São
Paulo – O poeta português Manuel Maria de Barbosa du Bocage (1765-1805), ícone
da poesia em Língua Portuguesa, não nasceu na rua de São Domingos, atual rua de
Edmond Bartissol, em Setúbal, como mostra uma placa ali instalada há mais de um
século, mas ao Largo de Santa Maria com a rua de Antônio Joaquim Granjo, antiga
rua das Canas Verdes, na mesma cidade. Esse e outros pormenores desconhecidos
do poeta, como o tempo real de sua prisão e detalhes de sua obra e de seus
últimos dias, constam do livro Bocage, o perfil perdido, do pesquisador brasileiro
Adelto Gonçalves, que acaba de ser publicado pela Imprensa Oficial do Estado de
São Paulo (Imesp), 18 anos depois da edição portuguesa que saiu pela Editorial
Caminho, de Lisboa.
Como
a editora observa na contracapa, Bocage, o perfil perdido é biografia
exaustiva e rigorosamente documentada. Já em si controversa, a história de vida
do poeta é contextualizada pelos tempos tormentosos nos quais viveu, em que
ocorreram a queda do marquês de Pombal, a ação do intendente de Polícia Pina
Manique e a campanha do Rossilhão, entre outros fatos importantes. A biografia
recua ao avô do poeta, apresenta sua árvore genealógica desde os bisavôs,
abrangendo toda a sua vida, a passagem pelo Rio de Janeiro, Ilha de Moçambique
e Índia, e sua participação e expulsão da Nova Arcádia.
Adelto Gonçalves expõe alguns erros históricos. Além do endereço da casa onde o poeta nasceu, o pesquisador corrige outros equívocos, apresentando importantes descobertas, desde a prisão de seu pai, e informações inéditas, como a sobrevivência da Nova Arcádia em Lisboa até 1801. Do último período da vida de Bocage, relata suas contendas com os censores da Real Mesa da Comissão Geral sobre o Exame e Censura de Livros, e a atuação como tradutor e revisor na Oficina Tipográfica, Calcográfica, Tipoplástica e Literária do Arco do Cego. E reconstitui os últimos dias do poeta, que morre em Lisboa em 21 de dezembro de 1805.
Bocage,
o perfil perdido estende-se muito além de sua morte,
restabelecendo os embates relacionados à memória do poeta entre elmanistas,
partidários de Bocage, e José Agostinho de Macedo, seu feroz opositor. Recupera
cartas inéditas deixadas por sua irmã Maria Francisca, mostrando-a ludibriada
por “falsos amigos”. A biografia apresenta descobertas como a prisão do pai do
poeta na cadeia do Limoeiro, de 1771 a 1777, acusado como ouvidor de Beja de
ter desviado a arrecadação da décima referente ao ano de 1769.
Outra
informação importante, segundo o escritor, é que o poeta, preso em 1797,
permaneceu detido mais tempo do que se sabia, até o último dia de 1798, quando
saiu do Real Hospício de Nossa Senhora das Necessidades. O livro é resultado de
um ano de pesquisas em arquivos portugueses, com bolsa de pós-doutoramento da
Fundação de Amparo à Pesquisa no Estado de São Paulo (Fapesp).
No prefácio que escreveu para este livro, Fernando Cristóvão, professor catedrático de Literatura da Universidade de Lisboa, lembrou que “o interesse de Adelto Gonçalves por Bocage radica-se numa tradição brasileira, tanto erudita como popular, que sempre acolheu o poeta com especial carinho. Quer as pessoas cultas, apreciando a perfeição dos seus versos, especialmente os sonetos, quer a gente do povo recordando ou inventando um anedotário brejeiro”.
Currículo
– Adelto Gonçalves (1951), nascido em Santos-SP, é jornalista desde 1972,
quando começou a trabalhar no extinto jornal Cidade de Santos, do grupo
Folhas. Tem passagens pelos jornais A Tribuna, de Santos, O Estado de
S. Paulo e Folha da Tarde e pelas editoras Abril e Globo. Em
Portugal, é colaborador do quinzenário As Artes Entre as Letras, do
Porto, e das revistas Vértice e Colóquio/Letras, de Lisboa. É também
colaborador do Jornal Opção, de Goiânia, do Diário do Nordeste,
de Fortaleza, e da revista digital VuJonga, de Lisboa, dedicada aos
povos da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), entre outros sites
do Brasil e Portugal.
Doutor
em Letras na área de Literatura Portuguesa pela Universidade de São Paulo (USP),
é mestre em Língua Espanhola e Literaturas Espanhola e Hispano-americana pela
mesma instituição. Seu trabalho de doutorado Gonzaga, um Poeta do Iluminismo,
sobre o poeta Tomás Antônio Gonzaga (1744-1810), foi publicado em 1999 pela
Editora Nova Fronteira, do Rio de Janeiro, com prefácio do poeta Alberto da
Costa e Silva, ex-presidente da Academia Brasileira de Letras (ABL).
Foi
professor titular da Universidade Santa Cecília (Unisanta) e Universidade São
Judas-Unimonte, nos cursos de Jornalismo, e da Universidade Paulista (Unip), nos
cursos de Direito e Pedagogia, em Santos. É autor de Mariela morta, contos
(Ourinhos, Complemento, 1977), Os vira-latas da madrugada, romance (Rio
de Janeiro, José Olympio, 1981; Taubaté-SP, Editora Letra Selvagem, 2015), Barcelona
brasileira, romance (Lisboa, Nova Arrancada, 1999; São Paulo, Publisher
Brasil, 2003), Fernando Pessoa: a voz de Deus, artigos e ensaios
(Santos, Editora da Unisanta, 1997); Tomás Antônio Gonzaga, estudo
biográfico-crítico (Rio de Janeiro/São Paulo, ABL/Imesp, 2012); e Direito e
Justiça em terras d´el-rei na São Paulo colonial - 1709-1822, ensaio
histórico (São Paulo, Imesp, 2015). Em 2019, publicou também pela Imesp o livro
O reino, a colônia e o poder: o governo Lorena na capitania de São Paulo –
1788-1797, ensaio histórico.
Prêmios
– Ganhou os prêmios José Lins do Rego de Romance (1980) da Livraria José
Olympio Editora, do Rio de Janeiro; Fernando Pessoa (1986) da Fundação Cultural
Brasil-Portugal, do Rio de Janeiro; Assis Chateaubriand (1987) e Aníbal Freire
(1994) da Academia Brasileira de Letras, e Ivan Lins de Ensaios (2000) da União
Brasileira de Escritores e Academia Carioca de Letras.
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Bocage, o
perfil perdido, de Adelto Gonçalves, com prefácio de Fernando Cristóvão.
São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo (Imesp), 520 págs., 2021, R$
85,00. O exemplar pode ser adquirido por meio do site da Imesp:
https://livraria.imprensaoficial.com.br/bocage-o-perfil-perdido.html
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