A epopeia da emigração portuguesa para o Havai, que levou ao arquipélago no Pacífico 27000 portugueses, que trocaram a fome e a miséria pelo trabalho árduo nos campos de cana-de-açúcar, é contada no novo livro do jornalista Mário Augusto
“É
dos mais extraordinários movimentos de emigração que marcaram a diáspora
portuguesa”, disse o autor à agência Lusa, a propósito da obra “Mandem Saudades”,
publicada pela Fundação Francisco Manuel dos Santos, e que foi este sábado
apresentada em Espinho.
O
livro é dedicado “a todas as mães-coragem que, sem direito a opinião nas
decisões de partir, seguiram os maridos nessas aventuras”.
“Seguiam
doridas, mas determinadas, viram os filhos ainda crianças morrerem-lhes nos
braços durante a viagem, sofreram todas as privações, reergueram-se nos campos,
como pilar da família, fizeram vida e, como as árvores mais rijas, lançaram
longe as raízes dos valores da portugalidade e da família que ainda hoje
perduram no Havai”.
Segundo
Mário Augusto, estes portugueses não foram para o Havai por opção, mas atrás de
um contrato de trabalho que oferecia as viagens de ida e regresso.
“Era
um tipo de emigrantes que levava a família inteira, porque eles não tinham
dinheiro sequer para pagar o bilhete. Se o tivessem, iriam para outros destinos
tradicionais da emigração portuguesa, como o Brasil ou as ex-colónias”, contou.
Aguardava-os
uma viagem “terrível”, com mais de 1000 emigrantes amontoados num barco que
enfrentava um mar difícil. Morriam às dezenas por trajeto.
Chegados
ao Havai, trabalhavam nos campos da cana-de-açúcar e “a vida era tão dura que
alguns não quiseram continuar”, afirmou o jornalista e escritor.
Os
primeiros a chegar fizeram-no em 1878. Em 35 anos, foram 27000 a tomar esta
decisão.
Mas
alguns regressaram a Portugal, principalmente os oriundos do Alentejo e
Trás-os-Montes que, ao contrário dos açorianos e madeirenses, não estavam tão
familiarizados com a vida num território rodeado de mar.
Os
que vieram depois de 1914 já não tiveram de fazer uma viagem tão longa, pois o
Canal do Panamá abriu nesse ano, encurtando, e muito, o trajeto.
Segundo
Mário Augusto, no Havai “os portugueses foram sempre desenrascados e facilmente
ascendiam na hierarquia das plantações”.
“À
medida que começavam a amealhar dinheiro e a ter a possibilidade de sair desses
campos de cana, completamente isolados das cidades centrais das ilhas,
começavam a tentar dedicar-se ao negócio nas cidades principais e há dados de
grandes empresários na área da construção, do comércio e que rapidamente
começaram também a dar a possibilidade aos filhos de estudarem”, adiantou.
A
aculturação foi rápida e também a decisão de não quererem voltar a Portugal,
principalmente da parte dos açorianos e madeirenses.
E
são frequentes as marcas que esta emigração portuguesa deixou no território,
como o ‘ukelele’, o instrumento musical típico do Havai, que mais não é do que
um cavaquinho alterado por emigrantes madeirenses.
Os
alentejanos e transmontanos que não regressaram a Portugal, mas optaram por
deixar o Havai, aventuraram-se pelo norte, fixando-se essencialmente no estado
norte-americano da Califórnia.
Mário
Augusto, que esteve na fundação da SIC e em 2009 regressou à RTP, não esconde a
admiração por estes emigrantes, alguns dos quais teve a oportunidade de
entrevistar no Havai, contributos que podem ser lidos no livro que é hoje lançado.
Esta
emigração teve “um processo completamente diferenciado de toda a emigração
portuguesa que foi feita”, disse, acrescentando: “É uma emigração tão própria,
especial, que faz deles uns verdadeiros heróis, sem quererem”. In “Bom dia
Europa” – Luxemburgo com “Lusa”
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