Lisboa
– Um grupo de apaixonados pela aviação e gratos a Sacadura Cabral e Gago
Coutinho pela primeira Travessia Aérea do Atlântico Sul vai aproveitar o
centenário do acontecimento para o divulgar pelo mundo e promover o seu estudo
nas escolas.
A
primeira Travessia Aérea do Atlântico Sul (TAAS) começou às 06:45 de 30 de
Março de 1922, a partir da rampa do Centro de Aviação Naval, na Doca do Bom
Sucesso, em Lisboa.
Os
dois aventureiros, que já tinham trabalhado juntos em África, destacando-se no seu
trabalho que perdura até hoje, utilizaram três aviões e pararam em Las Palmas
(Canárias) e São Vicente (Cabo Verde), antes de atingirem o Brasil no chamado
“grande salto” que durou 11 horas e 21 minutos.
Ao
todo, Sacadura Cabral (piloto) e Gago Coutinho (navegador) percorreram 4527
milhas náuticas (8484 quilómetros), em 62 horas e 26 minutos.
“Além
da navegação astronómica de precisão, muito mais importante do que isso é a
questão do sonho. Foi um sonho de Sacadura Cabral, que só foi possível com o apoio
técnico e inquestionável de Gago Coutinho”, disse em entrevista à agência Lusa
o presidente da associação Lusitânia100, João Moura Ferreira.
O
líder deste grupo, com o nome do primeiro hidroavião (“Lusitânia”) que descolou
frente à Torre de Belém, e a referência ao centenário que se assinala em 2022,
considera que a grandiosidade do feito não é devidamente reconhecida em
Portugal, o que impede a sua divulgação a nível internacional.
A
associação quer contribuir para preencher esse vazio e desde que foi criada, há
nove anos, que trabalha na elaboração de um ambicioso programa que tem como
objectivo invocar esta primeira travessia como um feito de desenvolvimento
tecnológico e de união entre os povos.
Frente
ao Santa Cruz, o último hidroavião utilizado nesta viagem e que está visitável
no Museu da Marinha, em Lisboa, João Moura Ferreira não esconde o entusiasmo ao
falar destes dois pioneiros que atingiram o seu sonho graças à confiança que
depositaram um no outro.
“A
cumplicidade pessoal entre eles, a absoluta confiança, o trabalho de equipa que
eles tiveram, a confiança que tinham nas decisões tomadas são um exemplo para
toda a gente, em qualquer época e em qualquer lugar do mundo”, contou.
A
estes predicados, juntou-se a sabedoria, principalmente a adquirida durante
décadas a desenhar as fronteiras em África e o conhecimento dos instrumentos,
como o sextante de horizonte artificial criado por Gago Coutinho.
Para
o sucesso do feito contribuiu também o treino que a dureza das condições a que
o seu trabalho em África os obrigara, nomeadamente de acomodamento na selva.
Nos
aviões que usaram, dispunham de duas cabinas abertas em que estavam
literalmente encaixados parcialmente, sem capacidade de mobilidade.
O
feito aconteceu no ano em que se comemorava o centenário da independência do
Brasil e durante décadas fez parte da matéria escolar, o que actualmente
praticamente não acontece, uma situação que a associação pretende alterar.
“Todos
nós [gerações com mais idade] ouvimos falar do feito. Depois disso, saiu dos
programas da História em Portugal”, lamentou.
E
prosseguiu: “Hoje em dia dá-se muito pouca visibilidade a esses feitos, dá-se
muito pouca visibilidade aos trabalhos que foram feitos em África e que ficaram
como herança científica e nacional. Gostaria que se desse um pouco mais de
atenção, mas naturalmente os programas não dependem de nós.
Ainda
assim, a associação disponibiliza na sua página da internet “um repositório de
dados culturais e científicos para quem quiser ver e aprofundar melhor, o qual
tem claramente como destinatários os jovens e os professores das escolas”.
Segundo
João Moura Ferreira, engenheiro electrotécnico de formação, são várias as
disciplinas em que esta viagem poderá ser abordada, particularmente geografia e
matemática, “muita matemática”.
Eles
só ficaram vivos porque “acreditaram na matemática e confiaram na matemática.
Se não fosse isso, tinham-se perdido e tinham desaparecido sem deixar qualquer
rastro”, indicou.
E
lembrou o “extraordinário” que a viagem foi numa altura em que “ninguém se
atrevia a atravessar o Atlântico e ir aterrar numa pequena ilha”, pois todas as
travessias tinham sido feitas tinham sido contra um continente ou uma ilha do
tamanho da Irlanda”.
Para
João Moura Ferreira, uma das razões para o feito não ser mais conhecido a nível
internacional – embora seja considerado um acontecimento científico e humano
tremendos – é a pouca divulgação do único relatório da travessia, que foi
editado em inglês há 49 anos.
O
documento “Relatórios da primeira Travessia Aérea do Atlântico Sul” foi
inscrito pela Unesco no Registo da Memória do Mundo, a 27 de Julho de 2011, e
desde então é considerado Património da Humanidade.
Cópias
do relatório estão à venda na loja do Museu da Marinha, em Lisboa, mas a
associação vai fazer uma reedição em português e inglês, ainda este ano.
No
âmbito das celebrações deste centenário, a Lustitânia100 está a organizar um
repositório de dados culturais e científicos sobre a travessia.
Sempre
com o objectivo de preservar a memória, a associação gostaria de contribuir
para o fortalecimento dos “laços internacionais, nomeadamente nos países da
Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) e em toda a comunidade
portuguesa” através da divulgação desta travessia que será assinalada em
Portugal, Cabo Verde e Brasil. In “Inforpress” – Cabo Verde com “Lusa”
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