O ato de partilha “mais generoso” na busca de Camões foi “a Língua portuguesa”, que o poeta aperfeiçoou, afirmou neste 10 Junho a comissária das comemorações do 500.º aniversário do nascimento do autor d’”Os Lusíadas”
“Talvez
o ato de partilha mais generoso dessa busca de Luís de Camões e do Portugal do
seu tempo tenha sido a Língua portuguesa, a Língua que o poeta modelou e
aperfeiçoou em versos de rara fineza”, afirmou Rita Marnoto, a comissária da
estrutura de missão responsável pelas comemorações do quinto centenário do
nascimento de Luís de Camões.
A
também professora catedrática da Universidade de Coimbra discursava na Sala dos
Capelos da Universidade de Coimbra, na cerimónia de arranque das comemorações
do quinto centenário do nascimento de Camões, iniciativa que integra o programa
oficial do 10 de Junho.
Perante
uma plateia onde estavam o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, o
presidente da Assembleia da República, José Aguiar-Branco, e o
primeiro-ministro, Luís Montenegro, Rita Marnoto realçou a projeção da obra de
Camões, quer no tempo quer no espaço, colocando o poeta no “patamar dos
clássicos”, dos grandes autores “capazes de surpreender o seu próprio tempo e
de continuar a questionar e a inquietar, ao caso, cinco séculos de história,
até hoje”.
No
seu discurso, a catedrática destacou também a forma como o Oceano Atlântico
passou a ser navegado, ao longo de cinco séculos, “através da língua
portuguesa”, através de viagens de poetas, nomeadamente de Camões.
No
entanto, Rita Marnoto, não esqueceu que essas viagens de “experiência
conhecimento” naquele oceano, foram também “viagens trágicas de negreiros, de
tráfico humano e de corso, de deportação e de sofrimento”.
“Viagens
de ‘morabeza’ [regionalismo do crioulo cabo-verdiano associado a amabilidade] e
de saudade, em que a chegada nunca corta as amarras da partida”, acrescentou.
Na
sua intervenção, a comissária realçou ainda a forma como Camões era um “ser
insatisfeito”, que indagava pelos “meandros da intimidade, entre sonhos e
desilusões” e que se destacava por refletir sobre o confronto “entre opostos ou
a errância”.
Rita
Marnoto notou também a forma como o poeta contamina a tradição literária, seja
quando põe “uma mulher, Vénus” a achar a frota de Vasco da Gama, no final da
sua viagem, ou quando põe em causa a ideia de beleza, tradicionalmente assente
numa mulher “loura e com pele clara”.
“Os
cabelos escuros de Bárbora e a sua pretidão são inconciliáveis com o padrão
literário”, referiu a especialista, considerando que, o fascínio de Camões é
tal, que o leva a “operar uma inversão do ideal de beleza”.
“Os
seus cabelos pretos são tão belos, que há que rever a opinião que dá primazia
aos louros, e a cor da sua pele faz com que seja a neve a querer mudar de cor”,
notou.
Antes
da comissária, discursou o reitor da Universidade de Coimbra, Amílcar Falcão
que salientou a ligação que o poeta terá tido com a cidade, que é “uma forte
candidata a ser reconhecida como lugar de formação do maior poeta de língua
portuguesa”.
Na
sua intervenção, Amílcar Falcão considerou que “a pátria de Camões não era
tanto o Portugal real, mas o Portugal sonhado”.
“O
Portugal tornado mundo na ilha dos amores. Nessa ilha sem tempo e sem lugar,
onde apenas conseguem chegar os que superam os medos e se superam a si
próprios”, vincou.
Também
o reitor da Universidade de Coimbra destacou a “causa da língua portuguesa”
como uma das causas que o poeta serviu, sublinhando que uma das grandes tónicas
da obra de Camões foi “a busca do conhecimento, e a certeza de que essa será
sempre uma busca inacabada”.
Comemorações
As
comemorações do V centenário do nascimento de Luís de Camões arrancam
oficialmente neste dia 10, dia em que se assinala também o aniversário da sua
morte, estando prevista uma programação que se estenderá até 10 de junho de
2026.
Do
programa das comemorações, comissariado pela professora, investigadora e
especialista na obra de Luís de Camões Rita Marnoto, fazem parte espetáculos
para teatro e cinema, iniciativas de comunicação através das redes digitais,
programas para televisão e exposições.
Estão
também previstas publicações especiais, um concurso escolar para professores e
alunos, bem como ações de formação, segundo a programação apresentada pelo
Ministério da Cultura na passada quarta-feira.
Entre
as iniciativas para teatro e cinema, contam-se a representação da comédia
“Filodemo”, em parceria com o Teatro Nacional D. Maria II, a elaboração de um
breve filme de animação sobre a vida de Camões para os primeiros ciclos do
ensino básico, e contratação de peças sobre o mesmo tema para apresentar em
escolas.
Está
prevista igualmente a realização de um ciclo de debates na Cinemateca
Portuguesa sobre Camões, que terão por base os encontros da Biblioteca Nacional
de Portugal e a colaboração com o Instituto do Cinema e do Audiovisual.
No
âmbito da televisão, serão estabelecidas parcerias para leitura regular de
poemas de Camões, será criado um programa em parceria com a RTP2 sobre o poeta
e um documentário sobre a iconografia camoniana.
Será
organizada uma grande exposição na Biblioteca Nacional de Portugal, intitulada
“Revisitar Camões”, e exposições bibliográficas, uma itinerante para as escolas
do 2.º e 3.º ciclos dos ensinos básico e secundário, e outra em parceria com o
Instituto Camões, que percorrerá Goa, Macau, a Ilha de Moçambique e outros
pontos do mundo onde se ensina a língua portuguesa.
No
que respeita a publicações, há um plano especial de edições que inclui a
reedição de livros e a publicação de inéditos, pela Biblioteca Nacional de
Portugal, em parceria com a Imprensa Nacional Casa da Moeda.
As
redes digitais vão desempenhar também um papel importante nestas celebrações,
com a criação de uma plataforma de informação e acesso a conteúdos camonianos,
a elaboração de um audiolivro de “Os Lusíadas” e da “Lírica de Camões” para
distribuir pela rede escolar, em ficheiro de acesso livre, e a produção de uma
série de 12 ‘podcasts’ sobre Camões, tendo cada episódio um convidado
diferente. In “Mundo Lusíada” – Brasil com “Lusa”
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