Davi
Lopes conseguiu combinar duas das suas maiores paixões – ser bombeiro e
fabricante de instrumentos – utilizando destroços de incêndios e demolições de
edifícios para fazer instrumentos de cordas de alta qualidade que agora estão
em mãos de músicos como Gilberto Gil e Paulinho da Viola.
Embora
tenha começado aos 15 anos fazendo violões, violinos, cavaquinhos e bandolins
de madeira nobre e outras madeiras velhas que resgatou intactas de fogueiras,
Lopes ganhou fama inesperada no Brasil este mês após a exibição de um
documentário contando a história dos instrumentos feitos com os destroços do
incêndio que destruiu o Museu Nacional.
Tenente
do Corpo de Bombeiros do Rio de Janeiro, Lopes já fez cinco instrumentos – dois
violões, um bandolim, um cavaquinho e um violino – com os destroços do museu
mais antigo do Brasil e o de maior arquivo, que se incendiou em Setembro de
2018.
“O
plano é fazer entre 10 a 12 instrumentos. Cinco estão prontos. O objectivo é
tornar os instrumentos representativos dos diferentes ritmos musicais do
Brasil, como o cavaquinho para o samba”, disse Lopes em entrevista à EFE.
Os
instrumentos estão temporariamente nas mãos de músicos renomados que
patrocinaram a sua preparação, entre eles Gil, Da Viola, Hamilton de Holanda e
Paulinho Moska, alguns dos quais já os utilizam nos espectáculos, mas – quando
o Museu de 200 anos estiver reconstruído – todos serão exibidos lá.
Os
restos da bilheteira do Museu, que era feito de madeira de jacarandá, foram
utilizados para os violões, juntamente com os móveis e vigas de pinho da
floresta, canela amarela e outras madeiras nobres adequadas para instrumentos.
Mas
como o seu trabalho com os destroços do Museu Nacional foi transformado num
documentário pela Globonews, Lopes agora tem planos de realizar outros
projectos semelhantes a partir dos restos de um piano centenário e da madeira
da antiga Casa da Moeda.
“Tudo
começou com a história de ser músico. Comecei a estudar música muito cedo, aos
10 anos, na igreja que frequentava e aos 15 entrei numa escola de música”,
disse Lopes no apartamento de uma Vila Militar – já que os bombeiros no Brasil
têm estatuto de militar – e onde montou uma pequena, mas bem equipada oficina.
“Em
1997, entrei para o Corpo de Bombeiros e tornou-se uma paixão. Comecei a
combinar as duas paixões naquele mesmo ano, quando fui combater um incêndio e
vi que no meio dos escombros havia boas madeiras intactas”, referiu.
Lopes
disse que já tinha adquirido uma paixão pela madeira, algo que herdou da sua
família de artesãos, e isso permitiu-lhe reconhecer madeiras nobres como o
mogno nos escombros de grandes casarões que se incendiaram no Rio de Janeiro.
“Com
este conhecimento por madeiras, vi que podia fazer algo e combinar todas as
minhas paixões: música, instrumentos e trabalho de combate a incêndios. A
partir de 2000, comecei a recolher lenha de incêndios, já pensando em
instrumentos e em 2007 tive a oportunidade de fazer um curso de fabrico de
instrumentos em São Paulo onde aprendi o ofício e as técnicas”, conta.
“No
início, quando resgatei lenha dos incêndios, os outros bombeiros e até músicos
disseram-me que eu estava maluco porque essa madeira não dava para fazer
instrumentos de madeira nobre. Mas o facto é que, apesar de ter que se fazer um
enorme esforço para limpar e restaurar a madeira, no fundo ela é a mesma que é
usada pelos fabricantes de instrumentos”, explica, adiantando que “quando
comecei a mostrar os instrumentos que fiz com os destroços, os meus colegas
bombeiros começaram a apoiar-me e a trazer-me madeira que haviam encontrado”,
salientou
Lopes
admitiu que no início fazia instrumentos por hobby, mas agora fá-lo
profissionalmente e nalguns casos demora quase um mês a fazer instrumentos
especialmente encomendados por músicos pelos quais pode cobrar preços bem acima
do mercado.
Na
noite do incêndio no Museu Nacional estava de folga do trabalho, mas “desci até
ao quartel, vesti o uniforme e fui ajudar a resgatar o que pude” das ruínas.
“Naquele momento, a minha intenção era salvar os objectos (do museu), mas nesse
mesmo dia tive a ideia de fazer alguma coisa com o que restou, fazer alguns
instrumentos e vendê-los para ajudar na reconstrução do Museu”, disse.
A
publicidade resultante do documentário ajudou-o a impulsionar o seu novo
projecto: criar uma fundação onde irá oferecer aulas de música para crianças
carentes e formação a novos fabricantes de instrumentos, “uma profissão que
corre o risco de morrer”. In “Jornal Tribuna de Macau” – Macau com “Agências Internacionais”
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