Investigadores apelam a uma maior consciencialização para os riscos envolvidos no procedimento e pedem uma "fiscalização mais apertada”
Embora
sejam geralmente seguras, as injeções com “fillers” para
rejuvenescimento ou harmonização facial podem resultar em complicações graves,
como cegueira, infeção, perda de pele e cicatrizes. O alerta é de uma
investigação desenvolvida na Faculdade de Medicina da Universidade do Porto
(FMUP).
Coordenado
por Marisa Marques, professora da FMUP e especialista em Cirurgia Plástica,
este trabalho analisou dados de mais de 9600 pacientes (94% mulheres) e mais de
9800 procedimentos com “fillers”, em diferentes países. A esmagadora
maioria dos preenchimentos (99%) foi feita com ácido hialurónico, a substância
mais usada a nível mundial e a mais segura.
Os
investigadores verificaram que 701 pacientes desenvolveram uma ou mais
complicações relacionadas com o procedimento, num total de 1116 complicações,
sendo que 750 ficaram a dever-se a oclusão vascular, o que significa que o
produto foi aplicado num vaso sanguíneo, levando à obstrução do fluxo do sangue
e à morte das células.
Apesar
de mais de dois terços dos pacientes com complicações terem recuperado
completamente, houve com sequelas graves, sendo a mais frequente a perda de
pele do rosto. Dos 153 pacientes que perderam a visão, apenas três a
recuperaram.
“Cerca
de 21% dos pacientes com complicações ficaram com cicatrizes na face, com
défices significativos na visão ou mesmo cegos”, indica Marisa Marques.
A
maioria das complicações ocorreu nas denominadas “zonas perigosas”, que incluem
as áreas acima das sobrancelhas e entre estas, abaixo dos olhos, nos lábios,
nariz e no vulgarmente conhecido como “bigode de chinês”.
“É fundamental que as pessoas estejam conscientes dos
riscos”
Face
a estas conclusões, a equipa da FMUP quer que exista uma maior informação ao
público sobre os riscos envolvidos. “É fundamental que as pessoas estejam
conscientes dos riscos associados a estes procedimentos, que são muitas vezes
publicitados nas redes sociais como fáceis e isentos de riscos, o que não é
verdade”, alerta Inês Sousa, estudante da FMUP que concluiu o Mestrado
Integrado em Medicina com este trabalho.
Marisa
Marques considera “imperativo” que estes procedimentos sejam efetuados por
médicos, mas apenas pelos médicos que estão qualificados para tal, isto é, que
tenham formação nesta área ou uma competência homologada.
Como
sublinha a docente da FMUP, “as complicações podem surgir com qualquer
profissional, mas a falta de qualificações e de experiência clínica aumenta
substancialmente o risco”.
Por
isso, “além de ser mandatório o conhecimento da anatomia do rosto, os
profissionais envolvidos devem respeitar as recomendações técnicas, como a
desinfeção da pele, utilização de luvas e material esterilizado, colocar
pequenas quantidades de “filler” e aspirar antes de injetar o produto,
para assegurarem que não estão a injetar dentro de um vaso sanguíneo”.
Investigadores pedem “fiscalização mais apertada”
Em
2023, a Ordem dos Médicos aprovou a criação da Subespecialidade em Medicina
Estética dentro das especialidades de Cirurgia Plástica e Dermatologia, que
estão de antemão habilitadas para a sua prática, sendo necessário às restantes
especialidades obter a denominada Competência em Medicina Estética.
De
acordo com Marisa Marques, esta medida visa regular a prática desta atividade
médica, vedando-a a médicos sem formação ou com formação deficitária na área,
bem como a não-médicos (o chamado intrusismo), num setor ainda “muito carente
de legislação, regulação e fiscalização”.
A
coordenadora do estudo considera que as complicações de injeções com “fillers”
podem estar subestimadas, tendo em conta que “muitos procedimentos não são
sequer realizados por médicos, nem em clínicas ou unidades de saúde competentes
para o efeito, e que as complicações não são reportadas”. No entanto, reconhece
que podem estar sobrestimadas porque “quando não se tem qualquer complicação,
normalmente não se publica”.
Nesse
sentido, a professora da FMUP considera que as autoridades de saúde têm de
fazer “uma fiscalização mais apertada” aos locais onde os “fillers” são
injetados e aos profissionais que os aplicam, de modo a garantir a segurança
dos pacientes.
Esta
revisão sistemática de artigos científicos incluiu mais 43 artigos publicados
em três bases de dados, selecionados a partir 1699 artigos com “fillers”
aprovados pela Food and Drug Administration (FDA). O trabalho contou com
orientação de Marisa Marques, professora da FMUP, e coorientação de António
Sousa Barros, investigador da FMUP e especialista na área da análise
estatística. Universidade do Porto - Portugal
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