O ensino do português na China continental registou um
crescimento acelerado nos últimos 20 anos. Há 25 universidades chinesas que
ensinam português, abrangendo mais de 1500 estudantes. No entanto, o rápido
aumento da oferta está a dificultar a vida aos profissionais da área,
habituados outrora a receberem propostas de trabalho mesmo antes de terminarem
o curso
Num
dos edifícios da Universidade de Estudos Estrangeiros de Pequim (Beiwai), quase
cem alunos e ex-alunos, oriundos de toda a China, aguardam por um exame de
português, um projecto de vida que atrai cada vez mais chineses. “Espero
conseguir com este certificado [CAPLE, Centro de Avaliação de Português Língua
Estrangeira] ter mais oportunidades de emprego”, explica à agência Lusa Zelma,
que viajou deste Tianjin, cidade portuária a 120 quilómetros de Pequim,
ilustrando a crescente competitividade no mercado de trabalho para licenciados
em português, língua que, até há pouco, significava emprego certo na China.
A
mais antiga licenciatura em língua portuguesa da República Popular da China foi
criada em 1961, precisamente na Beiwai. Durante quase vinte anos, aquele curso
foi o único do género no país e, até ao final da década de 1990, surgiu apenas
mais um, em Xangai. No entanto, o ensino do português no continente chinês
registou um crescimento acelerado nos últimos 20 anos, coincidindo com o
retorno de Macau à soberania de Pequim, que confiou à região o papel de
plataforma comercial com os países lusófonos.
A
evolução das trocas comerciais entre a China e a lusofonia, que só em 2018 se
cifraram em 147 354 milhões de dólares, um aumento de 25,31%, em termos
homólogos, geraram uma crescente necessidade em formar quadros para trabalhar
com os países de língua portuguesa.
Hoje,
não contando com Macau e Hong Kong, há 25 universidades chinesas que ensinam
português, abrangendo mais de 1500 estudantes. No entanto, o rápido aumento da
oferta está a dificultar a vida aos profissionais da área, habituados outrora a
receberem propostas de trabalho mesmo antes de terminarem o curso.
“Para
quem tem apenas licenciatura, encontrar emprego na China tornou-se difícil”,
diz Isabel, que entrou em 2008 para o curso de português da Universidade Normal
de Harbin, no Nordeste da China, e tirou depois uma pós-graduação na
Universidade de Macau. “Optei por estudar português porque na altura havia
escassez de profissionais com conhecimentos da língua”, recorda. “Mas, nos
últimos anos, o mercado tornou-se mais competitivo”.
Para
os recém-licenciados que rumam a Pequim ou Xangai, as duas principais
metrópoles do país, e que estão entre as cidades com mais alto custo de vida do
mundo, o salário inicial varia entre 7000 e 8000 yuan. Um intérprete simultâneo
chinês – português e vice-versa pode receber até 10 mil yuan por dia de
trabalho, geralmente a acompanhar delegações de empresários ou visitas
oficiais, mas trata-se de uma tarefa ocasional e executada apenas pelos
profissionais mais experientes. Já quem está disposto a rumar a África
“continua a ter muitas oportunidades”, conta Isabel.
Em
Angola ou Moçambique, um intérprete e tradutor numa das centenas de empresas
chinesas que ali operam na construção de infra-estruturas, sector energético ou
mineração, recebe por ano entre 200 mil e 400 mil yuan, segundo estimativas da
agência Lusa, com base em ofertas de emprego difundidas em portais chineses.
A
maior exigência no mercado de trabalho levou a Beiwai a elevar este ano o seu
Departamento de Estudos de Língua Portuguesa ao estatuto de faculdade, visando
complementar o ensino da língua com conhecimentos “mais aprofundados” sobre os
países lusófonos e “aumentar o intercâmbio internacional”, diz à agência Lusa a
directora, Patrícia Jin.
“É
um passo natural, que nos permite ter mais recursos, mais possibilidades e mais
alunos e professores”, explica. “Com esta evolução, abriremos mais cadeiras, em
cinco áreas de estudo: linguística, tradução, literatura, ciência política,
economia e comércio”, detalha.
Entre
os licenciados, há também quem opte por reforçar o seu curriculum com um
mestrado em Portugal ou no Brasil. Zelma, por exemplo, vai em breve começar um
mestrado na Universidade de Lisboa, permitindo-lhe também conhecer melhor um
país cuja História aprendeu ainda no ensino secundário. “Fui sempre aluna da
área das Humanidades e sempre gostei muito de História, conheço bem o período
dos Descobrimentos”, conta. João Pimenta – China “Agência Lusa” in “Ponto
Final”
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