Macau voltou a ouvir músicas de Natal em patuá, para despertar curiosidade sobre este crioulo de base portuguesa e em risco de extinção, disseram à Lusa membros do coro do grupo Dóci Papiaçam
“Hoje
estamos todos um bocado roucos”, avisou Elisabela Larrea antes da atuação no
Bazar de Natal no Largo da Sé, referindo-se com um sorriso à vaga de frio que
fez as temperaturas caírem 14 graus Celsius no espaço de um dia.
“O
coro é uma excelente maneira de trazer alegria às pessoas. A música consegue
transmitir sentimentos e a cultura macaense baseia-se na alegria, na diversão e
no espírito de estar em grupo”, disse a académica.
O
patuá foi criado ao longo dos últimos 400 anos pelos macaenses, uma comunidade
euro-asiática com muitos lusodescendentes e raízes em Macau.
Considerado
pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura
(UNESCO) como “gravemente ameaçado”, o nível antes da extinção, este crioulo
foi desaparecendo devido à obrigatoriedade de aprendizagem do português nas
escolas, imposta pela administração portuguesa.
A
atuação do coro foi uma forma de “apresentar o patuá a diferentes pessoas de
diferentes raízes culturais e linguísticas”, disse Larrea, perante a presença
de muitos turistas vindo da China continental.
“As
pessoas terão pelo menos curiosidade em saber quem somos e porque parecemos
diferentes”, disse a presidente da Associação de Estudos da Cultura Macaense.
O
coro nasceu do Dóci Papiaçam di Macau, mais conhecido por ser o único grupo
ativo de teatro em patuá, que recebeu formalmente em junho a distinção como
património cultural imaterial da China, dois anos depois do anúncio oficial.
“No
teatro até temos números musicais, mas é uma abordagem diferente para
apresentar e promover a língua. Estamos na rua, para além do momento, a
demonstrar a riqueza do patuá”, sublinhou Larrea.
Além
de duas canções com letra do poeta macaense José dos Santos Ferreira, mais
conhecido por Adé (1919-1993), o restante reportório foi escrito por Miguel
Senna Fernandes, encenador do Dóci Papiaçam, grupo que este ano celebra 30 anos
de existência.
A
primeira atuação do coro foi a 19 de dezembro de 1998, um ano antes da
transição da administração de Macau, de Portugal para a China e a segunda
durante a Missa do Galo de 2000. “Depois jurámos para nunca mais”, admitiu à
Lusa Fernandes, com uma risada.
Mas
o coro foi mesmo reativado em 2020, “não só para contribuir para o espírito de
Natal, mas também dar mais dinâmica” à comunidade, disse o presidente da
Associação dos Macaenses, já depois da atuação.
“A
reação foi realmente muito boa. Este ano apareceu mais gente e o público é
diferente, há muitos turistas, curiosos, mas também muitas pessoas que costumam
estar a ajudar nas coisas da diocese”, sublinhou Fernandes.
Antes
da segunda atuação do dia, a acompanhar uma missa em português, na Igreja de
São Domingos, o líder do Dóci Papiaçam disse que o coro é uma forma de haver
“mais intervenção, mais gente ainda” em Macau a interessar-se pelo patuá.
O
elemento mais novo do coro tem 16 anos e Fernandes disse esperar que “haja mais
vozes, mais jovens que possam cantar e interpretar, porque parece que não, mas
os coros têm uma dinâmica fantástica”. In “MadreMedia”
– Portugal com “Lusa”
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