O Velho Solitário, obra com que Huwana Rubi se faz anunciar no sagrado pórtico da Literatura Moçambicana, é uma empolgante experiência estética. Trata-se da sua obra de estreia, uma obra cuja desenvoltura deixa desde logo antever ou mesmo vaticinar-lhe um brilhante percurso nas lides literárias.
Em
O Velho Solitário, Huwana Rubi, relata-nos uma história que se estrutura
à volta de Rungo, um idoso cujas vicissitudes da vida o tornam uma pessoa
amargurada. Todavia, as peripécias que caracterizam a desafortunada vida de
Rungo conhecem um desenlace absolutamente inesperado.
Ora,
a história que Huwana Rubi nos apresenta é aparentemente trivial, aparente
porque, efectivamente, o tema de infortúnio é apenas um ponto de partida, a
partir do qual a intriga se vai desdobrar em várias outras temáticas de pendor
social, histórico, cultural e até político.
Com
efeito, parece-nos bastante notável a desenvoltura com que o narrador desta
intriga, sem prejudicar a tão essencial unidade estrutural, consegue harmonizar
vários temas e criar um universo ficcional de interesse.
A
propósito do narrador, gostávamos de lhe assinalar a transparência e a
singeleza do discurso, evitando excessos esteticistas optando efectivamente por
uma linguagem, um ritmo e um tom tão cristalinos cuja textura nos remete à
oralidade.
A
tradição oral africana é uma marca constante em quase toda esta obra,
representada, entre outros elementos, pelos mitos e provérbios.
Com
a permissão da Huwana e obviamente sem levantar o “véu da noiva” ou seja sem
revelar o desfecho da história, gostávamos de acrescentar que a sorte que a
história reserva à personagem Rungo pode encontrar um paralelismo com o final
que costuma caber às personagens principais ou protagonistas das
histórias/contos da tradição oral. Efectiva e frequentemente o desfecho
daquelas narrativas assume uma dimensão moralizante, procurando exaltar valores
tais como a honestidade ou a bondade.
O
modelo da tradição oral pode ser também aplicado na análise à modelação,
percurso e destino final das outras personagens d`O Velho Solitário,
tais como o Matapa, o vilão da história.
A
nosso ver, o ritmo poético bem como as estratégias técnico-narrativas que
Huwana adopta, pelo menos n`O Velho Solitário sua obra de estreia,
põem-na a dialogar, explícita ou implicitamente, com vários outros escritores
moçambicanos, de que a Paulina Chiziane é o exemplo mais flagrante.
Como
todos devemos estar lembrados, em arte não existem obras adâmicas. Em arte,
nada vem do nada, as obras comunicam umas com as outras. Portanto, faz bem a
Huwana em apropriar-se antropofagicamente do que há de bom em sua volta em
termos de literatura.
Da
profusão de recursos estilísticos que compõem a grandiosidade desta obra, há
que destacar o ecletismo, por via do qual a Huwana vai buscar às mais áreas de
conhecimento apontamentos para reflexão, trabalhando-os e reconfigurando-os e
dai resultado um belíssimo efeito estético. Ao longo das páginas de d`O Velho
Solitário cruzamo-nos com filosofia, psicologia, teoria de arte, conhecimento
popular bem como algumas alusões ao movimento feminista.
Há,
entretanto, que ressaltar a antítese que resulta deste recurso ao ecletismo,
pois se por um lado ela reconhece a importância de um saber mais cosmopolita,
por outro ela, através do seu narrador, instaura um debate sobre a relação,
dialéctica, entre a cultura universal e a cultura africana, um debate que é,
aliás, apanágio da literatura moçambicana.
Ora,
O Velho Solitário é uma estreia notável e, como já referimos, abre uma
boa perspectiva em relação à mais nova escritora moçambicana, Huwana Rubi!
Estamos convictos que o tempo tratará de o confirmar o mais urgentemente
possível.
Ainda
bem que assim é, pois julgamos que esta opção, consciente ou irreflectida, pela
continuidade literária, pelo dialogismo enriquece o fazer literário.
Em
surdina, gostávamos de referir que às imprecisões, havendo-as, próprias de um
livro de estreia, sobrepõe-se a força, a coragem, a criatividade e a
originalidade da poética da Huwana.
Por fim, gostava de desejar uma óptima leitura e que dela resultem muitos e bons debates. Que depois d`O Velho Solitário venham muitos mais livros da Huwana. Fernando Manhiça – Moçambique in “O País”
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Huwana Rubí
nasceu a 20 de Setembro de 1989, na província de Inhambane. É artista plástica,
poetisa e decoradora de interiores. Aprendeu a arte de pintar quando decidiu
dar cor a sua poesia, tendo inicialmente desenvolvido a técnica de desenho, com
os artistas plásticos Chana de Sá e Azevedo Manhaua, na casa provincial da
Cultura de Inhambane, em 2008. Doravante dentro da sua contemporaneidade a
nível nacional tem tido como os seus principais mentores M. Idasse Tembe,
Newton Johaneth, A.m.Costa, Jorge Dias e artista plástico Butcheca, e é por
meio destes que vem consolidando a sua pintura. Já conta com 4 exposições individuais
e dezenas de exposições coletivas.
As
representações de figuras humanas e objectos, formas geométricas, linhas e
planos, cores puras e complementares, obter desta, composições que nos trazem o
discurso da representatividade simbólica e abstrata. Huwana Rubí vai ao
encontro do cubismo de Braque, do abstracionismo de Kandinsky, do Fauvismo de
Matisse procurando sempre caminhos alternativos que carregam consigo sua
identidade cultural. “O velho solitário” - Alcance Editores
2022.
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