Uma equipa de investigadores da Universidade de Coimbra (UC) criou um modelo computacional inovador que pode vir a tornar mais rápido e menos dispendioso o desenvolvimento de novos fármacos para serem aplicados no tratamento de cancro, focados no contexto biológico da doença. Os resultados do estudo foram publicados na revista “Briefings In Bioinformatics”.
Considerando
que a descoberta de um fármaco é um processo extremamente complexo, moroso e
dispendioso, este trabalho, que resulta de uma colaboração entre a Faculdade de
Ciências e Tecnologia (FCTUC) e a Faculdade de Farmácia (FFUC) da UC, teve como
objetivo encurtar as etapas iniciais de desenvolvimento de fármacos, recorrendo
à Inteligência Artificial (IA), através de métodos computacionais que consigam
gerar compostos farmacologicamente interessantes de uma forma mais rápida e
automatizada.
Para
desenvolver o novo modelo, a equipa do Departamento de Engenharia Informática
da FCTUC recorreu a técnicas de Machine Learning, designadamente Deep
Learning – um método que utiliza redes neuronais artificiais. Estas
estruturas permitem criar modelos inteligentes «através da mimetização da
capacidade de aprendizagem dos modelos biológicos. Deste modo são capazes de
identificar padrões embebidos em conjuntos de dados e, a partir daí, é possível
obter modelos que geram novas estruturas moleculares e que preveem propriedades
biológicas de interesse», explica Tiago Oliveira Pereira, primeiro autor do
estudo, que faz parte do seu doutoramento, orientado pelos professores Maryam
Abbasi e Joel P. Arrais.
Os
investigadores utilizaram também o designado Reinforcement Learning
(aprendizagem por reforço), que permite otimizar o modelo generativo durante a
exploração do espaço químico existente. «À medida que o modelo gera novas
moléculas, ele recebe uma recompensa, que será maior ou menor, dependendo do
estado de otimização das propriedades dos compostos. Assim, ao longo deste
processo de otimização, o gerador de compostos vai aprender a identificar as
regiões do espaço químico que lhe permitam obter maior recompensa e melhores
compostos», refere o investigador da FCTUC.
O
modelo desenvolvido é inovador porque, explicam os autores, «é um modelo que
combina informação química, através dos compostos, e biológica, por via de
informação da expressão génica, de modo a encontrar moléculas promissoras na
inibição do recetor e que não causem efeitos indesejados ao sistema biológico».
Com
a colaboração do laboratório do professor Jorge Salvador da FFUC, foi possível
aplicar o modelo num caso de estudo para a geração de compostos capazes de
inibir a proteína USP7 (Ubiquitin specific protease 7). Esta proteína, sublinha
Tiago Oliveira Pereira, assume um papel fundamental «na progressão de vários
tipos de cancro e, atualmente, é vista como um recetor importante para o
desenvolvimento de fármacos».
Os
resultados obtidos nas experiências realizadas são altamente promissores, tendo
o modelo demonstrado elevada capacidade para gerar moléculas potenciais
inibidoras da USP7. «Mais de 90% das moléculas continham propriedades físicas,
químicas e biológicas essenciais para que ocorra a interação com o recetor.
Para além disto, verificámos que alguns compostos gerados pelo modelo
apresentam semelhanças com fármacos anticancro ao nível dos seus grupos ativos,
o que valida a abordagem implementada», relata Tiago Oliveira Pereira.
Apesar
de ter sido validado com dados de cancro da mama, o novo modelo computacional
pode ser aplicado a «diversos contextos em que se possam obter dados de
expressão génica associados à progressão da doença», explica o investigador,
adiantando ainda que os próximos passos da investigação vão incidir na melhoria
da arquitetura implementada e na «definição de um conjunto de métodos de
validação para filtrar as moléculas obtidas e, dependendo dos resultados,
avançar para a síntese dos melhores compostos».
Este
estudo foi cofinanciado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT), pelo
Programa de Investimento e Despesas de Desenvolvimento da Administração Central
(PIDDAC) e por fundos europeus, através do projeto D4-Deep Drug Discovery
and Deployment. Universidade de Coimbra - Portugal
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