Há 100 dias consecutivos que não se registam novos casos
locais de infecção pelo novo coronavírus na RAEM. A Tribuna de Macau ouviu três
médicos, que defendem ser necessário continuar a ter cautela e seguir as
medidas impostas pelas autoridades, pois o risco de aparecerem novos casos
“nunca é zero”. Por outro lado, dizem também ser imprescindível pensar na
economia
Macau
completou anteontem 100 dias consecutivos sem novos casos de locais de contágio
do novo coronavírus. Ouvido pelo Jornal Tribuna de Macau, o presidente da
Associação dos Médicos de Língua Portuguesa de Macau, José Manuel Esteves,
considera que “estamos numa bolha de segurança em território da RAEM”, mas
defende que o risco de aparecerem novos casos “nunca é zero”. Por isso, há que
seguir as instruções dos Serviços de Saúde. Já os médicos Rui Furtado e
Fernando Gomes referem, além da necessidade de zelar pela saúde pública, outro
factor: a economia e a necessidade de começar a abrir fronteiras, até porque
Macau “vive do turismo”.
Foram
46 os casos registados no território, mas, na verdade, apenas dois estiveram
relacionados com os restantes 44 importados. José Manuel Esteves aponta que,
“apesar de não haver casos locais, há pessoas que estão a entrar e sair do
território permanentemente, portanto, as hipóteses nunca são nulas”.
Sublinhando que a maioria passa pela quarentena – “uma medida que protege a
população da entrada de casos que possam provocar uma disseminação no
território” -, o médico defende que “é sempre necessário tomar as medidas
aconselhadas pelas autoridades de saúde, como medida de garantia”.
“Macau
é um território com alta densidade populacional e um surto com disseminação
activa na comunidade é um alto risco para esta população. Há um princípio de
prudência que é seguido pelas autoridades nas recomendações que fazem.
Parece-me louvável haver esta prudência para garantir que dentro do território
conseguimos fazer uma vida bastante próxima do normal”, afirmou.
Já
Rui Furtado diz que “temos de estar sempre numa posição defensiva, nada de
abrandar”. Mas, o médico adverte que em Macau “já não podemos falar de
pandemias e epidemias”. “De facto, já houve essa situação, mas neste momento há
casos, em Hong Kong há casos, na China há casos. Na América e no Brasil, aí,
continuamos a falar em pandemia”. Apesar disso, “devemos ter cuidado e acho que
os Serviços de Saúde estão a lidar muito bem com a situação”, referiu.
A
prova disso, acrescentou, foi o último caso que apareceu no território: um
residente proveniente das Filipinas, que chegou a Macau através do corredor
marítimo especial e que foi diagnosticado à entrada. “Controlaram tudo logo à
entrada, tanto o doente, como todas as pessoas que lidaram com ele, o que
prova, portanto, que [as medidas são] efectivas”. Neste âmbito, há já 11 dias
consecutivos que não há registo de casos importados.
Rui
Furtado acredita que “o facto de não existirem novos casos, é um sucesso”, mas,
advertiu que convém “estar atento e não facilitar”.
As negociações para aligeirar as fronteiras
José
Manuel Esteves lembrou que as autoridades da RAEM estão, “numa base quase
diária”, a negociar com outras regiões o alívio das restrições nas fronteiras,
por forma a “criar-se uma espécie de bolha de segurança entre territórios que
são de baixo risco”. “É o que está a acontecer agora com o alargamento
progressivo das regras de saída com isenção de medidas de quarentena dentro da
zona da Grande Baía”, observou.
Recorde-se
que desde o início da semana, os residentes dispensados de quarentena em Zhuhai
podem circular também por outras oito cidades da Grande Baía: Cantão, Shenzhen,
Foshan, Huizhou, Dongguan, Zhongshan, Jiangmen e Zhaoqing.
“Temos
de esperar calmamente que haja uma melhoria progressiva deste relaxar das
medidas de controlo fronteiriço e das medidas de quarentena nas saídas e
entradas para zonas seguras, porque isto é do interesse de toda a população.
Segundo o princípio da prudência, as autoridades estão a negociar com as
autoridades da China Continental e de Hong Kong, que se possa circular com
segurança quando haja as condições necessárias e suficientes”, apontou.
O
médico fez depois uma comparação com a Europa. “Há ainda um risco muito
grande”, observou, lembrando que Portugal foi excluído do corredor criado pelo
Reino Unido. Frisando que se está a assistir a um “surto em progressão” em
território português, não só na Grande Lisboa, até porque as pessoas vão
circulando, José Manuel Esteves adverte: “Se transpusermos estes riscos para um
território pequeno e de alta densidade é um risco que as autoridades não querem
correr e acho muito bem. Penso que nenhum de nós quer correr esse risco”.
Neste
sentido, crê que “a prudência” com que a situação é gerida em Macau dá muito
mais uma “sensação de tranquilidade”: “Aqui tem havido uma linha coerente.
Quando olhamos para Portugal, as indicações das autoridades têm sido em
ziguezague, portanto não há comparação possível entre o grau de segurança que
temos no território de Macau e aquilo que se passa a nível dos países
europeus”.
Na
mesma linha, o médico Fernando Gomes sublinha que em Macau “todos os dias vamos
à rua, por isso estamos bem descansados”, porém, “é uma cidade permeável turisticamente
e toda a conjuntura de abertura de Macau tem sempre a ver com a zona
circundante”. Considerando que o passo dado esta semana é o primeiro, para
depois se seguirem outras medidas mais brandas, notou ainda que a conjuntura da
saúde pública é “interdependente”.
Saúde pública vs Economia
O
médico Rui Furtado, por sua vez, considera que as autoridades “têm de jogar com
duas coisas: com a situação da saúde pública e da economia, porque Macau não
vai aguentar muito mais tempo esta situação”.
E
explica: “As pessoas neste momento já não têm subsídios do Governo, têm de se
limitar aos seus ordenados e à situação de ‘lay-off’ em que a maioria se
encontra. A economia de Macau não se aguenta com isto e as pessoas também não”.
Rui Furtado lembrou que “Macau vive do turismo, portanto, só há uma coisa a
fazer: é abrir as fronteiras”, mas “eles é que sabem como hão de abrir”.
Neste
sentido, Fernando Gomes diz que seria “agradável” como segundo passo a
flexibilização das medidas nas fronteiras, nomeadamente com outras regiões que
“mais turisticamente nos visitam”, como Taiwan ou Coreia do Sul. “Temos também
de ter em atenção o funcionamento da economia, porque sabemos que estamos numa
situação de grande aperto em termos de finanças públicas e do próprio dinamismo
económico da cidade”, apontou.
Mas
considera que há entraves: por um lado, a Coreia do Sul, “ora está bem, ora
está mal” em termos do número de casos de infecção, por outro, Taiwan parece
estar a “auto-isolar-se” e a própria permissão de viagem “parece ainda bastante
controlada”. Ainda assim, diz que “é necessário não deitar fora tudo aquilo que
foi feito ao longo destes últimos seis meses”. Catarina Pereira – Macau in “Jornal
Tribuna de Macau”
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