Quase
um mês de guerra envolvendo a organização terrorista Hamas, que controla a
Faixa de Gaza, e Israel, qual tem sido a atuação da ONU, no sentido de parar o
conflito? E não é só, quase dois anos depois da invasão da Ucrânia por decisão
do presidente russo Vladimir Putin, o que tem feito a ONU de efetivo para
acabar com essa guerra? Ou é sua própria estrutura que a impede de agir?
No
caso de conflitos que envolvam direta ou indiretamente os cinco grandes países,
membros do Conselho de Segurança, praticamente quase nada se pode fazer. Basta
o uso do veto por um desses países – Estados Unidos, Inglaterra, França, Rússia
e China – para bloquear qualquer iniciativa.
A
mais importante participação da ONU numa intervenção militar foi em 1950, na
época da guerra fria, quando os chamados Capacetes Azuis, sob o comando dos
Estados Unidos, intervieram na Guerra da Coreia. Não houve veto porque a China
ainda não era a de Mao e a URSS estava ausente no momento da decisão pelo
Conselho de Segurança. Outras intervenções foram no Iraque, Kosovo, Afeganistão,
Líbia e contra os jihadistas do chamado Estado Islâmico, que se formou
principalmente no Iraque depois dos EUA terem derrubado o ditador Saddam
Hussein. Outras intervenções da ONU, quase uma centena, consistiram em
operações de manutenção da paz, como fiscalizar o cessar-fogo entre Israel e os
países árabes. Ou então ações de cunho humanitário no continente africano. A
questionável intervenção militar no Haiti, que durou treze anos, contou com o
comando militar brasileiro.
Tentativas
de trégua frustradas
Houve
quatro tentativas frustradas de cessar-fogo por parte do Conselho de Segurança
da ONU e uma decisão por uma trégua votada pela Assembleia Geral, mas sem
unanimidade e sem força para intervir e impor a suspensão das hostilidades e
permitir uma troca de prisioneiros, o atendimento e tratamento dos feridos e o
abastecimento da população civil de Gaza com alimentos e água.
Faz
uma semana, o secretário-geral da ONU, António Guterres, disse ter havido má
interpretação de suas palavras no Conselho de Segurança, quanto aos ataques do
Hamas no 7 de outubro, e tratou de desfazer a confusão: “Estou chocado com as
interpretações erradas de algumas de minhas declarações no Conselho de
Segurança, como se eu estivesse justificando os atos de terror do Hamas. Isso é
falso. Foi o oposto”.
A
explicação veio logo após o pedido de sua demissão por Israel, por Guterres ter
contextualizado o conflito ao afirmar que o ataque do Hamas “não aconteceu do
nada”.
O cessar-fogo
humanitário também não havia encontrado unanimidade dentro da Europa –
Portugal, Irlanda e Espanha estavam entre os países favoráveis à decretação de
um trégua, porém a Alemanha, a Áustria, a Letônia e a Chéquia achavam não ser
ainda o momento de se conter Israel. Uma voz discordante era a do
primeiro-ministro belga, segundo o qual o direito de defesa “não pode ser
desculpa para ações indiscriminadas”.
Netanyahu,
alvo de críticas dentro e fora de Israel, escreveu e depois apagou no Twitter,
agora X, não ter recebido nenhum alerta dos responsáveis pela segurança de
Israel sobre as intenções de ataques do Hamas. De acordo com todos os serviços
secretos e de segurança interna, dizia Netanyahu, o Hamas estava com medo de
agir e procurava um acordo. Depois de ter escrito isso, alguém deve ter
lembrado a Netanyahu ter sido ele mesmo quem desorientou e enfraqueceu a
vigilância israelense, com sua obsessão de obter plenos poderes e diminuir os
poderes da Corte Suprema (equivalente ao nosso STF) para escapar a processos
por corrupção.
Enquanto
isso, as manifestações contra o intenso bombardeio do norte da Faixa de Gaza
vão assumindo feições de antissemitismo e o Hamas agressor vai conseguindo
reverter a situação em seu favor, diante da opinião pública, posando agora como
vítima, comprometendo a imagem de Israel. Quais as consequências futuras dessa
animosidade criada?
Na
sequência de protestos contra Israel e em favor dos palestinos podem ocorrer
perigosos desvios antissemitas, como a intenção de uma multidão de muçulmanos
realizar um pogrom ou massacre dos passageiros judeus, na chegada de um avião
procedente de Israel, no aeroporto russo de Makhatchkala, no Daguestão.
Paralelamente,
ocorreu no Irão a morte da jovem Armita Geravand por traumatismo craniano
cometido pela polícia moral islâmica. Ela é a segunda jovem assassinada pelo
crime de não ter colocado o véu na sua cabeça. É sempre bom lembrar que as
mulheres têm poucos direitos e que os LGBTs não são tolerados pelos países ou
organizações islâmicas como o Hamas. Rui Martins – Suíça
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Rui Martins é
jornalista, escritor, ex-CBN e ex-Estadão, exilado durante a
ditadura. Criador do primeiro movimento internacional dos emigrantes,
Brasileirinhos Apátridas, que levou à recuperação da nacionalidade brasileira
nata dos filhos dos emigrantes com a Emenda Constitucional 54/07. Escreveu
Dinheiro sujo da corrupção, sobre as contas suíças de Maluf, e o primeiro livro
sobre Roberto Carlos, A rebelião romântica da Jovem Guarda, em 1966. Foi
colaborador do Pasquim. Estudou no IRFED, l’Institut International de
Recherche et de Formation Éducation et Développement, fez mestrado no Institut
Français de Presse, em Paris, e Direito na USP. Vive na Suíça,
correspondente do Expresso de Lisboa, Correio do Brasil e RFI.
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