As Nações Unidas recomendam “cautela” quanto à melhoria
da segurança em Cabo Delgado, no norte de Moçambique, considerando que ainda
não é claro o que se passa do lado rebelde, quando decorrem 90 dias para
avaliação de estragos
“O
Departamento de Salvaguarda e Segurança das Nações Unidas (UNDSS, sigla
inglesa) já expressou cautela, pois ainda não está claro se essas ações efetivamente
reduziram a capacidade dos grupos, uma vez que a presença e os combates
continuam em certos locais e as autoridades civis ainda não foram restabelecidas”,
lê-se num documento a que a Lusa teve recentemente acesso.
O
documento do ‘protection cluster’, grupo de agências das Nações Unidas que trabalham
na área da proteção da população em Moçambique, faz o enquadramento da situação
para estabelecer os princípios que considera basilares para que os deslocados
pelo conflito possam regressar a casa.
Entre
eles, destacam-se o voluntarismo e o caráter civil do retorno, ou seja,
quererem fazê-lo de forma voluntária e sem estarem integrados em colunas
militares, que podem fazer da população (e agentes humanitários) um alvo.
A
declaração destes princípios surge numa altura em que se multiplicam as mensagens
das autoridades a incentivar o regresso a algumas zonas anteriormente ocupadas
e em que forças conjuntas (militares moçambicanos com o Ruanda e Comunidade de
Desenvolvimento da África Austral, SADC) anunciam estar a acompanhar populações
no regresso a Palma – vila junto aos projetos de gás, atacada em março e onde o
número de vítimas ainda está por calcular.
Além
das incertezas sobre o que se passa do lado dos insurgentes, a ONU nota que os rebeldes
estão a deixar para trás zonas destruídas: “As cidades recentemente retomadas
sofreram destruição em larga escala, como visto em Mocímboa da Praia”.
As
Nações Unidas planeiam fazer avaliações de segurança “para perceber se os
atores humanitários e de desenvolvimento serão capazes de aceder a essas áreas
em breve”. “Nesse contexto, as autoridades compartilharam verbalmente com os
representantes [das Nações Unidas] que estão a trabalhar para no prazo de 90
dias [até final do ano] avaliarem os danos nas infraestruturas em áreas
retomadas, o que poderá abrir caminho para o regresso de deslocados”, nota-se
no documento.
“De
momento, o envolvimento da ONU nesses planos ainda não foi definido, no
entanto, é provável que seja chamada a apoiar a restauração de serviços e fornecer
assistência para facilitar um regresso gradual de deslocados”, desde que
seguindo os princípios definidos.
Além
do caráter voluntário e civil, esses princípios incluem diálogo com as
comunidades de deslocados, partilha de informação por parte das autoridades e
facilidade de acesso das agências humanitárias aos locais de retorno, para
garantir soluções de vida “viáveis e duráveis”.
No
documento sublinha-se ainda que um apoio ao regresso aos locais de origem não pode
significar uma redução de esforços para dar assistência “aos 732 mil deslocados
em Cabo Delgado e a novas chegadas”.
O
Alto-Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) contabiliza 732
mil deslocados, mas os números oficiais do Governo ascendem há alguns meses a
817 mil.
“O
ACNUR continua extremamente preocupado com a crise humanitária em curso e com
as necessidades dos deslocados e comunidades anfitriãs que precisam
urgentemente de assistência multissetorial”, lê-se no mais recente resumo
operacional.
O
alto-comissariado realça a situação de “mais de 10300 pessoas” que este ano chegaram
à Tanzânia e voltaram para trás, enviados para “áreas muito remotas de Cabo
Delgado”. A província é rica em gás natural, mas aterrorizada desde 2017 por rebeldes
armados, sendo alguns ataques reclamados pelo grupo extremista Estado Islâmico.
O conflito já provocou mais de 3 mil mortos, segundo o projeto de registo de conflitos
ACLED.
Desde
julho, uma ofensiva das tropas governamentais com o apoio do Ruanda a que se
juntou depois a SADC permitiu aumentar a segurança, recuperando várias zonas onde
havia presença de rebeldes, nomeadamente a vila de Mocímboa da Praia, que estava
ocupada desde agosto de 2020. In “Milénio Stadium” - Canadá
Sem comentários:
Enviar um comentário