Um estudo publicado por Johnny Lam e Wai In Ieong, académicos da Universidade Politécnica de Macau, defende que língua e cultura portuguesa são elementos fundamentais para Macau se afirmar e contribuir para a construção da Grande Baía. Ao assumir plenamente a função de plataforma com os Países de Língua Portuguesa, Macau pode ajudar mais regiões da China a entrar em novos mercados e a promover o intercâmbio cultural
A
afirmação de Macau na Grande Baía passa pela promoção da língua de Camões, que
é vista como chave para trocas comerciais e culturais com os Países de Língua
Portuguesa (PLP). Esta é uma das conclusões de um estudo publicado, a 2 de
Outubro, na revista científica Asia-Pacific Journal of Second and Foreign Language
Education.
A
investigação esteve a cargo dos académicos Johnny Lam e Wai In Ieong, da
Faculdade de Humanidades e Ciências Sociais da Universidade Politécnica de
Macau.
No
artigo com o título “Translinguismo e
Sociedade Multicultural de Macau: passado, presente e futuro”,
os autores analisam alguns dos aspectos da sociedade de Macau e consideram que
o multiculturalismo pode ser uma vantagem, principalmente para o projecto da
Grande Baía.
“Macau
pode capitalizar as suas vantagens linguísticas e culturais, assumir-se como
centro cultural e assumir um papel influente para facilitar a comunicação entre
a China e os Países de Língua Portuguesa”, é defendido por Lam e Wai.
“O
multiculturalismo é uma das características vibrantes da sociedade de Macau,
contribuindo para preservar as culturas religiosas, étnicas, históricas e
sociais, que por sua vez são altamente benéficas para o desenvolvimento de
sinergias e a projecção de Macau na Grande Baía”, acrescentou.
Esta
conclusão em concreto tem por base um documento das autoridades municipais de
Zhuhai sobre a Zona de Cooperação Aprofundada entre Cantão e Macau, na Ilha da
Montanha. Segundo o documento, as autoridades do Interior da China esperam que
a zona de cooperação permita a Zhuhai aprofundar a relação com os Países de
Língua Portuguesa e ajudar empresas da região a explorar mais nesses mercados e
a estabelecer laços com companhias sediadas na América do Sul e em África.
Apostar na formação
Contudo,
para poder chegar a este objectivo e para que Macau se possa afirmar como um
centro comercial e cultural na Grande Baía com base na língua portuguesa, os
autores destacam que é necessário continuar a apostar no ensino e na formação
de quadros bilingues.
“Quer
seja para preservar a sua identidade cultural, respeitar a diversidade das suas
comunidades, ou alcançar plenamente o papel como uma plataforma de comércio e
serviços entre a China e os Países de Lusófonos, Macau precisa de formar mais
tradutores de Chinês-Português”, é recomendado pelos académicos. “Por isso,
Macau pode desenvolver activamente a formação de mais quadros qualificados com
competências nas duas línguas, promover a cultura portuguesa tanto interna como
externamente, e fazer uma boa utilização das suas vantagens linguísticas para
desenvolver e estabelecer uma melhor plataforma de serviços e comércio com os
Países de Língua Portuguesa”, sugerem.
Desempenhando
este papel, além da utilização da língua os investigadores recomendam
igualmente que Macau promova as características culturais portuguesas na Grande
Baía como uma forma de demonstração de soft power e aproximação aos
mercados que serve como plataforma.
Em
relação ao “poder” da língua portuguesa, o facto de ser um idioma com origens
europeias é também apontado como forma de promover melhores relações entre a
China e a União Europeia.
Inverter a tendência
A
necessidade de formar mais quadros conhecedores da língua portuguesa é
explicada com a tendência identificada no território, através da análise da
proporção de falantes de português como língua materna.
Os
autores destacam que a proporção em 1991 já era reduzida, na casa dos 1,8 por
cento da população, e que depois da transição caiu “significativamente” para
0,6 por cento da população, logo em 2001.
A
partir desse momento, até 2016, a proporção de pessoas com o português como
língua materna manteve-se estável. No entanto, o número é reduzido face à fatia
demográfica que tem o inglês como língua materna, que desde 2001 até 2016
cresceu de 0,7 por cento da população para 2,8 por cento da população. O inglês
é visto como uma boa aposta para a região, uma vez que é a língua mais
utilizada profissionalmente nas áreas científicas e financeiras.
No
campo das chamadas três línguas “mainstream” de Macau, a tarefa mais facilitada
está relacionada com o chinês e a utilização do mandarim. Entre 1991 e 2016, a
proporção de utilizadores do mandarim como língua materna cresce de 1,2 por
cento para 5,5 por cento, ao mesmo tempo que do cantonês desceu de 85,8 por
cento em 1991 para 80,1 por cento em 2016.
Reflexo característico
Sobre
o papel de Macau na Grande Baía, os investigadores consideram ainda que
reflecte o reconhecimento do valor linguístico e cultural da RAEM, o que se
traduz no papel como uma plataforma.
Esta
plataforma vai ser construída com diferentes elementos, com os autores a
destacarem o Fórum para a Cooperação Económica e Comercial entre a China e os
Países de Língua Portuguesa (Macau), o Centro de Trocas Culturais entre a China
e os Países de Língua Portuguesa, Um Centro de Treinos para Talentos Bilíngues
Proficientes em Chinês e Português, e ainda o Centro de Liquidação de Renminbis
em Macau entre os Países de Língua Portuguesa.
“Evidentemente
que todas estas iniciativas reconhecem o valor especial histórico de Macau, o
património cultural único, a riqueza e bem-sucedida sociedade multicultural”, é
sustentado. “A longa História da cultura portuguesa em Macau também influencia
as relações de proximidade entre Macau e os Países de Língua Portuguesa”, é
completado.
O que é translinguismo?
O
título do estudo dos autores Johnny Lam e Wai In Ieong recorre ao conceito de
translinguismo. Esta é a definição para um processo pedagógico desenvolvido no País
de Gales por Cen Williams, que pedia aos alunos para que utilizassem o inglês
para ler durante as aulas e escrevessem as notas do que liam em galês, para que
desenvolvessem competências nas duas línguas. Desde os anos 80 que o conceito
tem sido cada vez mais utilizado no campo da investigação científica,
principalmente para definir o fenómeno em que duas línguas diferentes em
contacto se influenciam e desenvolvem. João Filipe – Macau in “Hoje
Macau”
Sem comentários:
Enviar um comentário