O que são espécies introduzidas?
A diversidade nas comunidades locais é o resultado de
processos históricos, regionais e locais que afectam a extinção, especiação e dispersão
de espécies que, por sua vez, determinarão as biotas e os domínios
biogeográficos regionais. No entanto, desde o início das grandes rotas
interoceânicas e transoceânicas, a humanidade tem mudado significativamente a
distribuição de espécies e os padrões biogeográficos, introduzindo organismos
além da sua distribuição nativa. Espécies introduzidas (ou exóticas) são
aquelas que foram transportadas, intencionalmente ou não através de meios
mediados por humanos, para regiões onde elas não existiam anteriormente
Segundo as definições adoptadas pela Convenção Internacional sobre Diversidade Biológica, se a espécie introduzida consegue reproduzir-se e gerar descendentes férteis, com alta probabilidade de sobreviver no novo habitat, ela é considerada estabelecida. Caso a espécie estabelecida expanda a sua distribuição no novo habitat, ameaçando a diversidade biológica nativa, ela passa a ser considerada uma espécie introduzida invasora.
Impactos das espécies marinhas introduzidas
Uma
vez no novo habitat, as espécies marinhas introduzidas podem dispersar-se para
substratos naturais e artificiais, causar impactos ecológicos e socioeconómicos
em: biodiversidade (ex. redução na riqueza de espécies), habitats (ex. perda de
habitat), interacções bióticas (ex. competição por recursos ou espaço),
genéticos (ex. alteração na pool de genes por hibridização), turismo
(ex. redução de actividades turísticas), pesca (ex. redução da abundância de
espécies comerciais), aquicultura (ex. redução na qualidade dos produtos),
embarcações-amarrações (ex. aumento do custo de manutenção como resultado da
presença de organismos incrustantes), etc.
A
bioinvasão é reconhecida como a segunda principal causa de perda de
biodiversidade, impactando os serviços ecossistémicos. Portanto, o conhecimento
desses eventos é de extrema importância para o desenvolvimento de políticas
públicas nacionais e os seus efeitos negativos, podem ser motivo de especial
preocupação em regiões do mundo onde o estado de conhecimento da biota marinha
é relativamente pobre, pois podem promover a perda da biota nativa antes mesmo
antes de ser conhecida pela ciência.
Baías como áreas de interesse
A
maior parte do comércio mundial ocorre por transporte marítimo entre portos,
concentrados em baías e estuários, criando oportunidades para transferências de
espécies associadas a cascos de navios e materiais de lastro. Além disso, as
baías são focos para muitas outras actividades conhecidas por transferir
organismos, como aquacultura, pesca e recreação ao ar livre. As condições
hidrológicas e ambientais locais modificadas permitem fornecer protecção aos
barcos, mas por sua vez criam condições favoráveis para a chegada de espécies
introduzidas.
As
baías e os serviços ecossistémicos que nelas existem, como as marinas, são
pontos focais ideais para a detecção precoce dessas espécies, o que pode ser um
aspecto essencial para uma potencial erradicação e um manejo
efectivo, fornecendo igualmente um excelente ambiente para experimentos para
testar teorias sobre mecanismos subjacentes ao processo de invasão,
especialmente durante as fases de assentamento e estabelecimento.
Espécies introduzidas encontradas em uma marina de Luanda
A situação no Atlântico Sul - O caso de Angola
Estudos
do Atlântico Sul que descrevem espécies introduzidas estão, na sua
maioria, restritos às costas argentina, brasileira e sul-africana. Dentre os estudos
mais importantes, foram relatadas mais de 75 espécies introduzidas na região ao
largo do Uruguai e da Argentina; 42 espécies introduzidas de invertebrados
bentónicos associadas a incrustações em cascos de embarcações na costa
brasileira e 95 espécies introduzidas para a África do Sul.
Considerando
este grande número de espécies introduzidas reportadas e o intenso tráfico de
escravos que ligaram os continentes americano e africano desde o século XVI, é
esperado que a pouco conhecida costa ocidental tropical de África esteja
exposta à intensa introdução de espécies introduzidas. No entanto, as mesmas
são desconhecidas ou relatadas, na sua maioria, em revistas locais ou na
literatura cinzenta.
Angola
possui vários portos internacionais e marinas, com uma história de navegação de
mais de 500 anos, iniciada pela chegada dos primeiros colonos europeus e
intensificada por um forte tráfico de escravos. No entanto, o conhecimento
sobre a fauna nativa e introduzida da costa angolana é escasso, impedindo uma
melhor compreensão da distribuição das espécies para o Atlântico Sudeste. A
falta de avaliação ecológica e estudos das espécies introduzidas marinhas em
Angola criou uma lacuna em relação à sua distribuição actual e impacto nas comunidades
nativas.
Recentemente,
deu-se o início à investigação em bioinvasões marinhas ao longo da costa angolana,
concretamente em invertebrados marinhos, com os primeiros estudos a serem
realizados nas baías de Luanda e do Lobito. Dos estudos efectuados nas duas
baías, foram identificadas 21 espécies introduzidas, das quais 13 espécies são
relatadas pela primeira vez em águas angolanas. A maior parte das espécies
introduzidas tem origem no hemisfério norte, uma consequência da principal via
de introdução, que foi provavelmente a proveniente do Atlântico Norte/Mar
Mediterrâneo durante a colonização portuguesa, apesar de também ter-se verificado
introduções vindas da Ásia, sendo que as mesmas poderão ter-se dado mais
recentemente,
com o aumento de trocas comerciais entre Angola e China nos últimos 10 anos.
Várias espécies causadoras de perdas ecológicas e económicas em habitats
costeiros em todo o mundo, foram registadas para a região, sendo mandatória a
existência de estratégias de manejo de espécies introduzidas em águas
angolanas.
Espécies introduzidas encontradas em placas de
colonização
O futuro
Certamente subestima-se a diversidade de espécies introduzidas e, desta forma, avaliações regulares e rigorosas, especialmente em relação a outros táxons ainda não mencionados, e monitoramento das espécies marinhas introduzidas ajudarão a entender melhor os vectores, rotas e o tempo das introduções, bem como o papel dos portos e marinas como fontes de invasões marinhas ao longo desta costa. Torna-se assim decisivo o estudo das bioinvasões marinhas na costa tropical ocidental de África no geral, e em Angola em particular, por razões tanto económicas como ecológicas, mas sobretudo para se ter uma imagem global da situação e seleccionar acções para a conservação dos habitats marinhos. Lueji Pestana – Angola in “Novo Jornal”
Lueji Pestana - Professora Auxiliar do Departamento de Biologia da Faculdade de Ciências da Universidade Agostinho Neto
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