Pintura Arq. Eduardo Moreira Santos, Lx (28.08.1904 - 23.04.1992)

sexta-feira, 10 de setembro de 2021

Angola - “Usurpação cultural” da rainha Ginga divide opiniões

Uma petição lançada pelo ator angolano Sílvio Nascimento, que criticou a Netflix por estar a preparar um documentário sobre a rainha Ginga, sem beneficiar Angola e “roçando a usurpação cultural”, já ultrapassou 12 mil assinaturas, mas há quem não concorde com essa queixa

Na petição que lançou através da plataforma Change.Org, o ator e produtor angolano afirma que a Netflix (plataforma de ‘streaming’) não demonstrou interesse nos conteúdos africanos PALOP, nem no filme produzido em 2013 sobre o tema (Njinga, Rainha de Angola), estando agora a preparar um documentário sem que Angola retire benefícios.

“Não está a ser filmado em Angola, nem consta equipa técnica e atores angolanos, achamos isso repugnante e roça a usurpação cultural para benefício próprio, onde contam a nossa história sob o seu ponto de vista e muitas vezes distorcendo os factos reais”, lê-se na petição, prosseguindo: “se vão contar a nossa história, que sejamos parte integrante do processo e respeitados a todos os níveis, chega de usarem a nossa identidade cultural para elevação de terceiros”. Em três dias, a petição ultrapassou as 12000 assinaturas e o tema tem gerado polémica entre os internautas nas redes sociais, havendo quem defenda a posição do ator, incluindo figuras públicas como a empresária Isabel dos Santos ou a atriz e modelo Lesliana Pereira, mas também quem o critique como o jornalista e coordenador do programa radiofónico “Conversa à Sombra da Mulemba”, Raimundo Salvador.

Em declarações à Lusa, Sílvio Nascimento sublinha que o que pretendia era chamar a atenção para a cultura angolana e para a falta de investimento na produção nacional.

“Temos uma lei do mecenato que não funciona e temos vários profissionais da área, a nível de produção que vivem à mercê da sua sorte, porque a produção nacional é desvalorizada”, afirmou, admitindo que a forma como se expressou tenha dado azo a interpretações erradas.

“A intenção não é impedir a Netflix de fazer um produto internacional, histórico, é pedir -- daí que se trate de uma petição -- que, quando se faça isso (...) porque não contar com produtores nacionais, uma vez que estamos num momento de empoderar o africano. É uma questão de inclusão”, comentou, notando que Jada Pinkett Smith, a produtora do documentário, também é afrodescendente.

Questionado sobre o porquê de considerar que se trata de uma possível usurpação cultural, respondeu que se trata de uma história narrada de forma “diferente”, por terceiros que ganham em benefício próprio: “somos gatos escaldados”.

Sílvio Nascimento defende, por outro lado, que devem ser incluídos autores, estudiosos e produtores culturais angolanos neste tipo de produções, sugerindo que o objetivo é “abrir um debate sobre o tema”, inclusive quanto à criação de quotas para profissionais de um determinado país.

Para o jornalista cultural Raimundo Salvador, a petição não faz qualquer sentido: “Quando a rainha Ginga nasceu e morreu nem havia Angola. Por outro lado, o nome da Ranha Ginga há muito ultrapassou as fronteiras de Angola”, realçou, explicando que esta é também “uma figura marcante no imaginário dos afrodescendentes das Américas”.

Raimundo Salvador salientou, por outro lado, que há vários livros de historiadores americanos sobre a rainha Ginga, perguntando se “estes também teriam de pedir uma espécie de autorização para escreverem sobre a Rainha Ginga”.

Para Raimundo Salvador, tratou-se de um ato “impulsivo e inocente” que resultou numa petição “ridícula”, pois “o documentário vai engrandecer Angola e levar uma figura angolana para o palco internacional numa plataforma como a Netflix”.

No entanto, reconheceu “mérito” em centrar a discussão no tema do investimento na produção cultural, sublinhando que é também importante falar sobre formação.

A rainha Njinga Mbande, com nome de batismo cristão de Ana de Sousa, reinou nos reinos do Dongo e da Matamba, no século XVII, e é uma das figuras históricas mais emblemáticas e acarinhadas em Angola pelo seu papel na resistência contra a presença portuguesa naquele território. In “Milénio Stadium” – Canadá com “Lusa”



Sem comentários:

Enviar um comentário