O Prémio Gulbenkian para a Humanidade deste ano realça a diversidade de soluções no âmbito da agricultura sustentável e distingue pessoas e organizações que contribuem para a segurança alimentar, resiliência climática e proteção dos ecossistemas a nível global. Os vencedores são pioneiros da agricultura sustentável da Índia, Egipto e EUA
O
programa Andhra Pradesh Community Managed Natural Farming (Índia), o Professor
Rattan Lal (EUA/Índia) e a plataforma de ONG SEKEM (Egipto) são os vencedores
do Prémio Gulbenkian para a Humanidade 2024, pela sua contribuição para a
segurança alimentar global, a resiliência climática e a proteção dos
ecossistemas.
O
júri, presidido pela antiga chanceler alemã Angela Merkel, selecionou estas
três entidades como reconhecimento da importância da complementaridade do seu
trabalho e da necessidade de conciliar a investigação científica com aplicações
práticas na área da agricultura sustentável.
Os
três vencedores foram selecionados, de entre 181 candidaturas de 117
nacionalidades (o maior número de sempre de nomeações e distribuição
geográfica), pelas suas abordagens distintas à agricultura sustentável – a
agricultura biodinâmica, natural e regenerativa – as quais têm sido
implementadas com sucesso em diversas regiões com condições climáticas
adversas, demonstrando como a agricultura sustentável beneficia as comunidades,
os agricultores, as economias e o planeta.
Com
esta escolha, o Prémio Gulbenkian para Humanidade 2024 vem sublinhar como os
desafios climáticos são interdependentes e conduzem a crises sistémicas
interligadas. As alterações climáticas estão a agravar a perda de
biodiversidade, a ocorrência de fenómenos climáticos extremos e a degradação
dos recursos, perturbando os sistemas alimentares e a saúde humana, a nível
mundial. Simultaneamente, a agricultura contribui significativamente para as
alterações climáticas através das emissões de carbono, da degradação dos solos
e dos recursos hídricos, e da perda de biodiversidade.
Os Vencedores
Andhra
Pradesh Community Managed Natural Farming (Índia) é um programa que apoia
pequenos agricultores, sobretudo mulheres, na transição para uma agricultura
natural; Rattan Lal (EUA/Índia) é um cientista pioneiro na abordagem à
agricultura centrada no solo; e SEKEM (Egipto), uma organização com trabalho no
domínio da agricultura biodinâmica, é distinguida em particular pela sua
emblemática iniciativa Associação Biodinâmica Egípcia, uma rede que apoia os
agricultores na transição para práticas agrícolas regenerativas.
Os
três vencedores vão partilhar o Prémio, no valor de 1 milhão de euros, a fim de
expandirem o seu trabalho em prol de sistemas alimentares mais seguros e
sustentáveis.
O
programa Andhra Pradesh Community Managed Natural Farming (APCNF) apoia
pequenos agricultores na transição de uma agricultura intensiva, com recurso a
substâncias químicas, para uma “agricultura natural”, através de técnicas como
utilizar resíduos orgânicos e não lavrar a terra para melhorar a saúde do solo,
reintrodução de sementes autóctones e diversificação de culturas, incluindo
árvores. O programa foi lançado, em 2016, pelo Governo de Andhra Pradesh, um
estado na costa sudeste da Índia, de forma a criar respostas sustentáveis às
preocupações dos agricultores com as crises económicas e as alterações
climáticas.
Implementado
pela organização sem fins lucrativos Rythu Sadhikara Samstha (RySS) (Farmers
Empowerment Cooperation), o APCNF é o maior programa de agroecologia do mundo,
envolvendo mais de um milhão de pequenos agricultores, sobretudo mulheres, em
500.000 hectares na
região de Andhra Pradesh. Logo na primeira fase de transição, este programa
permite aos agricultores um aumento na produtividade das colheitas, bem como
melhores rendimentos e vantagens para a saúde. Gera ainda benefícios ambientais
e sociais ao sequestrar mais carbono no solo, reverter a degradação do solo,
reduzir a sua temperatura e aumentar a biodiversidade. O sucesso do programa
assenta em quatro pilares: implementação baseada numa rede consolidada de
coletivos de mulheres; aprendizagem interpares através de “Agricultores
Mentores”; tecnologia evolutiva; e ser uma iniciativa apoiada pelo estado.
Este
modelo está a ser incubado em 12 estados da Índia e será introduzido, ainda
este ano, em cinco outros países do Sul Global, adaptado aos contextos locais.
Rattan Lal, natural
da Índia e Professor de Ciência dos Solos na Universidade de Ohio, nos Estados
Unidos, é um cientista de prestígio mundial, precursor de uma abordagem
centrada no solo, que harmoniza a produção alimentar com a preservação
ecológica e a mitigação das alterações climáticas. As suas metodologias têm
demonstrado, a nível global, a interligação entre a saúde dos solos e o
bem-estar ambiental e humano, bem como a importância de promover a segurança
alimentar, em paralelo com a conservação dos recursos naturais. Ao promover a
investigação e a educação em prol da gestão sustentável dos solos, Rattan Lal
tem contribuído para o desenvolvimento do conhecimento na área da agricultura
sustentável e da resiliência climática.
SEKEM é uma
plataforma de ONG e empresas que promovem abordagens holísticas no combate às
alterações climáticas. Criada há quase 50 anos numa região desértica do Egipto,
SEKEM focou-se, desde o início, na agricultura biodinâmica, regenerando solo
árido com o envolvimento da comunidade local. O seu trabalho no domínio da
alimentação e da agricultura promove as práticas regenerativas e destaca os
benefícios conexos de soluções baseadas na natureza, tanto para o solo como
para as comunidades.
A
principal iniciativa de SEKEM no âmbito da agricultura regenerativa é a
Associação Biodinâmica Egípcia (EBDA), a maior associação de agricultores
independentes do Egipto, que dá apoio na transição de modelos agrícolas
convencionais para modelos agrícolas regenerativos, o que, por sua vez, promove
o desenvolvimento rural. Até à data, a EBDA apoiou cerca de 10.000 agricultores e
converteu mais de 40.000
hectares de terra.
Sistemas alimentares sustentáveis e a resiliência
climática
Para
Angela Merkel, Presidente do Júri, “O acesso a uma alimentação de elevada
qualidade nutricional é de importância vital para todos. As alterações
climáticas, e o aquecimento global que daí resulta, provocaram um aumento de
fenómenos climáticos extremos e põem em perigo a segurança alimentar global.
Esta situação implica um desafio adicional a todos os que se dedicam ao setor
agrícola. Os vencedores deste ano demonstraram, de forma exemplar, como, na
prática, os sistemas alimentares sustentáveis podem contribuir para a
resiliência climática.”
A
alimentação é fundamental para os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável
(ODS), a agenda de desenvolvimento das Nações Unidas para o século XXI. O
segundo dos 17 ODS tem como objetivo “erradicar a fome, alcançar a segurança
alimentar, melhorar a nutrição e promover a agricultura sustentável.” Para
atingir este objetivo até à data prevista de 2030, é necessária colaboração
internacional, com vista à transformação sustentável do sistema alimentar e
agrícola a nível global.
António
Feijó, Presidente do Conselho de Administração da Fundação Calouste Gulbenkian,
afirma: “Queremos distinguir os vencedores deste prémio pelo seu trabalho
pioneiro no domínio da agricultura sustentável e pelas soluções inovadoras para
a segurança alimentar, resiliência face às alterações climáticas e proteção dos
ecossistemas a nível global. Cada um dos premiados demonstrou um grande empenho
na transformação das práticas agrícolas, provando que os modelos sustentáveis
podem prosperar em ambientes desafiantes e diversos. O seu trabalho demonstra
os benefícios da agricultura sustentável para as comunidades e para o planeta.
Acreditamos que as suas histórias irão inspirar outros a implementar abordagens
semelhantes noutras regiões do mundo e a construir um futuro sustentável para
todos.”
Sobre o Prémio Gulbenkian para a Humanidade
O Prémio Gulbenkian para a Humanidade
é uma iniciativa da Fundação Calouste Gulbenkian e distingue indivíduos e
organizações que contribuem com o seu exemplo e liderança para enfrentar o
maior desafio atual da humanidade: as alterações climáticas e destruição da
natureza. No valor de um milhão de euros, reconhece contribuições excecionais
para a ação climática e soluções que inspiram esperança e novas possibilidades.
Este
é o quinto ano em que o prémio é atribuído. Em 2020, foi atribuído a Greta
Thunberg; em 2021, foi entregue ao Pacto Global de Autarcas para o Clima e a
Energia; em 2022, foi atribuído
conjuntamente ao Painel Intergovernamental sobre as Alterações Climáticas
(IPCC) e à Plataforma Intergovernamental Científica e Política sobre a
Biodiversidade e os Serviços dos Ecossistemas (IPBES); e, em 2023,
conjuntamente a Bandi “Apai Janggut”, líder comunitário tradicional da
Indonésia, Cécile Bibiane Ndjebet, ativista e agrónoma dos Camarões, e Lélia
Wanick Salgado, ambientalista, designer e cenógrafa do Brasil. Fundação
Calouste Gulbenkian - Portugal
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