O
projeto DNA do Brasil, liderado por uma cientista brasileira, vai identificar
as principais características genéticas dos brasileiros para que seja possível
prevenir e tratar doenças, além de mapear os ancestrais da população. A
iniciativa é o primeiro projeto de sequenciamento de DNA em larga escala no
país e vai inserir o Brasil no mapa mundial dos estudos genômicos.
“Nosso
projeto quer fazer um panorama geral da população brasileira como um todo, com
um número grande de brasileiros para que a gente possa fazer pesquisas mais
aprofundadas tanto sobre a saúde, a genética da nossa saúde, quanto também
sobre a nossa origem, de como a gente se formou a partir desses grupos
populacionais originais” disse a professora Lygia da Veiga Pereira, da Universidade
de São Paulo (USP), que lidera o projeto, sobre os dois eixos do estudo
genômico. Até o momento, menos de 0,5% das pesquisas realizadas no mundo
contemplaram a população brasileira.
No
que diz respeito à saúde, Lygia explicou que o sequenciamento do DNA dos
brasileiros vai possibilitar “entender quais são as variações genéticas que
estão associadas ao nosso risco de desenvolver doenças comuns. O grande desafio
da genética do século XXI é entender a genética da predisposição para doenças
como diabetes, doença cardiovascular, Alzheimer, asma, depressão, que são
doenças comuns. A gente não conhece bem a genética dessas doenças porque é
complexa, ela é o resultado de centenas de alterações genéticas, mais o meio
ambiente”, explicou Lygia.
Por
meio do projeto, será possível identificar genes associados a doenças e genes
associados a características morfológicas – que se referem à forma do
organismo. Além da detecção da doença, a interpretação dos testes genéticos vai
permitir, segundo a pesquisadora, identificar a predisposição às doenças,
respostas a medicamentos e levar ao desenvolvimento de novas terapias.
Banco de dados público
Além
de desvendar as características do DNA dos brasileiros, o projeto também tem o
objetivo de montar um banco público com dados genéticos da população brasileira
que ficará disponível para pesquisadores de todo o mundo que tenham interesse
em estudos da genética da população do Brasil. “Esse banco de dados vai poder
ser explorado e garimpado para a gente fazer muita descoberta, tanto do ponto
de vista de saúde, como de evolução e até histórico”, disse.
O
projeto pretende mapear o genoma de 15 mil pessoas, com idades entre 35 e 74
anos, que já integram a amostra do Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto
(Elsa), a maior pesquisa epidemiológica do país, financiada pelo Ministério da
Saúde e Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações. O Elsa abrange
moradores dos estados da Bahia, de Minas Gerais, do Espírito Santo, Rio de
Janeiro, de São Paulo e do Rio Grande do Sul.
Essas
15 mil pessoas têm sido acompanhadas clinicamente desde 2008 e agora as
informações genéticas serão agregadas a esse banco de dados, conforme elas
forem assinando o termo de consentimento para participação desse novo projeto.
O sigilo delas está garantido, segundo Lygia.
“Existe
uma série de mecanismos para gente poder trabalhar com esses dados, mas de
forma absolutamente anônima. A gente precisa ter segurança sobre a privacidade
das pessoas e ao mesmo tempo poder usar esses dados para poder fazer
descobertas, descobertas que vão impactar a saúde do brasileiro”, disse ela.
Para
o professor Paulo Lotufo, da Faculdade de Medicina da USP e que está à frente
do Elsa em São Paulo, “o projeto permitiu destacar as doenças cardiovasculares
e diabetes na agenda da pesquisa epidemiológica no país. E, esse novo passo a
ser dado com o DNA do Brasil nos permitirá contribuir ainda mais para a saúde
da população”.
Primeira etapa
Os
recursos para sequenciar o genoma completo dos primeiros três mil brasileiros –
que correspondem à primeira etapa do projeto – foram garantidos pela empresa
Dasa. Nossa reportagem visitou o Centro de Diagnósticos em Genômica da empresa,
na capital paulista, onde serão feitos os sequenciamentos.
“Atualmente
a gente consegue fazer o processamento de cerca de 40 genomas completos a cada
dois ou três dias, é uma alta capacidade que vai permitir que a gente sequencie
as primeiras três mil amostras em seis meses e depois completar todas as 15 mil
em até dois anos”, disse Gustavo Campana, diretor-médico da Dasa.
Campana
explicou que, com a evolução da tecnologia, houve uma queda no custo de
sequenciamento de um genoma completo. “Por exemplo, no projeto Genoma Humano
[na década de 1990], um único genoma demorou 13 anos e custou mais de R$ 3
bilhões. Hoje nós conseguimos sequenciar um genoma em torno de 36 a 48 horas
por cerca de US$ 1 mil”.
Para
o sequenciamento dos 12 mil genomas restante, há uma proposta em andamento que
depende da captação de recursos pelo projeto. O diretor da Dasa contou que,
apesar de os valores das negociações serem confidenciais, a empresa tem uma
proposta para realizar o restante do sequenciamento em valor abaixo do que
havia sido proposto por outros laboratórios. Uma das propostas chegou a orçar
em US$ 650 dólares cada genoma completo sequenciado.
Além
da Dasa, outras empresas privadas estão envolvidas para realização do projeto:
a Illumina, que vai fornecer os insumos para o sequenciamento; e a Google
Cloud, que vai processar os dados de sequenciamento em sua nuvem, permitindo
análises e cruzamento de dados em escala.
Após
a conclusão dos primeiros 3 mil genomas, no prazo previsto de seis meses, o
banco de dados já estará disponível para uso pelos pesquisadores. “A gente vai
saber exatamente aquela população que tem alto risco de diabetes, por exemplo,
ou alto risco de enfartar, então você pode fazer terapêuticas mais precoces e
faz prevenção e até alteração de hábitos de vida. Então na vida de um
indivíduo, no futuro, isso vai ter um impacto muito grande para deixar as
pessoas mais saudáveis e não desenvolver as doenças crônicas”, finalizou
Campana. In “Mundo Lusíada” – Brasil com “EBC”
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