O cancro é a segunda principal causa de morte no mundo e continua a desafiar os sistemas de saúde. Os tratamentos convencionais — como quimioterapia, radioterapia e cirurgia — enfrentam limitações, incluindo baixa eficácia, resistência e efeitos adversos, enquanto alternativas como imunoterapia e terapias direcionadas são caras e nem sempre acessíveis.
É
nesse sentido que um estudo, desenvolvido por uma equipa da Faculdade de
Engenharia da Universidade do Porto (FEUP) e da norte-americana The University
of Texas at Austin (UT Austin), e recentemente publicado na conceituada revista
American Chemical Society (ACS Nano), poderá
abrir caminho a novas abordagens na terapia do cancro.
Através
de uma terapia fototérmica (PTT), que utiliza nanomateriais capazes de
transformar luz em calor para destruir células tumorais de forma localizada e
seletiva, os investigadores exploraram o potencial da transformação de pó de
dissulfeto de estanho (SnS₂) em nanoflocos de óxido
de estanho (SnOx), que têm uma propriedade chave: absorvem luz no infravermelho
próximo (NIR) e transformam essa energia em calor (efeito fototérmico), gerando
um aquecimento localizado.
Os
nanoflocos atuam como “nano-aquecedores” seletivos dentro do meio celular, e
quando iluminados por esta luz, invisível ao olho humano e que consegue
atravessar a pele e os tecidos, aquecem e destroem as células cancerígenas,
poupando as saudáveis.
Em
apenas 30 minutos de exposição, esse calor é suficiente para matar células
cancerígenas (que são mais sensíveis ao stress térmico), ao passo que as
células saudáveis mostraram ser menos afetadas, revelando a seletividade do
tratamento, graças à penetração, de forma eficiente nos tecidos biológicos, da
luz NIR.
Sucesso no combate ao cancro do cólon e da pele
Entre
os tipos de cancro mais impactantes, o cancro colorretal destaca-se como uma
das principais causas de mortes relacionadas ao cancro, enquanto o cancro de
pele é um dos cancros mais frequentemente diagnosticados em todo o mundo.
O
número de novos casos de cancro tem aumentado consistentemente e as projeções
sugerem que poderá ultrapassar os 35 milhões até 2050, representando um aumento
de 70% em comparação com os níveis atuais, algo que esta investigação pretende
mitigar.
Os
testes celulares in vitro com os nanoflocos de SnOx mostraram
biocompatibilidade e um efeito anticancerígeno contra duas linhas celulares de
cancro SW837 e A431, responsáveis, respetivamente, pelo aparecimento dos
cancros do cólon e da pele, não afetando as células saudáveis (HFF-1).
Os
benefícios biomédicos deste procedimento são significativos: esta terapia
fototérmica não envolve químicos tóxicos como na quimioterapia, e o seu efeito
localizado e controlável, aliado ao uso de nanoflocos de SnOx, melhora bastante
a eficiência graças à conversão de luz em calor de forma muito eficaz.
Ao
contrário dos lasers tradicionalmente usados em terapias fototérmicas, que são
caros, complexos e com riscos acrescidos para os tecidos saudáveis, os LEDs
oferecem uma alternativa muito mais acessível, segura e portátil. Esta
simplicidade poderá abrir caminho a tratamentos fora do ambiente hospitalar e
em países onde o acesso a tecnologias médicas avançadas é limitado.
Colaboração transatlântica
Este
trabalho resulta da colaboração de longa duração entre Artur Moreira Pinto,
investigador da unidade de investigação LEPABE
/ ALiCE da FEUP, e Jean Anne C.
Incorvia, professora associada de Engenharia Eletrotécnica e Informática na UT
Austin, no âmbito do programa UT Austin Portugal, uma parceria entre a Fundação
para a Ciência e Tecnologia (FCT)
e a The University of Texas at Austin.
Para
Artur Moreira Pinto, os frutos desta investigação pretendem criar opções mais
sustentáveis, seguras e orientadas para os doentes. “Mostrámos que é possível
combinar nanomateriais com LEDs para obter uma fototerapia eficaz e seletiva
contra células tumorais. Os LEDs, ao contrário dos lasers, são mais seguros,
baratos e de pequenas dimensões”.
“Para
além dos ensaios in vitro com SnOx, já alcançámos resultados promissores com
outro nanomaterial, o grafeno, em modelos mais complexos e desenvolvemos
dispositivos capazes de administrar a terapia em tumores. O nosso objetivo é
continuar a desenvolver abordagens mais acessíveis e seguras, contribuindo para
terapias mais eficazes e com menor risco de recorrência”, afirma o investigador
da FEUP e coordenador do projeto em Portugal.
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