A comunidade macaense e principalmente a sua gastronomia perderam ontem uma referência: Aida de Jesus. A fundadora do restaurante Riquexó morreu ontem aos 105 anos. A Dona Aida é agora recordada pela sua fibra e também pela sua simpatia. Miguel de Senna Fernandes diz mesmo: “A gastronomia macaense tem a Dona Aida como o seu símbolo. O símbolo físico deixou de existir e agora nasceu o mito”
Morreu
ontem, aos 105 anos, Aida de Jesus, conhecida como Dona Aida, fundadora do
restaurante Riquexó, nos anos 1980, e figura ímpar da comunidade macaense.
Antes do Riquexó, Aida de Jesus passou pelas cozinhas do Hotel Lisboa e do
Hotel Estoril, por exemplo. O velório está marcado para a próxima
segunda-feira, dia 22 de Março, às 20 horas, na Casa Mortuária do Hospital
Kiang Wu, perto do Canídromo.
Ao
Ponto Final, Miguel de Senna Fernandes recorda a Dona Aida como uma “referência
da comunidade macaense”. Além disso, era “uma senhora muito simples, uma cidadã
comum mas que ganhou o respeito de todos”. Era também, considera o presidente
da Associação dos Macaenses, “muito determinada”, “caso contrário, era
impensável ter tido a projecção que teve”.
“A
gastronomia macaense tem a Dona Aida como o seu símbolo. O símbolo físico
deixou de existir e agora nasceu o mito”, afirma Miguel de Senna Fernandes, que
destaca em Aida de Jesus características fora do universo da gastronomia: “A
comunidade reconhecia nela uma pessoa muito respeitada e foi uma pessoa que
inspirava o carinho de todos; tinha a sua personalidade e os seus momentos,
mas, de uma maneira geral, foi sempre uma pessoa de sorriso franco e sem papas
na língua”.
Além
disso, o director dos Dóci Papiaçám di Macau assinala a disponibilidade de Aida
no apoio à companhia de teatro macaense. “Tudo aquilo que ela podia fazer ela
fazia: preparava comida, deixava à disposição o seu restaurante, ela emprestou
o próprio nome. Ela entendia que isso era importante para a comunidade”,
comenta.
Carlos
Anok Cabral é o presidente da Confraria da Gastronomia Macaense e também ele
concorda que a Dona Aida, que é confreira de mérito, teve um papel determinante
no que diz respeito à gastronomia da comunidade. “A Dona Aida dedicou toda a
sua vida à comida macaense”, lembra, frisando: “É uma figura muito importante
para a gastronomia macaense e na comunidade macaense, porque não há ninguém da
comunidade macaense que não conheça a Dona Aida de Jesus”. A nível pessoal, o
presidente da Confraria da Gastronomia Macaense recorda o sorriso da Dona Aida,
o humor e a sua dedicação às pessoas.
Opinião
semelhante tem Florita Alves, ‘chef’ macaense do restaurante La Famiglia, na
vila da Taipa. A cozinheira destaca o facto de Aida de Jesus nunca ter largado
a gastronomia macaense, o que é “muito importante”. “A Dona Aida nunca
abandonou Macau e nunca abandonou a cozinha macaense”, sublinha.
De
Aida de Jesus, Florita Alves diz ter herdado a inspiração pela cozinha
macaense. “Ela teve o papel de inspiração no meu coração, o que eu aprecio
muito”, diz, acrescentando: “É uma mulher que nunca deixou a cozinha, sempre
pronta a partilhar”. Florita Alves destaca-lhe a garra e o optimismo, e repete
que morreu uma “figura incontornável” da comunidade macaense.
Luísa
Rangel, amiga de longa data da Dona Aida, recorda que conheceu a cozinheira
quando ambas eram crianças e que desde então sempre mantiveram a relação de
amizade. Também ela destaca a simpatia de Aida e os seus dotes para a cozinha.
Luísa Rangel confessa que ia comer ao Riquexó quase todos os dias.
Também
Carlos Marreiros descreve Aida de Jesus como “uma figura incontornável na
comunidade macaense e portuguesa de Macau”. Isto porque “era uma boa
cozinheira, uma praticista, alguém que registava o saber e os segredos da
comida tradicional macaense”.
Assinalando
que Aida de Jesus atravessou marcos históricos como as duas guerras mundiais, a
Revolta 1-2-3 e o ‘boom’ da indústria do entretenimento, o arquitecto macaense
diz que a cozinheira era “uma memória viva da história de Macau e do seu
desenvolvimento urbano e demográfico”. Em conclusão, Carlos Marreiros diz que a
Dona Aida devia “ser mais estudada, para que a memória dela continue para as
gerações vindouras”. André Vinagre – Macau in “Ponto
Final”
andrevinagre.pontofinal@gmail.com
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