Ivermectina é o nome do princípio activo produzido pela
Hovione Macau que, segundo uma equipa de investigadores de Melbourne, na
Austrália, pode ser a solução no tratamento da Covid-19. É nos laboratórios de
Macau que a empresa portuguesa produz para todo o mundo o fármaco usado
principalmente como desparasitante, e que poderá servir também para travar o
novo coronavírus
Há
uma embalagem transparente com cinco gramas de um pó branco em exposição dentro
de uma das caixas de luz de um dos laboratórios da Hovione Macau. É a
ivermectina, e nem Eddy Leong, director-geral das operações de Macau da
farmacêutica portuguesa, nem Philip Lee, líder da equipa de controlo de
qualidade, se atrevem a adivinhar um preço para aquele pacote. “Quanto mais
branco, mais puro”, diz apenas Philip ao Ponto Final.
No
laboratório de cromatografia, que serve para os profissionais da Hovione Macau
purificarem as substâncias com as quais trabalham, há dez aparelhos HPLC nas
bancadas, ventiladores a sair do tecto e quatro cientistas de luvas, óculos e
bata branca. Nesta sala, explica Philip Lee, confirma-se a qualidade das
amostras e verifica-se o nível de impurezas. Aqui são analisadas amostras dos
cerca de 15 fármacos produzidos pela Hovione Macau.
O
laboratório imediatamente ao lado tem um propósito semelhante. Aqui, os
aparelhos pousados nas bancadas chamam-se Mastersizer 3000 e servem para
analisar o tamanho das partículas de cada amostra. “Para que, por exemplo, cada
partícula tenha o tamanho certo para ser absorvida pelo corpo humano”, explica
Philip Lee. Ao lado, há dois UV Spectrometer. “O da direita é novo, foi comprado
já este ano”, frisa Philip. Estes aparelhos são usados para analisar a
qualidade das partículas através da luz ultravioleta. Na sala, mais
microscópios, balanças, fornos, tubos de ensaio, lâmpadas e tubos brancos
vindos do tecto.
Esperança no tratamento da covid-19
O
pó branco em exposição na caixa de luz tem estado em destaque nas últimas
semanas porque uma equipa de investigadores da universidade australiana de
Monash, em Melbourne, concluiu, através de testes ‘in vitro’, que a ivermectina
pode eliminar o novo coronavírus em 48 horas. O estudo foi publicado pela
revista científica Antiviral Research. As atenções voltaram-se, então, para
Macau, já que grande parte da produção da ivermectina é assegurada no
território.
A
ivermectina é um princípio activo desparasitante, usado habitualmente em
medicamentos para combater os piolhos, a rosácea e a Cegueira dos Rios, uma
doença causada pela picada de moscas e cujas larvas acabam por provocar
cegueira em humanos. As conclusões do estudo australiano para a aplicação em
casos de infecção pela Covid-19 foram apenas feitas, até agora, ‘in vitro’, e
ainda não há data para os testes em humanos.
De
Loures para a Taipa
A
Hovione foi fundada, em 1959, em Loures, Portugal, pelo francês Ivan Villax. O
químico esteve na China no final da década de 1970. Em 1979, abriu um
escritório em Hong Kong e, em 1983, abriu a fábrica de Macau. O empreendimento
custou 30 milhões de patacas e reaproveitou as antigas instalações da fábrica
de panchões Him Un Iec Kei Chan, na Taipa.
Hoje,
a Hovione investiga e desenvolve novos processos químicos e dispositivos
médicos. Além disso, produz princípios activos para a indústria farmacêutica
mundial. Tem actualmente cinco fábricas, em Portugal, Macau, Nova Jérsia, nos
Estados Unidos, em Taizhou, na China, e em Cork, na Irlanda. Até 2028, a
empresa quer ser a principal fornecedora de soluções farmacêuticas a nível
global, lê-se no site da empresa. Nas instalações de Macau, há cerca de 200
funcionários, 15 dos quais portugueses.
Eficácia da doxiciclina contra o antrax
Em
2001, o antrax começou a ser usado como arma biológica, principalmente nos
Estados Unidos. Uma substância chamada doxiciclina provou ser eficaz no
tratamento das infecções pulmonares, na pele e nos intestinos associadas ao
antrax. Essa substância, à semelhança daquilo que acontece agora com a
ivermectina, era produzida quase em exclusivo pela Hovione Macau.
De
acordo com um comunicado divulgado a 31 de Outubro de 2001, pela própria
Hovione, a fábrica de Macau registou, na altura, um aumento “dramático” nas
vendas da doxiciclina. “A Hovione, com uma unidade de produção na ilha da
Taipa, Macau, aumentou a produção de doxiciclina para atender à crescente
procura por parte dos Estados Unidos, provocada pelos ataques bioterroristas
com antrax”, lê-se na nota da empresa. Uma semana depois, a emissora
norte-americana CNN noticiava que a doxiciclina era o fármaco escolhido pela
Administração de George W. Bush para o tratamento das infecções. “As
autoridades de saúde de Washington anunciaram que vão dar às pessoas que precisem
de tratamento preventivo contra o antrax o antibiótico doxiciclina”. Na altura,
a Hovione Macau exportou a substância para a América, Europa, Austrália,
Paquistão, Índia e Irão, por exemplo. No total, foram mais de 30 países os que
receberam a doxiciclina de Macau. André Vinagre – Macau in “Ponto
Final”
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