Macau tem “as infraestruturas, os profissionais e a vontade” para se afirmar como um centro de ensino português, não só na China, mas na Ásia, diz a atual coordenadora do Departamento de Línguas e Cultura da Universidade de São José, Tânia Ribeiro Marques. A eleição de um novo Chefe do Executivo que fala português e que tem uma abordagem “simpática e respeitadora” para com a comunidade promete também uma aposta continuada no desenvolvimento da língua na RAEM
– O uso da língua portuguesa em Macau é satisfatório?
Tânia Marques –
Acho que isto passa, principalmente, pelos falantes; além do trabalho do
Governo, que tem aqui um papel preponderante. Acabamos de eleger um novo Chefe
do Executivo, que fala português e que teve algumas abordagens bastante
simpáticas e respeitadoras do ponto de vista da língua portuguesa, nomeadamente
com uma das instituições de matriz portuguesa aqui em Macau. Teremos de
aguardar quais serão as políticas que este novo Executivo vai também pôr em
prática e as suas ações. Como pode ser mais e melhor? Depende se estamos a
falar da própria cidade em si, ou se estamos a falar de profissionais do
português. No caso dos profissionais do português, acho que podemos continuar a
fazer formações. Talvez, da mesma forma que os professores fazem a formação ao
longo da vida, na tradução ou na interpretação, seja necessário fazer um ‘refreshment’
ocasionalmente. Talvez ter alguns programas de imersão, com uma determinada
periodicidade.
– Como vê o atual nível português nos serviços públicos?
T.M. – Acho
que muitas vezes nos próprios serviços, existem mais recursos do que aqueles
que estão imediatamente à vista. Houve uma situação que me chamou muita
atenção, com um ex-aluno meu, num balcão de atendimento que me calhou. Quando
olhei para as línguas que estavam disponíveis, o português não era uma delas.
Perguntei porquê se ele é fluente em português, e respondeu-me que se disser
que fala português, todas as pessoas que falam português vão ser encaminhadas
para o balcão dele. Portanto, creio que existem mais recursos do que aqueles
que às vezes nos dão a parecer, o que não significa que não precisem de ser
reforçados e não precisem de ter esta formação ou este interesse em continuar a
aprofundar os conhecimentos de língua ao longo do tempo.
– Que tipo de apoios pode o Governo de Macau oferecer ao
ensino da língua à tradução?
T.M. – O
Governo tem estado a trabalhar e tem havido algumas ações concretas para o
ensino de língua portuguesa nas escolas. Sei que continua a dar incentivos e a
criar oficinas para crianças, nos mais variados níveis. Do ponto de vista das
universidades, estamos a trabalhar ainda com a Aliança para Formação de Quadros
Bilingues Qualificados nas Línguas Chinesa e Portuguesa – da qual fazem parte
cinco das instituições de ensino superior locais – e na preparação, justamente,
da terceira edição do Fórum de Reitores das Instituições de Ensino Superior da
China e dos PLP, que vai acontecer no final do mês. Isto é organizado pelo
Governo, em parceria com as universidades.
– O discurso oficial continua a apoiar o ensino português
e o uso do português. Isso realmente mostra que Macau tem potencial para ser a
base do ensino na China?
T.M. – Creio
que sim, porque temos as infraestruturas, os profissionais, e temos a vontade.
Institucionalmente existem os recursos e os meios. Acho que, havendo também a
um nível superior esse interesse, Macau tem uma grande possibilidade de se
afirmar como centro de ensino de português na Ásia.
– Desde que começou o seu trabalho na USJ, em 2022, o que
conseguiu implementar? Quais são os planos de futuro?
T.M. – Quando
tomei posse, aquilo que era mais premente era fazer a revisão dos programas de
licenciatura. Já submetemos o programa de tradução e foi aprovado. O passo
seguinte é passar para o que ainda não temos, que é a acreditação do programa
pela Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior.
Estamos a trabalhar nisso agora e em princípio o pedido será submetido até ao
final do ano. É uma avaliação muito completa sobre questões pedagógicas, o
currículo, e as condições em que as aulas têm lugar.
– Como vê o interesse atual nas áreas do português e da
tradução português-chinês?
T.M. – Os
nossos cursos de português tinham registado um crescimento consistente até
chegar ao período do Covid, que estragou não só os nossos planos, mas,
possivelmente, também os de outras instituições. Depois de uma descida brusca,
crescemos novamente de forma consistente. Neste momento temos cerca de 40
alunos para a licenciatura. A maioria dos nossos alunos são residentes de
Macau, mas começamos a sentir algum interesse de Hong Kong.
– A dificuldade em ter alunos do interior da China obriga
a USJ a ter uma abordagem mais internacional?
T.M. – Temos
um ambiente bastante internacional. Um dos trabalhos que tentamos fazer é
justamente pôr os nossos alunos dos PLP a fazer intercâmbio com os nossos
alunos da licenciatura e com outros falantes de língua portuguesa, que não
sejam apenas o português europeu ou o português do Brasil. Haver esta ligação
entre alunos não só de outras nacionalidades e culturas, mas também que possam
pôr em prática o seu português com pessoas de outras nacionalidades, permite
uma troca cultural e um intercâmbio muito interessante. Nelson Moura – Macau
in “Plataforma”
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