O Festival Literário Internacional de Araxá (Fliaraxá) começou esta quarta-feira, 1 de outubro, em Minas Gerais, Brasil, e prolonga-se até ao dia 5, no Teatro CBMM do Centro Cultural Uniaraxá. Na sua 13.ª edição, o evento gratuito e transmitido online reúne mais de uma centena de escritores nacionais e internacionais em torno do tema “Literatura, Encruzilhada e Memória”.
Entre
os homenageados estão o escritor baiano Itamar Vieira Junior e a ruandesa
Scholastique Mukasonga, que marca presença como figura central da programação.
A autora, radicada em França, traz para o encontro a reflexão sobre o “dever da
memória”, elemento que atravessa a sua obra marcada pelo genocídio em Ruanda.
Em
entrevista à nossa reportagem, Mukasonga sublinhou o calor “humano e sincero”
do público brasileiro.
“Fliaraxá
é uma nova descoberta, e não termina aqui, o Brasil é um continente. Vou ao
encontro de um novo público e reencontrar Afonso Borges, o meu anjo da guarda.
Tive o prazer de o conhecer em Petrópolis, no festival do livro. Fui recebida
de forma muito calorosa. Essa primeira experiência sob a égide de Afonso e da
sua equipa foi um sucesso. Ele cumpriu a promessa de nos rever. É a mesma
equipa que me espera para o Fliaraxá. Conheço o calor, tão humano e sincero,
dos brasileiros. Vou, portanto, confiante, ao encontro de novas leitoras e
novos leitores que, estou certa, serão muitos”, disse esta autora.
Portugueses marcarão presença em palco
Além
de Mukasonga, a nova edição do Fliaraxá contará com a participação da
portuguesa Rute Simões Ribeiro, cujo percurso literário tem explorado dilemas
existenciais e éticos.
“Participo
no Fliaraxá com a grande alegria de encontrar os meus pares na expressão
literária livre, na insistência pelo encantamento que a literatura permite.
Fico imensamente feliz por poder estar, durante estes dias, imersa na atmosfera
particular destes festivais do incrível Afonso Borges, abundantes na esperança,
na permanência, na comunhão. E por, de algum modo, fazer parte da grande
construção, e que são as pequenas revoluções que vamos fazer nas crianças que,
durante o festival, terão contacto com livros, escritores e pensadores”,
reforçou a escritora, que revelou os avanços esperados que festivais como o
Fliaraxá podem promover no universo da literatura lusófona.
“A literatura é sempre uma forma de pensar um país”
“Festivais
como o Fliaraxá sedimentam o curso da arte, cavam possibilidades de
resistência. A língua portuguesa, partilhada por tantos, é potenciada no
convívio das suas imensas possibilidades. As trocas entre quem se pensa e pensa
o outro são galvanizadas num ambiente fraterno e livre, e isso só beneficia a
criação literária. A literatura contemporânea mantém-se lúcida, afiada,
humanizada”, afirmou.
A
escritora portuguesa nascida em Coimbra e doutorada em Saúde Pública, se
afirmou no panorama literário com títulos como Ensaio sobre o Dever, A
Alegria de Ser Miserável e Do Corpo o Homem, obra distinguida em
2023 com o Prémio Literário Hugo Santos. A sua escrita, marcada por reflexões
existenciais e éticas, dialoga diretamente com o tema do Fliaraxá ao propor uma
literatura comprometida com a responsabilidade da palavra e com os dilemas
humanos.
Na
opinião da escritora luso-brasileira Tatiana Salem Levy, que se destaca pela
narrativa construída a partir da memória familiar e da experiência do exílio,
integrar a programação do festival é uma forma de estar em contacto direto com
os leitores.
“Como
eu não moro no Brasil, festivais como o Fliaraxá são, para mim, uma grande
oportunidade de entrar em contacto direto com os leitores. Além disso, é a
ocasião de estar com grandes amigos escritores, a quem admiro muito. Então tem
um aspeto de trabalho, de falar daquilo que faço, dialogar com o público e com
outros escritores, mas também um grande componente festivo. Eu adoro ambiente
de festival literário”, comentou Tatiana Levy, que valoriza a defesa do
universo lusófono.
“Afonso
Borges fez há muito tempo essa sábia opção pela lusofonia, em colocar autores
dos diferentes países lusófonos dialogando. Isso nos leva não só a quebrar
preconceitos, mas também a pensar o presente e o futuro dessas nações. A
literatura é sempre uma forma de pensar um país, e, no Fliaraxá, podemos pensar
uma comunidade”, confirmou.
Tatiana
Salem Levy, nascida em Lisboa em 1979 durante o exílio da sua família e
regressada ao Brasil ainda criança, é autora de obras como A Chave de Casa,
livro premiado em 2008 com o Prémio São Paulo de Literatura, constrói uma
narrativa profundamente marcada pela memória familiar, pelo exílio e pelo
trânsito entre culturas. A sua participação reforça o carácter plural do
festival, entrelaçando raízes portuguesas, brasileiras e judaico-turcas.
“Ao
reunir autores como Scholastique Mukasonga, Rute Simões Ribeiro e Tatiana Salem
Levy, o evento sublinha também a sua vertente internacional e o compromisso em
refletir sobre a memória e os caminhos éticos que a humanidade deve trilhar”,
finalizou Afonso Borges, idealizador do festival.
O
evento, viabilizado pela Lei Rouanet e patrocinado por instituições como Itaú e
CBMM, consolida-se como um dos maiores encontros literários do Brasil. Ígor
Lopes – Brasil in “Mundo Lusíada”
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