combatentes e parentes.
O
almoço do Dia de Portugal daquele ano, o evento mais importante em arrecadação
de receitas, rendeu 70 milhões de pesos da época. Para se ter uma ideia do
esforço de cerca de mil portugueses, Diego Maradona doou 100 milhões.
Essa
generosidade é uma das duas principais marcas diferenciais da instituição
portuguesa. Como forma de integração com a sociedade ao seu redor e de
retribuir parte do que os portugueses conquistaram, o Clube Português da Grande
Buenos Aires promove uma série de campanhas para assistência social.
Neste
inverno, distribuiu roupa para o frio aos sem-abrigo. Todos os anos torna-se
ponto de recolha e de doação de sangue. No dia das crianças, leva brinquedos a
um hospital infantil.
Outra
vocação estratégica do clube é a difusão da cultura portuguesa. É a única
instituição portuguesa aberta às demais nacionalidades e às suas descendências.
É também o que mais procura levar a cultura portuguesa a outros âmbitos, a
festivais que não sejam os de origem lusitana.
“Embora
tenhamos um embaixador formal de Portugal na Argentina, somos também
embaixadores de Portugal. O nosso objetivo é que quem não tem nada a ver com
Portugal possa escutar um fado, saborear a nossa culinária, ver a nossa dança
típica e aprender a nossa língua. Queremos chegar a essa gente. Esse é o nosso
lema”, explica Víctor Estanqueiro.
O
clube tem duas grandes ferramentas para esse objetivo: os ranchos folclóricos
Mocidade Portuguesa e Dançares da Nossa Terra, sendo este segundo o que mais viaja
pelo país e o que mais procura exibir Portugal nas festividades de outras
nacionalidades.
“Os
portugueses já conhecem a nossa cultura. É necessário abrir a nossa cultura
para que outros nos possam conhecer. Por isso, vamos às festas de outras comunidades”,
indica José Aniceto Domingos, um dos fundadores do Dançares da Nossa Terra em
1993 e um dos primeiros sócios do clube.
Este
algarvio de Pechão, concelho de Olhão, chegou à Argentina com 13 anos. Aos 48,
fundou o rancho com bailarinos infantis entre 5 e 8 anos. Aquela primeira turma
era integrada por Natália Rodrigues e Pablo da Silva Pais, com 6 e 8 anos,
respetivamente. Os dois casaram-se e hoje, aos 34 e 36 anos, são os professores
da nova geração.
Essa
forma de relacionar-se através de redes de amigos ou parentes foi justamente a
chave para a chegada de milhares de portugueses a La Matanza entre as décadas
de 1920 e 1960. Um amigo já estabelecido convidava o outro ou trazia a sua
mulher e filhos.
O
instrumento mais usado era uma carta de chamada, muitas vezes com a tentação de
um contrato de trabalho.
A
Zona Oeste da região periférica de Buenos Aires era um fértil cinturão para a
pequena agricultura de frutas, verduras e hortaliças. A região era também
propícia para os fornos de tijolos. Os portugueses foram líderes nas duas
atividades e protagonistas da transformação da área, incluído o Clube Português
da Grande Buenos Aires, hoje um dos principais da Argentina. In “Bom dia
Europa” - Luxemburgo
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