No
dia 25 de maio de 1963, em Adis Abeba, foi constituída a OUA - Organização da
Unidade Africana.
Nessa
altura o mundo encontrava-se dividido em dois blocos, o dos Estados Unidos da
América (EUA) e o da ex-URSS (União das Repúblicas Socialistas Soviéticas).
Logo
nos debates da fundação da OUA, o posicionamento dos países então representados
no ato constitutivo fizeram refletir as diferenças a seguir no rumo da marcha
do continente africano.
De
tal sorte assim foi que, infelizmente, a guerra fria que se desenrolava na
Europa deu lugar, em África, a guerras quentes por interpostos agentes que
tinham como pano de fundo o mundo bipolar.
Naturalmente
que as questões concretas com que se debatia o continente africano nessa
altura, o apartheid, praticado pelo regime da África do Sul, as descolonizações
que importava prosseguirem e a defesa da unidade do continente não deixaram de
estar presentes.
Porém,
a OUA foi incapaz - há que reconhecê-lo - de ultrapassar as profundas
divergências causadas pelo mundo bipolar, cujos interesses acabaram por a
influenciar e, em muitos casos, de forma trágica.
Esta
realidade, de par com os demais condicionalismos existentes, conduziram os
países recém-independentes a serem vítimas do próprio círculo vicioso da
pobreza, por ausência de uma aposta num desenvolvimento económico coerente,
agravando o autoritarismo do exercício do poder político, senão mesmo o
nepotismo, a corrupção, a ausência de uma planificação familiar e o
exacerbamento de conflitos entre religiões ecuménicas.
Sendo
certo que não se pergunta a um escravo que deseja a liberdade como a prioridade
essencial da sua vida, o que espera conquistar após alcançar essa liberdade,
também os ex-combatentes africanos que combateram pela libertação dos
territórios colonizados tinham como objetivo serem cidadãos livres na
autogestão dos territórios de que eram originários.
No
mais, o caminho a seguir far-se-ia caminhando.
Isto
não significa que se branqueie ou procure branquear as posições que, após as
independências, muitos dos combatentes contra o colonialismo e mais tarde
líderes dos respetivos países assumiram no exercício do poder.
Sobretudo
no alinhamento e na dependência de um ou outro dos blocos existentes sem
contribuírem para a gestação de uma linha identitária própria para África e
nela para os respetivos países.
Para
além disso, a realidade de hoje, sendo o que é, faz evidenciar que o
desmantelamento do apartheid na África do Sul, a independência da Namíbia (ex
sudoeste africano) e as independências das ex-colónias portuguesas em África só
ocorreram após a queda do mundo bipolar, com a implosão da ex-URSS.
O
surgimento de um mundo que passou a ser unipolar, polarizado nos EUA, fez
despoletar o termo de muitos conflitos em África que tinham antes como pano de
fundo a realidade bipolar, conduzindo ainda a eleições democráticas com base no
princípio de que a cada cidadão deve corresponder um voto.
Há
que, porém, fazer notar que as eleições democráticas em África estiveram longe
de conduzirem à estabilização política dos países, como a realidade veio a
evidenciar.
Isto
porque não se teve em atenção que a realidade diferenciada dos países não
deveria, nem poderia, impor a transposição mecanicista da democracia, sem
consideração pela especificidade concreta dos destinatários dela, criando molas
amortecedoras, como Mandela concebeu para a constituição da nova África do Sul.
Durante
esse período, a OUA alterou a sua denominação para UA - União Africana.
O
mundo unipolar, hegemonizado pelos EUA após a bipolaridade, também já não
existe mais.
Hoje
temos um mundo multipolar, tendo surgido novas potências à escala global - como
é sabido - e, desde logo, a República Popular da China.
No
Dia de África, 25 de maio de 2021, que hoje se comemora, é com este novo mundo
que o continente deve e tem de olhar o futuro.
Ao
fazê-lo, não é possível deixar de considerar que o peso do endividamento
global, muito significativo, impõe negociações diferentes das que, até ao
presente, foram encaradas para que seja possível fazer canalizar investimentos
que resultem da libertação de compromissos com moratórias a acordar, o que vai
no interesse dos próprios credores.
De
par deste objetivo, há que fazer convergir esforços para a superação de tensões
e conflitos, alguns dos quais se sustentam em radicalismos extremos, com
alegadas raízes messiânicas que nada têm de fundamentos religiosos, como o que
ocorreu no norte de Moçambique, em Cabo Delgado, fez evidenciar.
O
combate às fortes desigualdades que se agravaram com a pandemia da Covid-19,
encontra terreno fértil para os extremismos e o consequente combate à corrupção
não pode deixar de estar na ordem do dia, tal não pode deixar de o estar a
planificação familiar, sabendo-se como se sabe, que as mulheres em África têm
uma fertilidade de 5 a 7 filhos.
Daí
que o continente africano seja muito jovem, com alguns países a terem uma média
etária maioritária inferior a 18 anos.
A
conciliação da necessidade dos jovens terem uma formação escolar que os
capacite para o futuro, é, obviamente, incompatível com a ocupação deles em
funções produtivas.
O
equilíbrio desta resposta não é fácil, mas não pode deixar de ser colocado.
Está
em causa o futuro que, em África, assenta também e sobretudo na priorização da
sustentação dos países com a valorização do setor primário, ou seja, a
agricultura e as pescas.
No
mais há sempre que relevar a prevalência do interesse geral sobre os interesses
egoístas.
Estas
são hoje, entre muitas outras, as questões que no Dia de África que hoje se
comemora, por ter sido nela que foi criada a OUA que importa a nosso ver
atender.
Infelizmente,
a persistência da pandemia impossibilitou a realização de uma iniciativa
presencial evocativa da data, o que não prejudica que a UCCLA deixe de
assinalar este dia, com os olhos sempre postos no futuro de África e dos países
africanos e, desde logo, nos de língua oficial portuguesa.
As
medidas de desconfinamento que se começaram a tomar, na sequência da vacinação
generalizada, vão seguramente possibilitar iniciativas presenciais que
representam o pulsar da energia de África e dos africanos, com debates
alargados e meritórios que reforcem uma maior esperança de desenvolvimento
humano para todos. Vitor Ramalho - UCCLA
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