Escreve romance, poesia e literatura infantil e esteve recentemente em Luanda para apresentar o seu mais recente livro às crianças angolanas. O autor de "Abecedário que se fingiu de mudo" tem mais cinco livros na calha
O "Abecedário que se fingiu de mudo" é o título
do livro que traz para as crianças angolanas. Que conteúdos sugere o livro e,
por quê esse título?
Acreditamos
que é um título sugestivo para as crianças. Na verdade, tenho feito assim em
todos os meus livros, faço o exercício de trazer livros impactantes. Primeiro
pelo título e depois pelo conteúdo, sendo o mais essencial. O "Abecedário
que se fingiu de mudo" é um livro infantil que traz várias questões que
nós temos presenciado no nosso dia-a-dia. Porque percebo que ultimamente
tendemos a distanciar-nos um dos outros. Nós já não temos aquele amor ao
próximo. Há muita falta de empatia, muita desigualdade social. E são questões
que me inquietam e, por isso, resolvi trazer isso em forma de livro infantil,
como forma de educar as crianças, de lhes mostrar que eles se devem pautar por
um caminho mais justo.
Trouxe para Luanda quantos livros?
Tinha
pouquíssimos livros, porque tivemos um atraso técnico por parte da editora.
Infelizmente não pude fazer a distribuição que gostaria. Tivemos muitos
leitores no dia do lançamento. Foi um evento maravilhoso. Mas espero
oportunamente poder trazer alguns livros para comercializar.
Porque escolheu Angola para trazer o seu livro?
Moçambique
e Angola são países irmãos, porque têm uma relação de irmandade. Ambos se
interligam por causa da cultura, da história. Penso que os dois países vivem
momentos iguais, fazendo assim uma comparação mais profunda. E resolvi trazer o
livro, primeiro, porque também fazia parte dos meus objectivos conhecer Luanda
e Angola, assim como conhecer o povo, as suas falas, a sua língua. Também
trouxe esta obra para mostrar aquilo que escrevo, para mostrar aquilo que é a
minha temática, para incentivar as crianças angolanas a terem o hábito da
leitura e do gosto pelo livro.
Acha que as crianças angolanas conseguem rever-se nesta
obra?
Tento
fazer o máximo possível em todos os meus livros. Primeiro, trazendo uma
linguagem mais simples, conteúdos que envolvam quase todos os países de África.
Na minha temática, tento falar sobre questões diárias do povo africano em
geral, não somente de Moçambique. E essa questão, esse conceito faz com que os
meus livros sejam mais abrangentes.
O facto de os livros esgotarem e terem mais pessoas
interessadas em comprar significa alguma coisa para si?
Alguma
tristeza por não poder corresponder às expectativas das pessoas. Digo com muita
tristeza porque as pessoas estavam lá com muita vontade de ter o livro.
Infelizmente, alguns tiveram o livro, outros não tiveram. Por outro lado,
mostra que as crianças começam a ter interesse em ler. Penso que há uma
preocupação dos pais em querer mostrar o lado bom da escrita ou do livro, que é
algo muito carente. Por exemplo, em Moçambique são poucos os escritores que
escrevem para as crianças e esse é um dos objectivos que me levou também a
imergir na literatura infantil.
Não há valorização do livro infantil?
Ainda
não há muita valorização da literatura infantil, no verdadeiro sentido, como
gostaria. Então é mais um motivo para escrever, para mostrar que os livros
também podem educar, os livros também podem fazer a criança ter um vocabulário
diferente.
Acha que em Angola também há poucos escritores para as
crianças?
Bem,
nas conversas que tive durante a minha estadia aqui percebi que ambos os países
passam pelas mesmas dificuldades. Penso que há poucos escritores que apostam na
literatura infantil. Não dão muito valor, ainda inferiorizam este lado
infantil. Mas esquecem-se de que "é de pequenino que se torce o
pepino", como temos aprendido.
Tem a ver com os preços dos livros?
Eu,
particularmente, vendo os meus livros mesmo a um preço promocional, agradável.
Aqui em Angola vendi a 3000 Kz. Penso é um preço justo que cada um pode
adquirir.
Em países onde as pessoas estão preocupadas em trabalhar
para comprar pão, o livro não é prioridade.
Realmente,
é algo que tenho tentado combater, porque além de escrever, também costumo
fazer palestras nas escolas da minha cidade, Maputo. Trabalho com algumas
escolas, principalmente as públicas, onde os pais têm dificuldades, eles não
conseguem comprar livros. Tenho um clube de leitura, onde por cada
fim-de-semana eu levo as crianças num parque, num jardim, para ler, para
aprender a construir uma história. E isso é um trabalho muito importante, muito
aplaudido em Maputo.
Disse que há poucos escritores para crianças. Como é que
se incentiva a escrever para crianças?
Primeiro
o escritor deve criar acções que possam estimular, e atrair as crianças,
principalmente, a gostarem de ler. Digo que deveria ser obrigatório todo o
escritor escrever um livro para crianças. Acho que se fizéssemos isso, ou
partíssemos desse conceito, já teríamos muitos livros para crianças e já
teríamos muitas com esse despertar de ler. Então, penso que os escritores devem
escrever, devem fazer parcerias com as escolas, devem fazer parcerias com os
ministérios que lidam com a educação, com a cultura, para a promoção desses
livros. Telma Van-Dúnem – Angola in “Expansão”
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