É essencial, hoje mais do que nunca, compreender que a questão da Casamansa não pode ser reduzida a um simples assunto regional ou económico. Casamansa é uma nação cuja história remonta muito antes da sua integração forçada no Senegal pelas autoridades coloniais francesas, uma realidade muitas vezes negligenciada pelo discurso político e mediático dominante. Este conflito, muitas vezes apresentado como uma simples rebelião interna, está na realidade enraizado em questões históricas e políticas muito mais profundas.
Sob
a colonização francesa, a Casamansa não era uma " região " do Senegal,
mas sim uma nação por direito próprio, com as suas fronteiras que se estendiam
desde o Oceano Atlântico até ao rio Falémé, perto da actual fronteira com o
Mali. Longe de ser uma simples extensão do Senegal, Casamansa possuía uma
identidade política e cultural distinta, forjada por séculos de resistência e
autodeterminação. Foi apenas através de uma série de decisões administrativas
impostas pelos colonos franceses, sem consulta ou acordo do povo de Casamansa,
que esta nação foi anexada ao Senegal, transformando um povo orgulhoso e
independente numa “região” marginalizada.
A
administração colonial, procurando a simplificação territorial e o controlo
centralizado, traçou fronteiras arbitrárias que ignoraram as realidades sociais
e históricas dos povos que governava. Ao integrar a Casamansa no Senegal, os
franceses violaram os direitos políticos do povo de Casamansa, criando uma
divisão que continuou a aumentar desde a independência do Senegal em 1960. Esta
anexação forçada, vivida como uma traição pelas populações locais, está na raiz
da questão da Casamansa. A luta pela independência da Casamansa não é,
portanto, um simples grito de raiva contra as desigualdades económicas, mas uma
luta pelo reconhecimento do seu direito histórico à autodeterminação.
Casamansa
é mais do que uma região geográfica; é uma entidade política e cultural
distinta, com tradições próprias, história própria e projecto social próprio. O
que muitos não compreendem é que o povo da Casamansa não luta apenas por
melhores condições económicas ou por maior autonomia local, mas pela sua
dignidade como povo, um povo a quem foi negado o direito de decidir o seu
próprio destino. As autoridades senegalesas, herdeiras da divisão colonial,
continuam a tratar a Casamansa como uma simples região “rebelde” em vez de
reconhecerem a profundidade da sua história e a legitimidade das suas
reivindicações.
É,
portanto, essencial esclarecer as coisas: a questão da Casamansa é, antes de
mais, uma questão de justiça histórica e política. Esta nação, anexada sem
consulta, aspira recuperar o seu estatuto antes da colonização, um estatuto que
lhe foi arrancado pela violência do colonialismo. Para o povo da Casamansa, a
reconciliação com o Senegal passa necessariamente pelo reconhecimento desta
verdade histórica. O conflito que dura há décadas não pode ser resolvido
através de soluções económicas ou de promessas de desenvolvimento; requer uma
resposta política proporcional à gravidade desta injustiça histórica.
A
marginalização de Casamansa não é um simples legado económico, mas a
consequência de uma decisão colonial arbitrária, tomada sem o consentimento
daqueles que ainda sofrem as suas consequências. Reconhecer isto é reconhecer
que a solução para o conflito da Casamansa não se encontra apenas nas infraestruturas
ou nos subsídios, mas num diálogo político sincero, que admite a falha
original: a anexação forçada de um povo independente.
O
Senegal deve compreender que a Casamansa não pode ser pacificada pela repressão
militar ou pela simples promessa de uma melhor integração económica. Trata-se
de reconhecer os direitos históricos e políticos de um povo que, durante
séculos, lutou para preservar a sua autonomia e cultura face às potências
estrangeiras. Se o Senegal aspira a uma paz verdadeira e duradoura, deve parar
de tratar a Casamansa como uma região dissidente e começar a considerá-la como
uma nação com a sua própria história e legitimidade política.
É
neste reconhecimento da história colonial, e na compreensão de que a Casamansa
foi anexada contra a sua vontade, que reside a chave para uma resolução
duradoura do conflito. O futuro do Senegal, e mais amplamente da África
Ocidental, não pode ser construído com base no esquecimento ou na negação
destas verdades históricas. Casamansa, como nação, tem direito a um lugar pleno
no concerto das nações, e o seu povo merece finalmente ser ouvido e
compreendido pelo que é: um povo soberano, cuja voz nunca deixou de exigir
justiça.
Só
o reconhecimento desta história pode abrir caminho para uma paz duradoura. Abdou
Diallo – Casamansa in “Journal du Pays”
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